Após ter sido o 8° eliminado no Big Brother Brasil 4, em 2004, o gaúcho Marcelo Dourado voltaria ao programa em 2010 para se tornar campeão do reality show. Foi uma edição com muitas tensões e controvérsias – inclusive envolvendo Dourado, que foi acusado de homofobia. De qualquer maneira, a temporada é apontada como uma das melhores da história e segue reverberando 10 anos depois.
Neste mês, por exemplo, viralizou um vídeo em que Dourado criticava veementemente o filme 2012, que havia sido escolhido pela produção para os participantes assistirem. Muita gente no Twitter se identificou e começou a listar quais filmes lhe causaram a mesma reação.
Aos 47 anos (completa 48 na próxima quarta-feira, 29 de abril), Dourado tem investido na sua carreira de educador físico e atleta de jiu-jitsu. Em conversa com GaúchaZH, o ex-brother lembrou o BBB 10 e falou sobre as mudanças que ocorreram no reality show de lá para cá.
Em 10 anos, o que mudou no Big Brother Brasil, da edição que você venceu para a atual?
Evoluiu tanto nas questões sociais e nas bandeiras que entraram no programa como também acompanhou a polarização política que acontece no Brasil. Vejo hoje em dia muita divisão de time lá dentro, não digo nem conservador ou progressista, mas que as pessoas se identificam muito com as ideias fora do programa. Elas buscam muito mais referências dos participantes fora do reality. Antes, eram as matérias de fofoca sobre quem estava lá dentro que poderiam apresentar alguma coisa. Agora é muito mais fácil buscar em quem a pessoa votou, qual é o partido dela, quem ela gosta de ouvir ou se ela tem um post contra ou a favor do governo. Tudo isso acaba sendo usado no programa também. BBB acabou sendo utilizado para falar sobre questões sociais. Acho que é válido. Big Brother sempre foi uma curiosidade antropológica e social, nada mais justo que pessoas assistirem ao programa com um olhar mais crítico. No entanto, às vezes extrapolam, passa da barreira do entretenimento para a encheção de saco.
Este ano, as meninas levantaram a bandeira do feminismo, além de bandeiras de raça e etnia. É uma grande pegadinha do programa: você pode levantar bandeira, mas também ser morto por ela."
Tu mencionaste que o programa sempre foi uma curiosidade antropológica e social. Na sua opinião, de que maneira o BBB espelha a sociedade brasileira?
O princípio do programa é o entretenimento e não uma reflexão, mas acaba sendo (uma reflexão). Vejo que as pessoas se identificam com alguém que está lá dentro e têm curiosidade para saber como esse participante vai lidar com a adversidade, a intriga, com a pressão de ser líder. Acho que se aprende muito com isso, nesse quesito antropológico de conhecer o ser humano, ver as reações de outras pessoas, coisas que a gente não consegue ver própria na família. Isso acaba fazendo a gente refletir sobre hipocrisia e conduta, sobre manter a palavra, sobre como a amizade é tratada, até que ponto se tem interesse em ganhar dinheiro ou fazer as coisas que acha certo. Também temos debates de grandes grupos. Este ano, as meninas levantaram a bandeira do feminismo, além de bandeiras de raça e etnia. É uma grande pegadinha do programa: você pode levantar bandeira, mas também ser morto por ela. Sua bandeira também pode ser insuficiente para você ganhar contra o resto das bandeiras que têm. Quem é bom jogador, consegue o maior número de torcida de diferentes vertentes. Sendo fiel aos seus princípios, o público pode se identificar contigo em coisas que vão além de palavras. Me acusaram de homofobia e machismo, e as pessoas viram que não era isso, com atitudes e com as coisas que estavam acontecendo.
Até hoje, muita gente aponta o BBB 10 como a melhor edição do programa. Muitos vídeos daquela época voltaram a circular nas redes sociais. Esses dias viralizou uma crítica sua ao filme 2012 enquanto estava na casa. Enfim, é uma temporada do programa que segue reverberando após 10 anos. Como você avalia esse reconhecimento?
É com grande alegria que vejo que me tornei parte desse legado. A vida toda na arte marcial e na educação física batalhando, e, pô, ter um reconhecimento tão gostoso assim da galera com o Big Brother. Agora a galera sai com milhões de seguidores. Na época que saí, o Orkut estava morrendo e o Twitter crescendo. Eu não tenho tantos seguidores assim, mas a galera viraliza muito os vídeos daquela época. BBB é uma paixão do brasileiro nesta época do ano: para ver, se divertir, falar mal. Já tentaram me botar filho ou clone nesta edição (Felipe Prior). Em todas as edições sempre tentam especular quem é o novo Dourado. Pensei que iam me esquecer, que em um ano já não seria mais lembrado. Mas não, o carinho continuou. É uma coisa difícil para o brasileiro manter essa lembrança, a gente esquece de tudo. Quem foi campeão de futebol, qual foi a última novela, e incrível ainda lembrarem de mim.
E o filme?
Cara, se tem uma coisa que gosto de fazer é assistir a filme ruim. Sou de ficar falando durante o vídeo. Meus amigos gostavam de ver filme comigo, embora às vezes se irritavam, lógico. Eu não calo a boca. É uma característica minha ficar procurando os furos dos filmes. A galera gostou tanto (do vídeo viral), que vou fazer um review do 2012, alguma brincadeira com vídeo contando porque não gostei do filme. Ele vai bem até a metade, mas depois vira uma coisa esdrúxula.
Ainda sobre 2010 e o presente: é possível observar nas redes sociais, às vezes, que há pessoas que ficam surpresas positivamente com suas posições ou os seus comentários. De lá para cá, teve algo que mudou em você?
Minhas orientações políticas e sociais não mudaram muito. Meu candidato modelo sempre foi o Plínio de Arruda Sampaio. Sou um fã da educação como base da política. No programa, sempre falei das liberdades individuais, as quais sou defensor. Acho que todo mundo tem o direito sobre o que quer fazer com o próprio corpo em relação a várias coisas. Muitas pessoas acabaram me confundindo com o programa, que ficou com uma ideia da edição. Nunca tive nada contra as causas justíssimas de igualdade do grupo LGBT. São legítimas e nunca duvidei disso. Lá dentro, tinha adversário que usava de outros artifícios para tentar me difamar. Isso aí ficou para algumas pessoas por alguma edição simplória ou acreditaram nas acusações da galera que estava contra. Eu evolui como pessoa. Não poderia ser diferente o meu posicionamento político, com avós brizolistas e meus pais que foram exilados políticos e torturados.
Teve algum participante do BBB 20 que te chamou a atenção?
Me chamou atenção o Babu, por suas conversas e pelo tipo de alcance cultural, comentando sobre cinema e causas sociais. Achei muito bem montado o elenco. Tinha ótimos jogadores. Teve gente que se queimou muito rápido porque não aprende, não vê o programa antes de entrar, que não é para fazer panela ou excluir.
Quem você acha que vai ganhar?
Acredito que quem vai ganhar é a Manu, fazendo uma análise mais fria.
Se você participasse do BBB 20, como você acha que se sairia?
É difícil se colocar lá dentro, mas creio que teria bons embates. Pelo jogo em si, acho que seria bem legal. Teria bastante gente para discutir, afrontar, tentar desestabilizar. Faria bastante oposição e isso renderia no jogo. Mas fica muito difícil com a patrulha que existe, que exige uma conduta completamente idônea. Tem gente que tem uma militância ao seu favor, que às vezes só vê os erros dos outros. Age com uma seletividade na hora de cobrar. É quase impossível alguém passar pelo programa e ser tão bem avaliado em todas as atitudes. Acho que o programa não é para ver quem é o mais certinho ou enquadrado na missão.