Uma relação amorosa vale quando você sai dela mais madura do que quando entrou. Uma viagem vale por termos voltado para casa mais abertos do que quando embarcamos. E um livro, mesma coisa: ele compensa quando a gente percebe que encerrou a leitura mais consciente do que quando a iniciou.
Foi esta a sensação que me deu ao terminar o livro da cantora Olivia Byington, O que é que ele tem. Conheço Olivia, já estivemos juntas algumas vezes, temos uma grande amiga em comum, mas nunca soube dos pormenores de sua vida íntima. Então, descubro que ela teve um primeiro filho com uma síndrome rara, e é sobre ele que Olivia escreve, escancarando um mundo novo para nós. Um mundo novo que não deveria ser novo, pois ela fala basicamente sobre delicadeza.
Acontece que a delicadeza tem sido mais rara do que a síndrome de Apert, que gera as terríveis deformações que tornaram o filho da Olivia diferente, e esse é o tema do livro: como lidar com a diferença. Não apenas a diferença entre uma criança com ou sem síndrome: a diferença entre um ser humano com delicadeza e outro não – e aí ela se refere a nós.
Eu sei que é difícil a gente não reagir com estranhamento diante do que é incomum, mas quanto tempo deveria durar um estranhamento? Em quanto tempo ele deveria evoluir para o acolhimento, o afeto, a compreensão?
O livro é tocante por inteiro, mas tem dois momentos que me emocionaram além do previsível. Um deles é quando Olivia narra a dificuldade em matricular o filho João nas escolas, e mesmo quando consegue, sofre com a maneira como ele é tratado. Ela então faz uma defesa incontestável da inclusão: quando uma criança com deficiência convive com crianças sem deficiência, são as "perfeitinhas" que ganham com isso, pois têm a oportunidade de desenvolverem a tolerância, aprenderem sobre superação e abrirem-se para a complexidade da existência. Óbvio. Olivia mostra com clareza como a convivência com os diferentes potencializa nosso aprendizado e nos faz valorizar ainda mais nossas bênçãos.
Outro momento que me fez suspirar. João passou por inúmeras cirurgias de reconstrução de face e órgãos, sofreu o diabo, submeteu-se a verdadeiros suplícios e flagelos para que seu organismo se adaptasse minimamente a fim de ter uma vida normal – um normal bem longe do que conhecemos. Ainda assim, em uma das vezes em que saiu do longo período no hospital e retornou para casa depois de mais um calvário, instalou-se em seu quarto e, pelo simples acesso a este pequeno conforto, exclamou:
– Ah, que vida boa. A gente reclama do que mesmo?