A operação de resgate do polo naval do Jacuí, em Charqueadas, depende de um novo sócio. Condição para a Petrobras manter US$ 800 milhões em encomendas no Estado, a definição de um parceiro para a Iesa Óleo e Gás deve ocorrer dentro de 60 dias.
Desde que interrompeu os trabalhos por falta de pagamento, a Iesa, braço do grupo Inepar para o setor de óleo e gás, teria atrasado a entrega de oito de 24 módulos que serão utilizados para equipar oito cascos replicantes que estão sendo fabricados em série em Rio Grande. Em nota a ZH, a Petrobras confirmou nesta segunda-feira à noite que está "tomando ações para mitigar o atraso da construção dos módulos", para evitar efeito cascata na entrega das plataformas. Uma reunião de emergência entre executivos da Petrobras, empresários gaúchos de petróleo e gás e autoridades, no sábado passado, na Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), em Canoas, condicionou a manutenção do contrato a novo sócio.
- A Petrobras entrou com tudo na busca por potenciais parceiros, e escolherá um nome para a Iesa. Há uma clara preocupação em manter as compras em Charqueadas para evitar litígios contratuais - explica um dos integrantes do governo do Estado envolvidos no projeto.
São três os candidatos mais fortes, conforme especialistas: Andrade Gutierrez, Odebrecht e UTC. A Petrobras quer uma empresa de grande porte para acelerar a entrega dos módulos e evitar atraso também na entrega das plataformas que serão usadas na exploração do pré-sal. A escolha do sócio sai em até dois meses. A retomada da fabricação dos módulos, no entanto, pode ocorrer antes disso.
Em nota, a Petrobras confirmou a criação da conta vinculada para que os pagamentos à Iesa sirvam de remuneração a fornecedores e empregados - que reclamam de atrasos desde o final do ano passado -, e não migrem para outros projetos do grupo Inepar. A expectativa é de que a Petrobras faça o depósito até o final desta semana.
- Há mobilização política e empresarial para que o trabalho seja retomado o quanto antes. O interesse é que a produção seja colocada em dia - afirma Marcus Coester, diretor da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs).
Os primeiros módulos deveriam ser entregues até junho. Ainda que o discurso seja de otimismo, preocupa fornecedores a hipótese de a Petrobras transferir parte das encomendas ao Rio de Janeiro. A prefeitura pediu ajuda a líderes regionais e ao governo do Estado para evitar que isso ocorra. Existe temor até em relação ao futuro do próprio polo do Jacuí, que testa sua viabilidade com esta primeira encomenda.
- Não está nos nossos planos uma suspensão dos contratos - diz o prefeito de Charqueadas, Davi Gilmar.
Fornecedores locais lembram que têm contratos já firmados para garantir suas entregas à Petrobras. Douglas Roso, diretor de Construções da Metasa, empresa gaúcha que opera em Charqueadas como parceira da Iesa na fabricação dos módulos, afirma que mantém a planta a plena atividade, e poderia transportar os módulos por caminhão para serem finalizados em outro local se fosse necessário.
- Evidentemente, não é isso que queremos. Temos uma estrutura completa aqui, só esperamos que a situação volte ao normal - diz Roso.
O que está em jogo
Risco para Rio Grande
Empresários e consultores descartam que a crise na Iesa tenha impacto na operação do polo naval de Rio Grande.
Na zona sul do RS, a empresa tem fatia de 13% no consórcio Quip, que integra módulos a cascos de plataformas, com três equipamentos já entregues.
Caso a situação da Iesa piore e tenha de deixar o consórcio, a hipótese mais provável é que os demais sócios cubram sua participação, uma vez que o negócio em Rio Grande é considerado bastante rentável.
Financiamento público
A frágil situação da Iesa pode causar perda aos cofres públicos: a empresa recebeu R$ 70 milhões do Banrisul em 2012 para erguer a unidade de produção em Charqueadas.
O banco do Estado não informa qual o prazo para que o financiamento seja pago ou se há atraso, mas garante que, neste momento, "a operação corre com normalidade".
Origem dos problemas
No mercado, é difícil explicar como uma empresa que faz parte de um grupo mergulhado em problemas teria passado pelo sistema rigoroso das licitações da Petrobras.
Na avaliação de executivos do setor, o mais provável é que a subsidiária Iesa tenha disputado o contrato "descolada" da holding problemática.
Pelas informações de mercado, as dificuldades do grupo decorrem de negócios em outros setores, especialmente energia e telefonia.
As perdas teriam se agravado nos últimos cinco anos, e, conforme especialistas em óleo e gás, teria levado a Inepar a drenar dinheiro de sua subsidiária de óleo e gás para cobrir prejuízos em outras operações.
Em 2013, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) multou a Inepar em R$ 4,5 milhões por deslocar recursos da Inepar Indústria e Construções à controladora Inepar Participações.
Uma outra Iesa
A líder do polo de Charqueadas é a Iesa Óleo e Gás, empresa com sede em Araraquara (SP) e instalações em Macaé (RJ).
No Rio Grande do Sul, é muito conhecido um grupo homônimo vinculado a concessionárias de veículos, sem nenhuma relação com a empresa que atua na construção de módulos de plataformas.
Gigantes montados aos pedaços
Cascos: oito bases de plataformas do tipo FPSO, também chamadas de navio-plataforma, estão sendo construídas em série no polo de Rio Grande. Também é onde os módulos são encaixados.
Módulos: é o que transforma o casco em plataforma. Parte desse equipamento deveria ser construída em Charqueadas, no polo de Jacuí. Os módulos formam a parte de cima das plataformas e incluem desde o alojamento para funcionários que trabalham e dormem a bordo até unidades de energia e as que que separam petróleo, água e gás.