Lembrarei eternamente da cena, da minha reação, do rosto da minha irmã caçula. Me servia de uma concha de feijão e uma colher de arroz quando ela parou do meu lado e colocou um envelope na minha frente.
– Estou grávida – comunicou, e ficou esperando minha reação.
HEIN?!!
Só que eu não tive reação.
– Estou grávida – ela repetiu, instigando qualquer resposta e querendo convencer a si mesma que, sim, ela estava esperando um filho e nada mais seria igual dali pra frente.
Fiquei muito, muito feliz, claro. Mas havia algo estranho dentro de mim. Quando me vi sozinha, desabei. Chorei compulsivamente como havia muito tempo não lembrava de ter chorado. Um choro diferente. Era um choro que demorei a compreender. Ele vinha das entranhas e profundezas da minha alma.
PARECIA UMA CRIANÇA
NÃO CONSEGUIA PARAR
FIASCO COMPLETO
Chorei sentada no sofá da sala, no quarto, deitada na cama, no banho, trancada no banheiro. Chorei na rua, dentro do carro, virando a esquina. Fui dormir chorando e, no dia seguinte, acordei inchada – e chorando.
NÃO CONSEGUIA PARAR
- CHOROU NO PASSEIO - FEZ A GENTE PAGAR MICO
Me vesti para a consulta na psiquiatra e, quando entrei na sala, sentei na poltrona e contei (chorando!) o que estava acontecendo, ela olhou para mim e disse:
– Percebeu a roupa que tu estás usando, Mariana?
Não, eu não havia percebido. Não havia me dado conta de que, inconscientemente, havia escolhido uma saia longa e uma bata bem larga por cima.
– Mariana, tu estás vestida de grávida. Tu estás grávida junto com a tua irmã – ela diagnosticou, sorrindo.
EU ESTAVA GRÁVIDA
Sim, eu estava grávida. Meu choro era de grávida. Eu e Lulu estávamos grávidas. Tudo passou a fazer sentido.
PAREI DE CHORAR (só círculo)
Muito havia ouvido falar de que filhos de nossas irmãs são nossos filhos também. Mas a teoria sempre só faz sentido quando a realidade se confirma. Quando João Benício nasceu, me tornei tia – e ser tia é o maior presente que um irmão e uma irmã podem nos dar. Ser tia é descobrir a maternidade de outra forma, é descobrir um amor que não sabíamos que existia.
AMOR EM ESTADO PURO
Quando me tornei tia, passei a enxergar as crianças sob outra ótica, com mais ternura e paciência. Passei a entender também a falta de paciência das mães em muitos momentos. Quando me tornei tia, passei a sentir mais saudade, passei a beijar e a abraçar mais. Passei a me preocupar mais com a humanidade, com o futuro, com o legado das pessoas e das coisas. Quando João nasceu, me tornei um ser humano melhor.
ELA QUE PENSA
Ser tia é amar profundamente uma pessoa que parece ter saído de dentro de nós. É encontrar tempo onde antes só havia falta de tempo. É segurar no colo, é não sentir dor no braço, é aguentar sem reclamar a dor nas costas. É deixar a garrafa de vinho e o Netflix de lado numa sexta-feira à noite para deitar ao lado de quem insiste em se manter acordado.
CADÊ DE DORMIR?!
Tias também são mães, são capazes de amar como mães.
Tias são a segurança das mães de que, em qualquer ausência delas, amor é o que jamais faltará.