Quem penetra na face sul do Morro São Pedro ouve o ronco dos bugios ecoar na floresta. Seguindo a trilha ocultada sob o maior remanescente de Mata Atlântica da Capital, cruza por nascentes que alimentam a bacia hidrográfica do Lami e chega ao cume. A vegetação já é outra: o campo, com espécies vegetais ameaçadas de extinção e afloramentos rochosos, se estende ao longo do lado norte do morro até mergulhar no asfalto.
Retrato do que um dia foi a paisagem natural de Porto Alegre, os 1,5 mil hectares de campos e florestas nativos estão em vias de ganhar nova proteção legal. Para que não se tornem passado, à medida que a cidade cresce, loteamentos modificam a paisagem, e o fluxo de pessoas e veículos aumenta em direção à região, 30 quilômetros distante do Centro.
Um Refúgio da Vida Silvestre de 54 hectares, no sul do morro, garantirá total proteção ao patrimônio natural - dezenas de nascentes, plantas de alto valor ornamental e animais confinados às áreas preservadas ao sul da cidade, como o tatu-mulita (Dasypus hybridus) e uma população de 600 a 900 bugios-ruivos (Alouatta guariba clamitans).
Esta ilha de preservação estará cercada por uma Área de Proteção Ambiental (APA) de 15 mil hectares, que tem por objetivo ordenar a expansão urbana na região e amortecer o impacto da ação humana por meio de um plano de manejo que garanta o uso sustentável dos recursos naturais. Assim, mantêm-se corredores ecológicos, remanescentes verdes que conectem a área do São Pedro a outros conjuntos naturais importantes como a Reserva Ecológica do Lami e o Parque SaintHilaire, em Viamão.
- Se as populações ficam isoladas, tendem a entrar em extinção devido à consanguinidade - explica Renata Cardoso, bióloga da Secretaria Municipal de Meio-Ambiente (Smam). - A maior variabilidade genética garante que os indivíduos se adaptem a mudanças nas condições do ambiente.
Renata forma com as também biólogas Soraya Ribeiro e Maria Carmen Bastos a equipe técnica responsável pelo estudo da Smam para a proposta de criação das unidades de conservação. Dezenas de reuniões sobre a APA foram realizadas desde o final de 2012 com comunidades indígenas, produtores rurais, ONGs e outros representantes da sociedade civil. Lançada hoje no site da Smam (http://www2.portoalegre.rs.gov.br/smam_consultapublica), uma consulta pública sobre o Refúgio da Vida Silvestre receberá contribuições do público durante 30 dias.
A área do refúgio foi adquirida pela prefeitura com recursos de compensação do Projeto Integrado Socioambiental (Pisa) do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae). A criação das unidades de conservação deve fortalecer o combate a outras práticas que impactam o ambiente natural desse santuário ecológico em plena Capital.
- Um dos principais desafios é coibir o motocross no morro. O barulho das motocicletas afugenta e estressa os animais, e a trilha à margem do córrego causa assoreamento e provoca erosão no solo saibroso - explica Soraya Ribeiro.
Há mais de uma década à frente do espaço de conservação Econsciência, em uma área vizinha à do Refúgio, Felipe Viana espera que a APA controle os efeitos da especulação imobiliária na região.
- Há projetos de condomínios com 400 hectares. Campanhas tentam atrair as pessoas para a Zona Sul. "Venha viver em meio ao verde em um condomínio que está acabando com o verde" - ironiza.
Clique na imagem abaixo para ter visão 360° da área do Refúgio
CONHEÇA O SÃO PEDRO
Há opções para quem quer fazer turismo de natureza no morro
Espaço de Conservação Econsciência: Localizado em área vizinha ao futuro Refúgio da Vida Silvestre, o espaço oferece programação de ecoturismo, com trilhas pelo morro, observação de aves e bugios. Informações pelo site econsciencia.org.br e pelo telefone (51) 3333-5015.
Cabanha Costa do Cerro: Além de abrigar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural de oito hectares, conta com opções de trilhas, passeio a cavalo e estrutura para churrasqueira. Informações pelo site cabanhacostadocerro.com.br e pelo telefone (51) 3258-5023.