Com os resultados do PIB do fechamento do ano passado causando mais preocupação do que esperança, boa parte da expectativa de algum início de retomada da economia é colocada na continuidade do processo de queda do juro. O afrouxamento monetário, avaliam economistas, pode diminuir o endividamento, levar à melhora do consumo das famílias e, mesmo que de forma ainda débil, ajudar à retomada de investimentos pontuais. O Comitê de Política Monetária (Copom) volta a se reunir em abril e crescem as apostas no mercado de que o ritmo de corte da Selic, hoje em 12,25% ao ano, pode ser acelerado, para um ponto percentual.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou nesta terça-feira que a economia brasileira recuou 3,6% em 2016. Em dois anos, o tombo é 7,2%, a pior recessão desde 1948, apontou o IBGE. O economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), observa que, apesar de o setor ter arrefecido as perdas ano passado em comparação com 2015 – retração de 3,8% após queda de 6,3% –, os números do quarto trimestre mostram que a recuperação será bem lenta. A possibilidade de crescimento via investimento, puxado por parcerias e concessões no setor de infraestrutura, ainda deve demorar. E a indústria, por outro lado, tem alta ociosidade, o que indica pouca disposição de ampliar capacidade.
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– Via redução do juro podemos incentivar algum consumo e investimentos mais localizados. Depois isso poderia gerar um círculo virtuoso e o retorno do consumo também ajudar no crescimento do investimento – observa Cagnin.
O economista, entretanto, faz um alerta: o controle da inflação, base para redução de juro, não deveria ser atrelado à valorização do real, o que dificulta as exportações e a recuperação da indústria – segmento que foi o primeiro a sentir a crise e, depois, pela contaminação gerada no mercado de trabalho, se disseminou para os demais setores. As exportações, que no início do ano eram consideradas uma esperança, perderam ritmo e tiveram desempenho negativo nos dois últimos trimestres – apesar de ao longo do ano terem crescido 1,2%. E a importação, ajudada pela desvalorização do dólar, subiu nos últimos três meses de 2016.
Para o economista Rafael Baccioti, da Tendências Consultoria Integrada, o ciclo de afrouxamento monetário – ajudado pela queda da inflação – e a aprovação de reformas pelo Congresso "são aspectos centrais para a expectativa de retomada do crescimento a partir de 2017", aponta em relatório. Os números do quarto trimestre, pontua, decepcionaram um pouco e tornaram difícil a confirmação da projeção atual da consultoria de crescimento de 0,7% do PIB em 2017. O mercado, de acordo com o boletim Focus, do BC, espera 0,49%.
Recuperação tende a ser mais lenta do que o projetado inicialmente
Embora o efeito da redução do juro ainda seja limitado pelo processo em andamento de empresas e consumidores de se livrarem de dívidas, o corte da Selic atua para "reduzir o custo de realização dos investimentos e de ampliar a atratividade dos retornos esperados". Mesmo assim, pontua Baccioti, uma das poucas boas notícias do resultado foi o investimento, chamado de formação bruta de capital fixo, por cair menos do que o esperado (-10,2% ao final de 2016) e, ao longo do ano, reduzir a magnitude da contração.
A consultoria Rosenberg Associados vai no mesmo caminho. Considerando os números do PIB do quarto trimestre e os indicadores já conhecidos de 2017, optou por cortar a projeção de crescimento do PIB para este ano, de 1% para 0,7%. A avalia que a pressão aumenta sobre o Copom.
"A recuperação ocorrerá ao longo do ano de 2017, porém será um pouco mais lenta neste primeiro semestre do ano do que o inicialmente imaginado - o que corrobora nossa expectativa de que o BC será instado a antecipar ainda mais o ciclo de distensão monetária", diz análise da consultoria distribuída na terça-feira.
O professor Antonio Porto, da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV), avalia que o arrefecimento da inflação é a única notícia boa para o Brasil, o que abre a possibilidade de continuidade do ciclo de corte do juro.
– O endividamento, que inibe o consumo futuro, está caindo. Então, aos pontos, as pessoas estão resolvendo esse problema, que pode ajudar na recuperação da demanda – diz Porto, que , mais otimista, não descarta um avanço do PIB acima de 1% em 2017.
– Tendemos a subestimar a recuperação da economia brasileira o que, outras vezes, já ocorreu de forma rápida – observa.
O professor da FGV também avalia que a recuperação das finanças de grandes estatais, como a Petrobras, pode dar sua contribuição para a economia.