Diego Gavilán Zarate havia programado com a família o tradicional roteiro de férias. Ele, a mulher e os filhos deixaram Assunção e viriam para Porto Alegre, a cidade que define como sua segunda casa. Os Gavilán Zarate ainda mantêm apartamento mobiliado, investimentos e fortes laços de amizade com a capital gaúcha. Afinal, foi onde nasceram seus filhos, é sempre bom trazê-los para que conservem o vínculo. Nesta semana, no entanto, todo o plano foi trocado pela Libertadores. O ex-jogador da dupla Gre-Nal estreará como técnico no Capiatá, pequeno clube dos arredores de Assunção.
Quando volante, Gavilán sempre jogou todas as partidas como se fosse uma Libertadores. Por isso, não estranha que comece sua trajetória como técnico justamente na principal competição sul-americana. Aos 36 anos, até poderia estar dando carrinhos no meio-campo. Mas uma inflamação no joelho há cinco anos trouxe o pior veredito para um jogador. A reunião com os médicos da seleção paraguaia acabou com a recomendação de que deveria deixar os gramados. Gavilán estava no Juan Aurich, do Peru. Havia deixado Porto Alegre e rodado por Flamengo, Portuguesa, Independiente-ARG e Olimpia-PAR.
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Por telefone, desde sua casa em Assunção, Gavilán me conta que o golpe por parar aos 31 anos foi amenizado pelo planejamento que havia dado à carreira. No ano seguinte, matriculou-se no curso de treinadores da Associação Paraguaia de Futebol. Cumpriu os dois anos do currículo e passou por todas as etapas para virar treinador. Iniciou em 2013 na base do Cerro Porteño, clube no qual surgiu, e depois virou auxiliar de Victor Genes, com quem havia trabalhado na seleção. Em outubro de 2015, o ex-zagueiro Carlos Gamarra, gerente executivo do clube, os chamou para salvar Rubio Ñu do rebaixamento. A missão foi cumprida.
No meio do ano, a dupla chegou ao Capiatá, de modesta campanha no primeiro semestre. Fechou 2016 com a melhor campanha do clube, o quarto lugar e a vaga na Libertadores. Só que Genes e a direção tiveram desacertos – o clima esquentou na penúltima rodada, o filho do técnico registrou na polícia denúncia de agressão por parte de um diretor do time. A saída de Genes foi natural, e a direção decidiu apostar em Gavilán.
O Capiatá é o caçula do futebol paraguaio. Foi fundado em 2008, depois de ganhar título de divisões amadoras. Sua ascensão foi vertiginosa. Em 2014, participou da Copa Sul-Americana e alcançou aquele que foi o seu maior feito: venceu o Boca por 1 a 0 dentro da Bombonera, pelas oitavas de final. Caiu em casa, é verdade, mas a vitória em Buenos Aires é um dos orgulhos. O outro, é a estrutura.
– Capiatá fica a cerca de 20 quilômetros de Assunção. O clube oferece ótima estrutura, local para treinos e tem um estádio para 15 mil pessoas. Temos tudo aqui – garante o ex-volante.
Gavilán assumirá um time rodado. Alguns jogadores, como o lateral-direito Irrazabal, ex-Vasco, tem a sua idade. O volante Luzardi é dois anos mais novo. A média de idade do time fica próxima dos 30 anos. Por isso, lançará mão dos ensinamentos recebidos de Muricy Ramalho no Inter, em 2003 e 2004. Foi o técnico quem fez despertar nele o interesse pelos conceitos táticos e detectou a aptidão para virar treinador. Ao final dos treinos no Beira-Rio ou no vestiário, conta Gavilán, o chefe o chamava para conversar e abria o flanco para discutir temas do time e também dos adversários.
– Cara, a minha maior referência sempre foi o Muricy. Ele me marcou muito como jogador, me abriu os olhos para ter maior conhecimento da parte tática e coletiva da equipe, dos métodos de treinamento. Ele fez questão de me passar muitos conhecimentos relacionados aos aspectos táticos, ao manejo do grupo e do vestiário, o que é fundamental – revela o paraguaio.
A lista de mestres segue com Mano Menezes, com quem trabalhou no Grêmio em 2007, e também Arce, seu ex-companheiro de seleção e cria do Cerro Porteño como ele. Gavilán aponta o ex-lateral gremista e atual técnico da "albirroja", como os paraguaios chamam sua equipe, sua maior referência em guarani.
A conversa segue, Gavilán se empolga ao falar da sua nova etapa no futebol. Discorre em português claro e fluente, com leve sotaque. O caçula dos técnicos entre os 47 da Libertadores está entusiasmado com a nova etapa na carreira. Pergunto ao ex-volante pegador se seu time será marcador como ele. A resposta surpreende:
– Gosto de olhar para a frente, de jogar futebol ofensivo. Equilibrado e com time bem ordenado. E com velocidade, claro, que hoje é fundamental.
A conversa se encaminha para o final. Aproveito para buscar com Gavilán informações sobre o Guaraní, adversário do Grêmio na primeira fase da Libertadores. Ele diz se tratar de um clube de tradição e com uma equipe forte. Há jogadores de renome e tarimbados, como o zagueiro Cáceres, 37, e os uruguaios Hernán López, centroavante de 38 anos, e Palau, volante de 31 anos com passagem pelo Atlético-PR. Gavilán projeta um confronto duro.
– Será bonito de ver. Na verdade, nesta competição não tem um time maior do que o outro – avisa o Pampero, como é chamado no Paraguai, já usando um tom de treinador. O que passou a ser desde o início da última semana.
*ZHESPORTES