No sábado, Reinaldo Rueda comemorou seus 59 anos como técnico do melhor time da América do Sul neste momento. Seu Atlético Nacional, de Medellín, patrolou adversários nesta fase de grupos da Libertadores. Em cinco jogos, cinco vitórias, 12 gols marcados e nenhum sofrido. Mais do que isso, mostra ao mundo revelações como atacante Marlos Moreno, 19 anos, promovido em setembro ao time principal e objeto de cobiça de europeus, como o Porto, e do Santos. Mas há ainda o zagueiro Davinson Sánchez, 19 anos, e de passagem comprada para a Europa no meio do ano.
Na sexta-feira, Rueda atendeu por telefone a Zero Hora. Contou sobre como construiu um time que joga no modelo europeu, aquele que estamos acostumados a ver na nossa TV, com alta velocidade ofensiva, força na marcação e ação em espaço reduzido do campo, com a linha de defesa avançada. Técnico de Honduras na Copa de 2010 e do Equador na Copa de 2014, topou o convite do Atlético Nacional para voltar ao clube seduzido por uma exigência dos donos: que ganhasse títulos, mas também resgatasse o DNA do futebol típico de Medellín, com qualidade técnica e muito espetáculo para a torcida.
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O time colombiano recebe, às 19h30min desta terça-feira, o Huracán, para tentar ser o único clube 100% da fase de grupo da Libertadores. Parte do pedido parece já ter sido entregue. Acompanhe o que Rueda contou a ZH nesta entrevista.
Como foi montado esse Atlético Nacional que o senhor comanda?
O Atlético Nacional é o maior time da Colômbia. Sempre se caracterizou por fazer um futebol atrativo, vistoso. Foi o que sempre quis, que o clube mantivesse uma cultura de futebol da Antióquia (Estado), daqui de Medellín, que sempre se caracterizou por ter bons jogadores e qualidade técnica. O estilo de jogo do clube sofreu várias modificações, vieram técnicos argentinos e colombianos. A direção me chamou e solicitou que, além de ser campeão, eu resgatasse esse futebol vistoso e atrativo. Resgatar o DNA do Nacional. Sempre me identifiquei com esse estilo. As seleções de Honduras e Equador e meus times sempre jogaram bom futebol, de boa elaboração no meio-campo. Aqui no Atlético Nacional, não foi fácil no começo, o time vinha de três anos com Juan Carlos Osório, jogava um futebol direto, vertical. Os meus primeiros três meses aqui foram complicados. Aos poucos, recuperamos a identidade. Um futebol que a arquibancada gostava.
O Nacional é o time do continente que joga um futebol mais perto do que vemos na Europa?
Temos um time forte, com bom comportamento defensivo. É uma equipe que tem explosão nos últimos 20 metros, boa vocação ofensiva e uma boa média de gols. Somos efetivos. Melhoramos muito no aspecto de saber fazer correr o jogo, criar espaços e aproveitá-los. Insisto muito para que os jogadores se agrupem e trabalho essa conceituação ofensiva.
O Nacional, como clube, também passou por mudanças?
É uma integração de fatores. Faz alguns anos o clube mudou de administração. Agora é comandado por uma organização muito séria, a Aguila, dona da marca Postobom, popular de refrigerantes aqui na Colômbia, e de outros produtos. Essa administração busca trazer bons jogadores para o grupo e igualmente estimula a apostar nos jovens. Neste semestre, promovemos quatro ou cinco do sub-20 ao time principal, com muito bom resultado.
Na última convocação, o Atlético Nacional cedeu quatro jogadores para a seleção principal e outros três para a sub-23.
Na última convocação foi assim. A expectativa é de que, na Copa América e na Olimpíada, tenhamos oito ou nove jogadores cedidos às seleções colombianas.
O Nacional perdeu Jefferson Duque, o principal jogador em janeiro. Como foi remontar a equipe para a Libertadores?
Sofremos três baixas importantes do time campeão da Superliga 2015: Murillo, zagueiro, foi para o Pachuca, Chará voltou para o Monterrey e repassado ao Dorados, e Duque saiu emprestado ao Atlas. Em janeiro, iniciamos com a promoção do (zagueiro) Sánchez, de 19 anos, ao time principal. Também chegou Felipe ibarguen e se consolidou o volante Pérez. No ataque, buscamos na Inglaterra (no Wattford) Victor Ibarbio. que esteve na Copa de 2014. Buscamos mais um volante e um meia de ligação. Também testamos e trabalhamos Berrío e Copete para que fizessem a função de atacante central, que era de Duque.
Mas quem brilhou foi Marlos Moreno. Como funciona a alternância entre Ibarbio e Moreno no centro do ataque?
Os dois gostam de jogar pelo meio, mas com características diferentes. Marlos Moreno, no futebol amador, fez essa função. Ibarbio faz pela primeira vez. Temos outras alternativas aqui. A ideia é que tenham boa condução de bola e qualidade para concluir e fazer os gols.
Seu time é jovem. Por isso atua com essa alta velocidade?
É uma mistura importante, média de 24,7 anos. Alguns estão na faixa dos 30, 32 anos, sobretudo no bloco defensivo. Mas também temos um bom trabalho físico para ter a intensidade e manter esse ritmo. No começo tivemos dificuldades com a metodologia de trabalho, houve lesões. Mas agora as baixas por lesões são raras.
Aqui no Brasil se discute muito o rodízio. O senhor muda o time para jogar Libertadores e campeonato nacional?
Não, armarmos o time de acordo com o comportamento, a característica do jogo, o rival. Aí, se faz uma alternância. Mas não há a rotação de jogadores, o rodízio como vocês chamam. Mantemos um time-base, com sete nomes. Essa é a média que se conserva.
Marlos Moreno estaria nos planos de Santos. Quem é esse jogador e por que ele impressiona tanto?
Bom, tem sido fantástico, muito gratificante ver sua ascensão. Marlos Moreno estreou consigno no dia 10 de setembro. Foi um grata revelação. Seu caráter e sua condição futebolística que temos visto o afirmam. É potente, muito habilidoso, inteligente para resolver. Tem muito para aprender, mas também tem sido muito importante para o time. Nas últimas partidas da Superliga de 2015, foi decisivo. Neste ano, mantém o nível, mesmo em adaptação nesta transição como titular e com o assédio da Europa e da América do Sul, no caso do Brasil. Está muito perto de ser uma realidade.
Preocupa o senhor a chance de perdas na janela do meio do ano e, caso chegue à semifinal, atuar com um time desfigurado?
Naturalmente, sim. O clube queria mantê-los até o final da Libertadores, mas a pressão dos representantes, dos empresários e as ofertas dos clubes... A concentração dos jogadores já se torna difícil. É quase uma realidade que será difícil manter o grupo para as fases finais.
Quantos vão perder?
É preciso esperar. Há muita especulações. No momento, de concreto, sério, são cinco jogadores pretendidos e é muito provável que saiam.
Quer seriam? Ibarbio tem contrato até o meio do ano, Marlos está na mira de muitos clubes.
Davinson Sánchez (zagueiro), Sebastian Pérez (volante), Díaz (lateral-esquerdo), Armani, o goleiro também.
O senhor já trabalha na reposição?
Sim, é preciso projetar, trabalhar desde já. Alguns jovens serão promovidos e outros jogadores de recorrida experiência que dão a resposta imediata serão buscados.
O que houve para Colômbia voltar a ter expressão, com bons times e jogadores de alto nível?
Não é grátis nem de ontem. Sofremos por 16 anos sem ir à Copa do Mundo. Mas começamos um trabalho de reengenharia de formação de juvenis e infantis em 1999. Voltamos a ser protagonista no Torneio de Toulon, na França, e passamos a disputar outra vez os Mundiais sub-20 e sub-17. O produto disso é que a Colômbia soube aproveitar seus jovens. Custou muito e, agora, se desfruta, como fez no Brasil de 2014. Algumas gerações estão tendo bom aproveitamento de seus talentos, assegurando um reposicionamento do país.
Houve uma mudança na lei obrigando o uso de sub-20 nos times. Isso ajudou, não?
Sim, essa norma foi mudada em 1999. Com muitas dificuldades no início, com recusa dos técnicos estrangeiros. No começo era por norma, mas depois foi por convicção. Os jovens foram ganhando posições e não somente formavam a equipe principal um sub-20, mas dois ou três. Isso abriu espaço e projetou jogadores novos. Ajudou na maturação deles no profissionalismo.
Até quando vigorou a norma?
Até 2011, 2012. Quando acabou, estava fora na seleção do Equador.
Foi reduzido o número de estrangeiros também?
Sim, mas isso foi antes. Agora podem ter quatro e escalar três. Antes eram cinco. Isso ajudou na projeção dos jovens jogadores locais.
Com o senhor vê o futebol brasileiro?
Sempre chama a atenção o grande potencial, pela quantidade de jogadores. Mas é uma transição difícil, inclusive pelo que experimentou nos últimos ano a. Inclusive pelo visto nas seleções sub-17 e sub-20, sem a qualidade de anos anteriores. Em nível de clubes, chamam a atenção pela vocação ofensiva. Pena que não tem a contundência a e segurança defensiva que fez o Brasil conquistar títulos em alguns momentos. Creio que os jogadores jovens vão moto cedo para a Europa. Saem com a essência do brasileiro e quando voltam, adulto, estão em um processo no qual nem todos assimilaram a cultura europeia. Voltam como uma mistura em que perdem a essência brasileira e não se completam como europeus. É uma mescla difícil e, por isso, acabam perdendo a essência de ser brasileiro.
Como o senhor vê taticamente os times brasileiros?
Agora, o São Paulo, com Edgardo Bauza, e o Atlético-MG. com Diego Aguirre, dão muita ênfase na parte defensiva. Aliado com essa vocação ofensiva, vem a capacidade técnica de resolver, da bola aérea e de uma pegada de meia-distância ou da bola parada. O Brasil conserva muito jogador de talento. Palmeiras, Corinthians e Grêmio também competem aliando essas qualidades. O futebol brasileiro, melhorando na parte defensiva, se torna difícil de ser batido. Os times estão assimilando essa nova ordem móvel de futebol, ajudados pela facilidade do brasileiro para se desenvolver.
Qual sua opinião sobre o Grêmio?
É uma equipe que está nessa transição que sempre conserva a capacidade de ser superatrativo e equilibrado. Vi o jogo contra LDU, em condições na altura sempre é difícil. Fez um jogo inteligente. São times bem estruturados, com jogadores experimentados importantes. Sempre vai ter a contundência ofensiva, é a vocação do brasileiro.
Como o senhor forma seus conceitos de futebol?
É uma mistura importante (risos). Tive professores primeiro como Parreira e (José) Bonetti, no Brasil (ambos da Escola Superior de Educação Física do Exército). Depois fui à Alemanha fazer minha formação (mestrado) como treinador. Normalmente, vou uma vez ao ano á Alemanha, à Inglaterra, assistir treinos e jogos, intercambiar conceitos. Passa sempre por aí a atualização de um técnico.
O Nacional está para ser campeão na Copa Libertadores?
É difícil dizer agora, Os mexicanos são fortes, Toluca é muito forte. Os brasileiros também, o São Paulo está cada vez mais forte, o Atlético-MG tem bom grupo, Há os argentinos ainda. É cedo para dizer que é favorito. A pausa da Copa América vai mudar muito as equipes.
E a estada no Rio Grande do Sul, em Viamão, na Copa. Ficou saudade?
Sim, sim. Lembro com muita nostalgia, lamentamos por não ter ficado mais tempo. O Equador não estava no melhor momento., Mas desfrutamos de Viamão e Porto Alegre. A Copa foi uma experiência fantástica.
*ZHESPORTES