Quem acompanha o The Voice Brasil, já deve ter percebido. Ao lado de clássicos do rock e de músicas de cantoras pop, o sertanejo domina a escolha dos candidatos do reality show musical exibido pela RBS TV nas terças e quintas à noite. Duplas sertanejas da fase mais recente do estilo — como Matheus e Kauan — e também das gerações mais antigas — como Bruno e Marrone e Sérgio Reis — tiveram canções apresentadas por músicos, garantindo-lhes boas porcentagens na votação popular. Mas, afinal, por que o sertanejo se destaca?
Na última terça-feira (11), por exemplo, o gaúcho Léo Pain levantou o público com sua performance de “Anti-Amor”, sucesso de Gustavo Mioto. Sua apresentação garantiu vaga na nova fase do programa com mais de 75% de aceitação do público. Isso sem falar que o cantor do Alegrete superou Dreicon, que trouxe “Ao vivo e a Cores”, de Matheus e Kauan, para o palco.
Outros candidatos do reality também trouxeram o estilo ao palco, como o paulista Renan Valentti, o capixaba Edson Carlos, a mato grossense Morgana Rodrigues e a curitibana Flavia Gabê. Todos eles já performaram com faixas de sucesso recente, de Gusttavo Lima, e até caipiras, como Marciano e a clássica Ainda Ontem Chorei de Saudade.
Além disso, outro detalhe causa reflexão sobre a dominação do sertanejo dentro do reality. Michel Teló, um dos técnicos do programa, ficou invicto nas batalhas com seu time — foram nove vitórias. O paranaense de Medianeira, como o público sabe, é um dos nomes mais populares do estilo na atualidade.
Paradas musicais e TV
Por ser um programa antenado em tendências musicais e por ter uma audiência de diferentes faixas etárias, o repertório do The Voice se aproxima muito do que as rádios mais executam em suas programações. Se depender da preferência do público da 92 FM, a resposta está na ponta da língua.
Segundo Martim TJ, coordenador de produto e programação da rádio do Grupo RBS, 90% das faixas mais pedidas e mais executadas são sertanejas:
— É a música da moda. Eu nem chamo mais de sertanejo. É o verdadeiro pop brasileiro. Uma ou outra dupla é que tem o sertanejo raiz, mas está bem longe de ser maioria. É o estilo que domina as 50 canções mais executadas do Spotify e o nosso top 15 da programação — garante Martim.
De acordo com um levantamento realizado pela Connect Mix, das 10 músicas mais tocadas em todo o Brasil em 2017, nove delas podem ser consideradas sertanejas. Na televisão, então, a programação é visivelmente atraída em mostrar artistas do estilo.
— Veja o Só Toca Top, aos sábados [programa de Luan Santana e Fernanda Souza]: 70% das apresentações são de músicas sertanejas. Ou seja, a própria estrutura da televisão ajuda nesta divulgação — exemplifica o produtor.
Incentivo de outros estilos e simplicidade
Para o músico profissional e historiógrafo Henrique Mann, as letras das canções sertanejas da atualidade contribuem para a ascensão do estilo nas rádios e no reality.
— No Brasil, quanto mais difícil for a letra, menos ela é aceita pelo público. Pode ter certeza que o mais simples irá vencer, já que o foco é atrair a atenção do espectador. Não é novidade esta explosão no The Voice. Se fosse o contrário, eu juro que iria procurar um psiquiatra — brinca o especialista.
Esta capacidade limitada de criação das letras, segundo Martim TJ, da 92FM, é perceptível pelas alianças que o estilo tem apresentado recentemente. Nas paradas musicais, faixas de destaque entre as mais tocadas são produzidas pela união de artistas do sertanejo com representantes do funk — como por exemplo João Neto e Frederico com MC Kevinho.
— A geração mais antiga dos sertanejos, como Daniel e Chitãozinho e Xororó, não precisa dessa mistura, porque eles se sustentam por si só. Já esta nova leva precisa das parcerias, já que é a música da moda e está em constante mudança — pontua Martim.
Construção cultural
A colonização do Brasil, de acordo com Henrique Mann, auxilia a ascensão do sertanejo na Região Sul — motivo pelo qual Léo Pain acaba sendo rotulado. Ele explica que as primeiras capitais a serem ocupadas foram Rio de Janeiro, Recife e Salvador, ocasionando uma evolução mais rápida destas cidades.
— Nestas primeiras cidades, o estilo urbano se desenvolveu mais rápido e, por isso, o rap é tão forte nestes lugares como Rio e São Paulo. O sertão e o norte pegam a música de raiz. Já a região sul fica no meio do caminho, com a atividade agrícola muito forte e, então, o sertanejo é tão evidente.
Este pensamento é compartilhado por Martim:
— O rap não tem nada a ver com os gaúchos. Temos artistas deste estilo por aqui, mas a população não conhece. Ao mesmo tempo, existem muitas duplas sertanejas boas nascendo no Estado, boas vozes e letras, conquistando a rádio e muito público. O sertanejo é a nossa cara.
Para continuar em ascensão no reality, o coordenador de programação na 92 FM indica que os participantes continuem investindo no estilo, principalmente na nova fase que começa nesta quinta-feira. Ele espera que Léo Pain, o único representante gaúcho que permanece na disputa, pense bem nisso:
— A escolha do Pain está certa. Ele é cantor que já vem do estilo e naturalmente foi apresentando canções sertanejas. Ele deve seguir com o pé no sertanejo, é o chão dele. Assim, ele deve ir longe e até vencer — aposta.