Em seu primeiro discurso após a posse, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que a reforma da Previdência é prioridade principal do novo governo. Classificando o atual sistema como "fábrica de desigualdades", fez apelo à classe política para apoiar mudanças profundas nas aposentadorias.
— Quem legisla tem as maiores aposentadorias. Quem julga tem as maiores aposentadorias. O povo brasileiro, as menores — afirmou.
Ao citar o resultado das eleições, que renovou mais da metade das cadeiras da Câmara, como "recado das urnas", o ministro projetou o alcance das mudanças ao mesmo tempo em que advertiu os futuros parlamentares:
— A reforma da Previdência é primeiro e maior desafio a ser enfrentado. Se for bem-sucedida, em dois ou três meses, teremos 10 anos de crescimento sustentável pela frente. Se não formos, temos sugestões também.
O plano B de Guedes é a edição de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para desindexar e desvincular todas as despesas do orçamento, dando maior liberdade ao Parlamento para redirecionar os gastos da União, que atualmente é mais de 90% carimbado para áreas específicas, sem estourar o teto de gastos. Entre as despesas vinculadas, há gastos com saúde e educação, que têm percentuais mínimos de repasses garantidos pela Constituição. Essas áreas seriam impactadas.
— (Os parlamentares) vão ter de sair e lidar com a crise, fazer escolhas. Será que a classe política já é madura para assumir o protagonismo e comando? Mas corta onde? Da saúde, da educação? Ou diminui os subsídios, as desonerações? — questionou, ao lado do olhar atento do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), candidato à reeleição no cargo.
Guedes adiantou que o governo irá anunciar, nos próximos dias, uma medida que não depende de mudança na Constituição para combater fraudes e privilégios na Previdência Social. Sem detalhar o texto, afirmou que ela poderá ter impacto de R$ 17 bilhões a R$ 30 bilhões ao ano "só na base de identificação de fraudes".
Ao longo de janeiro, a proposta de reforma da Previdência, que irá exigir mudança na Carta e apoio de 60% do Congresso em dois turnos de votação, será discutida. Mas apresentada ao Congresso somente em fevereiro, na nova legislatura. Para acelerar os trâmites, o projeto apresentado por Michel Temer poderá ser utilizado como base para o novo texto.
A manifestação de Guedes, com 52 minutos, fechou o evento simbólico de transmissão de cargo. Antes dele, o ex-ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, fez rápido balanço de sua atuação na área. Ele advertiu seu sucessor que, sem a aprovação da reforma da Previdência, os impostos serão consumidos pela folha e benefícios previdenciários.
O ex-ministro do Planejamento, Esteves Colnago, que seguirá no governo Bolsonaro como secretário-adjunto da Fazenda, defendeu a continuidade da adoção de medidas duras pelo governo.
Os pilares
A sua gestão, disse Guedes, será centrada em três pilares: simplificação de impostos, privatizações e reforma da Previdência, acompanhada da descentralização de recursos para Estados e municípios.
O "mal maior"
O ministro defendeu a necessidade de estancar o aumento dos gastos públicos, que chamou de "mal maior" do país. Para ele, a adoção do teto de gastos foi fundamental, mas ressaltou que é preciso garantir que o controle seja efetivo.
— Um teto sem parede de sustentação, cai. Temos de aprofundar as reformas, que são as paredes.
A projeção de déficit nas contas públicas para 2019 é de R$ 139 bilhões no cenário econômico atual.
As corporações
No discurso, prometeu combater o corporativismo e a manutenção de privilégios para setores da sociedade. Ele negou que pretende beneficiar apenas a faixa mais rica da população e disse que trabalhará para tornar o Estado mais eficiente para distribuir os gastos para os setores menos favorecidos da sociedade.
— Não adianta tentar preservar feudo, usado para comprar influência parlamentar, gasto publicitário. Vamos buscar excesso de gastos. Vamos buscar dinheiro, porque está faltando para saúde, para educação, para Bolsa Família — declarou.
Mais privatizações
Um profundo plano de privatizações foi definido como um dos pilares do novo governo para a reabilitação da economia. Guedes não citou a lista de empresas que serão vendidas, embora tenha defendido durante a transição de governo a redução drástica das quase 150 estatais.
— Queremos as privatizações aceleradas.
Entre as estatais que seguirão com a União, de acordo com declarações do presidente Jair Bolsonaro, estão setores da Petrobras e Eletrobras, além da Caixa Econômica e Banco do Brasil.
Simplificação tributária
O novo ministro pontuou que pretende unificar até oito tributos em um imposto federal. Também defendeu a descentralização de recursos, ampliando os repasses para Estados e municípios. Para ele, a carga tributária brasileira precisa ser reduzida para um patamar inferior a 20% do PIB. Em 2018, o índice foi de cerca de 36%, afirmou.
— Acima disso (20%), é o quinto dos infernos. Tiradentes morreu por isso.
Desigualdade social
O fortalecimento da economia de mercado é uma forma de reduzir a desigualdade social, disse Guedes. Ele criticou a estratégia de manter o Brasil em uma economia fechada por quatro décadas.
— Implementar reformas causa ciclo virtuoso de emprego e renda e arrecadação.
Medidas quase diárias
Nos primeiros 30 dias no cargo, Guedes prometeu anunciar uma medida econômica a cada dois dias, para reduzir a burocracia e aumentar a produtividade. Serão iniciativas que não exigem a votação do Congresso, até que os novos parlamentares tomem posse, em fevereiro, e o governo possa apresentar propostas de reformas estruturais. O ministro adiantou que serão anunciados, na sexta-feira, ações de combate à fraude e a privilégios na concessão de benefícios que podem gerar economia de R$ 17 bilhões a R$ 30 bilhões por ano. Ele defendeu ainda o estabelecimento de uma identidade digital que, avaliou, poria fim a fraudes em todos os programas sociais.
Sem mais Refis
Guedes disse que há, atualmente, R$ 1 trilhão em tributos não pagos por contencioso e R$ 300 bilhões em desoneração.
— Quem sabe se imposto fosse mais baixo todo mundo pagava? Não tinha Refis? Aliás, acabar com Refis é prioridade — afirmou.
Cargos comissionados
O ministro listou a necessidade de reforma administrativa e disse que a quantidade de cargos hoje existente é excessiva.
— Já me disseram que é possível cortar 30% de cargos (comissionados) só na região que eu frequento, Fazenda, Planejamento, etc — mencionou.
As referências
Citou três exemplos de políticas liberais que deram certo na história recente: na reconstrução da Alemanha após a II Guerra Mundial, no Japão (não precisou o período) e no Chile, nos anos 1970.
Guedes disse que é hora de otimizar o crescimento. Segundo ele, o Brasil merece o revezamento de vertentes político-econômicas. Guedes citou o exemplo de políticas liberais, segundo ele, que deram certo, com as do período de reconstrução da Alemanha e do Japão e depois no Chile.
Mais mudanças?
Sem detalhar novas medidas, Guedes disse que pretende "abandonar a legislação fascista da Carta del Lavoro (inspiração da CLT brasileira)".