Li uma reportagem sobre um jornalista que decidiu voltar 25 anos no tempo por uma semana. Explico: ele queria escrever como era a sociedade em 1987, ano que a revista na qual trabalha, a Superinteressante, nascia. Ele é jovem, não sei nem se já tinha nascido naquela época. Mas levou a sério o seu projeto.
Começou trocando as roupas modernas pelas usadas há 25 anos. A maior diferença foi na altura das calças: atualmente, os jovens as usam bem abaixo do umbigo. Antes, era acima da cintura. Para as mulheres voltou a ser moda, hoje, calça de cintura alta, mas neste ramo isso não é de se estranhar. Na moda tudo é cíclico. O que numa temporada é o máximo, na outra já está ultrapassado. Tudo muda rápido demais, passado, presente e futuro se misturam.
A camisa polo já era moda em 1987. E, segundo o jornalista, não poderia faltar o símbolo maior da cafonice: os óculos espelhados! Eu lembro que a gente usava mesmo. Eu achava lindo o modelo ray-ban espelhado... Veja só...
A experiência dele foi muito além do visual. Em casa, teve que desplugar todos os aparelhos modernos das tomadas. Só poderia usar o que as famílias possuíam há 25 anos em suas residências.
Entretenimento? Ele podia escolher entre aparelho de som (nós tínhamos em casa o popular 3 em 1,com rádio, gravador e tocador de fita K-7 e toca-discos, para os bolachões de vinil); a televisão (sem canais a cabo, óbvio); e o videocassete, para ver filmes, shows e qualquer coisa que se quisesse gravar da televisão. Ah, existiam videogames também. Com "controles" e cartuchos. E a gente adorava!
Os CDs só chegariam ao mercado no final daquela década, e rapidamente se tornariam objeto de desejo de todos. Além da praticidade (carregar uma pilha de vinil para as festas era mesmo cansativo e pesado), a qualidade do áudio era muito superior aos LPs e fitas K-7. Hoje, os discos de vinil só sobrevivem graças a uma legião de fãs fiéis, que ainda os procuram em sebos e lojas para colecionadores.
O jornalista entrou de cabeça nesta história. Decidiu convidar os amigos para uma festinha em sua casa, estilo anos 1980, respeitando toda a ambientação da época. Estava criado o primeiro impasse. Não podia se comunicar com os amigos pelo celular (que só se popularizariam no Brasil uma década depois) , nem mandar mensagem, torpedo, usar a internet, conectar-se ao Facebook, Skype e coisas do tipo, pois nada disso existia em 1987. Ele confessou que ficou meio sem saber como agir. "Como as pessoas faziam para se encontrar?" perguntou a si mesmo. Até que teve uma luz: usar o telefone fixo! Esse sim, ele podia. Conseguiu contato com poucos, deixou recados com familiares. Em casa, colocou uma secretária eletrônica ? aparelho que ele sempre chamou de "parafernália sem utilidade", quando visitava a casa dos pais.
O jovem jornalista é fã das novas tecnologias, porque, plugadas na rede 24 horas por dia, as pessoas se encontram o tempo todo. Não precisam esperar mais do que alguns minutos por uma resposta. A informação instantânea, seja via computador ou celular, aproxima as pessoas. Mas há também o lado ruim, conforme ele próprio constatou nesta volta ao passado. Segundo um estudo norte-americano, a maioria das pessoas checa o celular e as redes sociais a cada 15 minutos (ou o tempo todo), o que demonstra um comportamento de dependência.
"Eu senti uma certa leveza, livre do celular, da pressão, da dependência da internet, das redes sociais. Não tive ansiedade, nem senti falta de nada", confessou o jornalista, no final do teste de uma semana. Contou que conseguiu falar com a família e com os amigos mais próximos, marcar programas, se informar. Ou seja, o essencial, ele conseguiu fazer.
Para escrever o texto da reportagem, ele recorreu a uma máquina de datilografia. Levou para a redação, mas os colegas reclamaram do barulho. Neste meio tempo, acabou a semana de volta a 1987. Ele teve permissão para terminar de escrever o texto no computador, e recebeu de volta o celular, a TV de plasma com canais a cabo...
A conclusão da experiência do jornalista vale para todos nós: a tecnologia está aí, disponível. Resta a cada um decidir até que ponto a presença dela na nossa vida é saudável, e onde começa a dependência.