Na quarta-feira, que foi o quarto dia da estadia de Rafael Irigoyen no Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (Cern), o físico e professor do Ensino Médio conheceu um pouco mais sobre o AMS-02 (Alpha Magnetic Spectrometer), detector de partículas instalado na Estação Espacial Internacional (ISS) para tentar perceber sinais de matéria escura a partir de raios cósmicos. Irigoyen foi um dos selecionados pela Sociedade Brasileira de Física em um programa financiado pela CAPES, que levou brasileiros ao centro de pesquisa em Genebra, na Suíça.
Tudo o que enxergamos no cosmo - planetas, estrelas, nebulosas, galáxias - corresponde a apenas 4% do nosso universo, explica Rafael. A pergunta óbvia que fica é: o que são os outros 96%?
- Assim como os planetas do Sistema Solar giram ao redor do Sol devido à imensa gravidade da nossa estrela, todos os componente da Via Láctea, como estrelas, planetas, nebulosas etc. giram ao redor do núcleo da nossa galáxia. No caso do Sol, que carrega consigo os planetas, a velocidade dessa rotação é de cerca de 217 km/s, e é nesse valor que começam os problemas - observa o professor.
A questão é que, para que o Sol, a cerca de 27 mil anos-luz do centro da Via-Láctea, viaje com tal velocidade, é preciso que a galáxia tenha uma certa massa total capaz de produzir uma força gravitacional que dê "coesão" aos componentes desse aglomerado.
- Os físicos fazem os cálculos teóricos, obtêm um valor para a massa total da galáxia e, ao fazerem as medidas experimentais, constatam que a maioria da massa prevista não está lá. Apenas uma pequena fração da massa total prevista para Via-Láctea é detectada. O problema fica ainda mais sério quando os cálculos são expandidos para às demais galáxias e as observações constatam o mesmo para todo o universo. A massa que conseguimos medir nas galáxias simplesmente não é suficiente para manter o universo coeso - constata Rafael.
É aí que entra a matéria escura. Como não conseguimos detectar esses "96%" com os nossos instrumentos, deve haver algum tipo de matéria que completa os resultados previstos teoricamente. Como somos "completamente cegos à sua presença", diz o professor, batizou-se essa matéria de "escura".
Instalado no espaço, o AMS-02 tenta captar partículas (na maioria prótons) de alta energia, provenientes de fontes no espaço onde há concentração de matéria visível, como estrelas, galáxias e supernovas, que possuem energias muito maiores do que o LHC é capaz de produzir, repara Rafael. Isso explica por que o AMS-02 está instalado no espaço.
- Os raios cósmicos são bem mais raros ao nível do mar porque, ao penetrarem na atmosfera, interagem com as moléculas de ar, produzindo um chuveiro de partículas, que decompõem o raio cósmico original em várias outras partículas, dispersando a sua energia. Ao colocar o detector no espaço, elimina-se a atmosfera, tornando possível capturar o raio cósmico original, antes de qualquer interação - observa o professor Irigoyen.
O detector AMS é uma colaboração do Cern com a Nasa, a agência espacial americana, que o lançou e o instalou na ISS em maio de 2011.
- Ele é um exemplo de que física de partículas não se faz somente nos aceleradores, conclui Rafael.
Selecionado pela Sociedade Brasileira de Física junto a outros 29 professores de Ensino Médio para um curso de uma semana no centro de pesquisas, Rafael se uniu ao biólogo e também professor Igor Nornberg para criar o canal de Youtube "A Torre" (confira o vídeo em que eles explicam o acelerador de partículas), que tem como objetivo a divulgação científica. Ele vai ficar na Suíça até o dia 7 de setembro e, durante a estadia, publicará atualizações sobre o curso e as descobertas que fizer por lá.