Muitas vezes, o ser humano precisa encarar seus maiores medos para seguir uma vida, no mínimo, digna. É o caso de um médico recém formado que se vê diante do aluguel vencendo e da falta de empregos em sua área de interesse. Ele aceita o emprego em um Instituto Médico-Legal (IML), embora tenha medo de cadáveres, tanto que até passa mal quando fica perto de um.
Este é apenas um dos dilemas irônicos vivido pelo médico Richard (vivido por Rafael Pimenta) em Necrópolis, seriado com produção e elenco gaúchos que estreou no fim de março no canal pago Prime Box Brazil e teve seus oito episódios disponibilizados na íntegra em abril no catálogo da plataforma Netflix.
Diretor da série, ao lado de Tiago Rezende, Gabriel Faccini destaca que a grande preocupação do enredo vai muito além dessa situação tragicômica:
— O que sempre nos interessa é a ideia de questionar a relação que a nossa sociedade tem com a morte; como não nos preparamos, coletivamente, para lidar com a efemeridade da vida.
De fato, o espectador é confrontado com diferentes nuances a respeito do assunto. Necrópolis acompanha a adaptação de Richard junto a funcionários do necrotério: o administrador Peterson (Eduardo Mendonça), médico que cria uma pequena amizade com o protagonista e tenta transformar o espaço em uma grande startup; a delegada Rita (Kaya Rodrigues), que cola em Richard buscando confiança em suas autópsias para alavancar sua carreira; e Elisa (Gabriela Poester), jovem que acordou dentro do IML na hora em que ia ter sua “morte” analisada.
Mesmo com personagens bem caricatos e de personalidades definidas, o grande conflito do enredo gira em torno do médico novato, que luta por dias melhores e pela conquista do amor próprio.
— Ele é uma figura vulnerável, um jovem adulto incompetente, frágil, que se sente um fracassado. Isso gera identificação, porque somos assim em algum ponto da nossa vida – acredita o ator Rafael Pimenta.
Outra preocupação do texto foi criar uma situação ficcional tendo o Brasil como cenário, por mais maluco e engraçado que fosse esse espelhamento:
– É inevitável que surjam tensionamentos a partir disso também, ainda mais em uma situação política tão bizarra como a que estamos vivendo. Não tem como não se deixar contaminar. Com retrocesso e repressão, a tendência é de que as produções artísticas se tornem mais combativas, não tem jeito – acredita Faccini.
Produtora gaúcha investe em seriados
Planejado em 2013, Necrópolis é resultado da aposta de um grupo de amigos, com roteiro original de Tomás Fleck, Thiago Duarte, Luciano Braga e Vinicius Fontoura. Produzido pela Verte Filmes, de Porto Alegre, o piloto do seriado foi selecionado pela Chamada Pública do Prime Box Brazil em 2015, canal que viabilizou sua produção. A janela de exibição foi ampliada no dia 1º de abril, quando a série entrou no catálogo da Netflix.
– No entanto, Necrópolis não existiria não fosse pela aposta que o Prime Box Brazil fez. Eles têm um papel fundamental no fomento da produção local nesses últimos anos. Estamos crescendo juntos – diz Gabriel Faccini.
Segundo o diretor, uma continuação da série é possível, mas ainda está em segundo plano. A Verte Filmes, que já tem no ar outra dobradinha Prime Box Brazil/Netlix, com a série Alce e Alice, realiza a pré-produção de sua próxima produção, a série policial O Complexo, que recebeu financiamento via Chamada Pública do Cine Brasil TV, de 2016.