Entidades estudantis têm promovido uma campanha para tentar adiar a realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), marcado para 17 e 24 de janeiro (versão impressa) e 31 de janeiro e 7 de fevereiro (versão digital). O argumento é que o avanço do coronavírus no país coloca os estudantes em risco ao terem de se deslocar e se reunir para fazer as provas, além de prejudicar candidatos mais pobres que não tiveram condições ideais de estudo remoto.
O movimento é puxado pela União Nacional dos Estudantes (UNE) e pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), e tem recebido adeptos nas redes sociais, em particular o Twitter. Hashtags como #Adiaenem, #Adiaenem2020 e #Enemseguro passaram a ser espalhadas com força pela rede desde o início desta semana.
Em posicionamento em seu site, a Ubes afirma que a realização do Enem, dentro de duas semanas, restringe o acesso à universidade.
— Pela vida das pessoas e para que não haja ainda mais desigualdade entre os candidatos, acreditamos ser inevitável um novo adiamento, com a criação de uma estratégia efetiva para garantia da segurança sanitária — diz a presidente da entidade, Rozana Barroso.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), no entanto, não fala em adiar as provas. Em vídeo, o presidente do órgão, Alexandre Lopes, diz que a instituição está preparada.
— Está tudo garantido, tudo tranquilo para a realização das provas. Investimos mais de R$ 69 milhões em medidas relativas à segurança à covid-19. Vai haver menos participantes em cada sala de aula, a identificação do participante será feita no lado de fora, e também investimos mais na limpeza, principalmente das áreas comuns. Também vamos disponibilizar álcool gel para todos os participantes e aplicadores — afirmou Lopes.
Gabriel Grabowski, doutor em Educação e professor da Universidade Feevale, avalia que, por mais compreensível e legítima que seja a reivindicação das entidades estudantis, o adiamento nesta fase impactaria toda a logística de aplicação das provas e, principalmente, o ingresso e o ano letivo de 2021 nas universidades:
— Portanto, é fundamental que o Ministério da Educação e o Inep dialoguem com os estudantes, com as instituições de Ensino Superior e tome todas as providências necessárias para evitar novas contaminações.
As provas já tiveram suas datas alteradas uma vez em razão da pandemia. O Enem 2020 estava previsto para ocorrer em novembro, mas, em maio do ano passado, foi adiado.
Gregório Grisa, doutor em Educação, pós-doutor em Sociologia e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), considera a pressão dos estudantes adequada e acha que deveria ser levada em conta pelo Inep. Ele lembra que uma consulta foi feita pelo governo junto aos estudantes na ocasião do primeiro adiamento, e a data escolhida por estes não foi respeitada, para maio de 2021. Ele avalia que os protocolos pensados pelo Enem para proteger os alunos e aplicadores não são suficientes em meio ao avanço da doença.
— A definição do Enem para janeiro, em plena ascensão dos casos e pouco depois das festas de final de ano, é mais um sinal de toda a dificuldade deste governo de fazer o que é elementar para impedir a expansão do coronavírus — critica.
Ele analisa ainda que o impacto psicológico poderá ser crucial para os estudantes, em particular aqueles que dependerão do transporte público para chegar aos locais das provas e os alunos vulneráveis que não conseguiram se preparar adequadamente em razão do ensino remoto.
— A escolha do mês de janeiro para as provas foi a pior possível. Coincide com um período em que muitas redes escolares ainda estão em dificuldades para finalizar o ano letivo e tantas outras demoraram para disponibilizar plataformas e conteúdos para que os estudantes se preparassem — argumenta.