Imagine dois cenários. No primeiro, o suspeito é um homem de aproximadamente 1m80cm. As evidências encontradas na cena do crime não revelam muito mais sobre ele. No segundo, vestígios genéticos revelam a participação de uma mulher de olhos castanhos, pele clara e longos cabelos negros. Ela tem algumas sardas no rosto, cerca de 1,70m e ascendência europeia oriental. Em qual deles seria mais fácil descobrir o culpado?
A resposta, claro, é bem simples: quanto mais detalhes, melhor. Mas chegar a esse nível de precisão envolve uma tecnologia de ponta disponível em poucos países - e que está bem próxima de ser aplicada no Brasil. Com os avanços de equipamentos e softwares, passou a ser possível traçar, além do perfil genético básico, também a origem étnica e características fenotípicas (como tonalidade da pele, cor dos olhos e textura do cabelo) de uma pessoa através de exames de DNA.
Laboratório torna o RS centro de investigação de genética forense
Ou seja, já é possível prever traços físicos, com alta taxa de acerto, baseando-se apenas na análise de rastros como sangue e saliva. E é com essa expertise que peritos criminais brasileiros passarão a contar nos próximos anos. Não sem um período de pesquisa: antes da aplicação prática, é preciso criar um banco de dados extenso e detalhado o suficiente para gerar resultados confiáveis. Afinal, para a polícia, não adianta saber que alguém tem 27% de chances de ter cometido um crime.
Como uma impressão digital se transforma em prova de crime
O reforço nas investigações de cenas de crimes está começando a tomar forma no laboratório de genética forense da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Inaugurado em conjunto com a Polícia Federal (PF), a estrutura serve a dois propósitos: solucionar casos não resolvidos e embasar pesquisas acadêmicas. A parceria envolve a aquisição de equipamentos, por parte da PF, e a utilização da infraestrutura acadêmica para aprimorar a investigação criminal.
- A proposta é obter melhores resultados em amostras consideradas inconclusivas, indo além do que é possível fazer atualmente no país. Às vezes, o DNA coletado não está em condições de ser analisado, mas com novos equipamentos e capacitação poderemos resolver esses casos - explica a geneticista Clarice Alho, coordenadora do Laboratório de Genética Humana da universidade.
Quebra-cabeças de um crime
Se toda cena de crime é como um quebra-cabeças, nos próximos anos será possível montá-lo e obter uma imagem melhor, mas aumentando o número de peças. Isso porque o nível de detalhes que se pode obter do DNA nunca foi tão grande, mas a capacidade de analisá-los com rapidez não cresce na mesma medida - o que facilita o trabalho dos peritos sem, no entanto, agilizá-lo.
A precisão, por sinal, ainda não é total, mas a reconstrução facial a partir do DNA tem sido utilizada em países como Estados Unidos, Grã-Bretanha e Holanda. Ainda que, em muitos casos - pela falta da confiabilidade necessária - a tecnologia ainda não tenha efetivamente apontado culpados, é possível prever um futuro em que suspeitos poderão ser revelados com base apenas nos genes deixados no local de um crime.
- Com esse projeto, seremos capazes de reproduzir o possível rosto de uma pessoa através apenas da saliva, por exemplo. É como um retrato falado molecular, e a partir dele poderemos tanto incluir quanto excluir suspeitos - garante o biólogo e perito criminal federal Gustavo Chemale.
A tecnologia ainda é cara: a análise completa de um só caso chega a custar US$ 80 mil. Em função disso, utilizá-la com frequência deve demorar cerca de cinco anos.
A PUCRS precisa aumentar o seu banco de dados genético para que o sistema funcione com precisão. Para mais informações, clique aqui.