Formado em Sistemas de Informação, Marcos Vinicius Kraulich tinha um sonho um tanto desafiador para uma cidade afastada dos grandes centros como Santo Ângelo, nas Missões: ganhar dinheiro desenvolvendo softwares. Abriu uma empresa chamada Bigriver logo após se graduar, em 2013, mas precisou apostar em coisas mais simples para se sustentar, como criar sites, ainda que não fosse o que gostava de fazer.
Instalou um escritório na incubadora tecnológica da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI), onde fez a graduação. Ali, entre outros donos de startups, recebeu assessoria para acelerar seu negócio, além da oferta de pagar um aluguel mais barato em comparação com outros locais. Conseguiu mostrar que a empresa andava com as próprias pernas, mas ainda não se dedicava a criar programas e sistemas complexos, como desejava.
Ao lado de seu novo sócio, Fábio Schallenberger, Kraulich adquiriu a franquia do Garupa em 2018, semelhante aos conhecidos Uber e 99. Foi aí que identificou um nicho. Na cidade de 78 mil habitantes, aplicativos de corrida não vingavam. Ouviu de algumas pessoas que era complicado fazer o download no celular, entender o sistema, pedir a carona... Mais fácil ligar para um taxista ou motoristas clandestinos - muitos organizados em centrais telefônicas ou WhatsApp.
Se quisessem fazer o Garupa deslanchar na região missioneira, não tinha outro jeito: teriam que se adaptar aos hábitos da população.
— Ou a gente colocava uma central de atendimento com várias pessoas trabalhando 24 horas por dia para atender as ligações, ou desenvolvíamos alguma ideia — conta Kraulich.
Era a oportunidade para empreender inventando o próprio software. Assim surgiu o Jarbas, sistema que permite usar o WhatsApp para chamar uma corrida do Garupa. Criado em 2020, durante a pandemia, foi parcialmente inspirado no chatbot que a Caixa Econômica disponibilizou para que a população tirasse dúvidas sobre o auxílio emergencial usando o aplicativo de mensagens.
O Jarbas funciona como um assistente virtual. Basta mandar uma mensagem que o robô inicia o bate-papo. Vai, primeiramente, perguntar o local onde a pessoa irá embarcar, além da cidade. Consegue decifrar até mesmo os endereços que foram digitados de forma incorreta.
— Não importa se escreveu em caixa baixa, se escreveu errado: a inteligência artificial vai entrar em ação — garante o criador.
Empreendedorismo no RS
Com o objetivo de apresentar histórias inspiradoras, a série contará semanalmente as trajetórias de empreendedores que transformaram uma ideia ou um sonho em realidade. Fundadores e sócios de 10 empresas de diferentes cidades gaúchas compartilharão os desafios superados e darão dicas para quem deseja abrir seu próprio negócio nos ramos de tecnologia no campo, saúde, moda, cuidados com o corpo, entre outros.
Com a localização identificada, o Jarbas começa a procurar por um motorista que esteja cadastrado no Garupa em Santo Ângelo ou em Santa Rosa, as duas cidades em que a franquia de Kraulich e Schallenberger está autorizada a explorar. A pessoa recebe uma mensagem com a cor e o modelo do carro, o tempo que deve levar para chegar e, por fim, o valor da corrida - tudo isso sem precisar instalar outro aplicativo no celular.
No início, houve quem pensou que por trás daquela eficiência tivesse uma pessoa digitando e acionando os motoristas. O sistema que faz o chatbot funcionar registrou mensagens convidando Jarbas para sair e outras querendo saber seu sobrenome, pergunta típica em uma cidade do Interior.
O chatbot funcionou tão bem nas Missões que sócios do Garupa que exploram a franquia em outros locais do Brasil passaram a comprar a ideia. Atualmente, há Jarbas atuando em 15 municípios gaúchos, três cidades de Santa Catarina, duas do Paraná e em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro. O nome da marca não pode ser alterado.
Com a ajuda do assistente virtual, Kraulich e Schallenberger conseguiram aumentar a efetividade das corridas.
— A cada 10 pessoas que chamam o Jarbas no WhatsApp, sete concluem a corrida. Dessas três que desistem, duas não queriam de verdade. Só estavam testando a conversa com o Jarbas. Apenas uma não conseguiu — diz Schallenberger.
Todas as solicitações de corrida são acompanhadas pelo computador do escritório da Bigriver, que saiu da incubadora de startups e agora está instalado no parque tecnológico da URI. Kraulich faz constantes atualizações no sistema, seja para que Jarbas aprenda a interpretar o que é nome de pessoa e o que é endereço, seja para corrigir erros no sistema do robô.
Os sócios seguem pagando um aluguel mais barato dentro da universidade, mas agora conseguem arcar com os salários de dois estagiários, além de contratar uma equipe de marketing para investir em divulgação. Deixaram de criar sites graças à franquia do Garupa e, agora, têm grandes pretensões com o Jarbas.
Atualmente, o software está integrado apenas com o Garupa. O novo objetivo para seguir empreendendo é vender o sistema para outros aplicativos de corrida, espalhando Jarbas mundo afora. Há, no entanto, uma lição que o robô precisa aprender o quanto antes: decifrar mensagens de voz. A ideia é que seja acessível até para quem não sabe escrever, com a promessa de não reclamar pedindo que a pessoa digite em vez de mandar áudio.
— Ele vai entender da mesma maneira como entende o texto. O bom disso é que um robô nunca está de mau-humor — brinca Kraulich.