Tive "sorte" de perceber que era negra por conviver com semelhantes durante a faculdade e isso aflorar naturalmente. Eu tinha 19 anos e deixei de me referir como parda em qualquer questionário da vida para me auto declarar negra. E isso não foi só uma mudança em meu vocabulário, me transformou por inteira.
Cresci em um mundo branco e não percebi a diferença em quase nenhum momento da vida, o que seria uma sociedade ideal, não é mesmo? Afinal, a quantidade de melanina na pele das pessoas não define a conduta de cada uma delas.
Viver entre aqueles que não tinham pigmentação como eu me deixou de fora da compreensão da identidade negra durante minha infância e adolescência. Sabia pouco sobre a história e me sentia deslocada diante de discursos negros. Me associavam a uma "brasileira típica" ao mesmo tempo em que alguns falavam que eu tinha uma "beleza exótica", e eu não sabia o que aquilo queria dizer.
O meu processo de "enegrecimento" começou quando decidi que não queria mais ter meu cabelo alisado. Deixei de usar química e passei pela transição capilar (período de abandono de processos químicos que transformam a estrutura do fio). Isso mudou minha vida!
Além da convivência com colegas negras, com histórias incríveis da comunidade negra de Porto Alegre, assumir meu cabelo natural foi parte fundamental para todo esse processo. Porque agora sim, eu estava por completa do jeito que era para ser.
Aliás, vivemos em um momento em que meninas e mulheres estão assumindo seus cachos, seus crespos e por mais que de início possa ser algo somente estético, muitas acabam se (re)conhecendo como negras também.
Quando digo que tive "sorte" de me reconhecer sem pressão nenhuma é porque sei que com outros não foi tão simples assim. Uns nascem sabendo, outros só percebem quando sofrem algum tipo de racismo e ainda há aqueles que se rejeitam e têm medo de enfrentar o que vem pela frente.
A quantidade de melanina na pele das pessoas não define a conduta de cada uma delas".
DUDA BUCHMANN
Estar bem com aquilo que se vê no espelho é um processo, pode demorar, mas é libertador. No momento em que reconhecemos nossa imagem, nossa pele, percebemos que temos um papel na sociedade. O de derrubar as barreiras impostas pela cor da nossa pele.
Hoje fico feliz e honrada de mostrar a beleza e força negra para milhares de pessoas diariamente. Receber o retorno de que estou ajudando algumas delas é o que mais me motiva a continuar nesse trabalho.
Se você não conhece, te convido a conferir meu Instagram, cheio de imagens lindas de mulheres negras e fortes: @negraecrespa.
Duda Buchmann é blogueira que gosta de falar do mundo feminino, principalmente da mulher negra, e de inspirações que elevem a autoestima delas. Escreve semanalmente em revistadonna.com.