– Não sou atlética por natureza – admitiu Alison Brie uma tarde, aqui em Chelsea. Vendo-a em seu papel atual, porém, não é o que parece.
A atriz de 35 anos vem trabalhando o corpo no limite como protagonista de GLOW, comédia da Netflix sobre um grupo de lutadoras, inspirada na franquia Gorgeous Ladies of Wrestling, dos anos 1980.
Na pele de Ruth, uma atriz que não consegue se firmar e acaba se tornando combatente profissional, Brie teve que fazer permanente no cabelo e aprender a girar no ar feito acrobata.
– É meio como aprender a fazer queda livre sabendo que não tem ninguém para me segurar – descreveu semanas antes da estreia da segunda temporada.
Para a primeira, o elenco teve apenas um mês de treino e preparação, partindo de movimentos como estrelas simples, para os mais complexos, como a chave de pescoço e o suplex.
– O suplex é quando você levanta a adversária, de perna para cima e tudo, e depois a joga para trás. Virou meu golpe favorito. E olha que já joguei e fui jogada – conta ela, animada.
Apesar de ter assumido personagens fortes em Mad Men e Community, nada até então a preparara para as exigências físicas de GLOW. Sorte que sabe o que é não ter medo de nada.
No Instituto de Artes da Califórnia, onde estudou, tinha uma queda pela "chispada". ("As regras da faculdade eram bem tolerantes em relação aos nudistas", relembra.) Aos 17, passou um verão inteiro sendo palhaça de festa, o que a imunizou contra todas as formas futuras de humilhação.
– Acho que aquela coisa de não querer me mostrar intimidada por aqueles monstrinhos, no ringue virou um lance tipo: 'Nunca mostre que está com medo. Vai lá. Mete os peitos'.
E foi assim que, com uma hora livre, a estrela concordou em aceitar um novo desafio: a Rumble, febre da vez das academias, que oferece uma mistura de boxe e treino de força e já conquistou nomes como Selena Gomez, Kendall Jenner e David Beckham.
Brie se mostrou disposta, ainda que cética.
– Tem sempre uma modinha fitness rolando, mas nenhuma me interessou até agora. Levei um tempão para entrar na do SoulCycle, justamente porque o pessoal falava e elogiava tanto. Mas aí fui experimentar e adorei. É superdivertido! – diz.
Na academia da West 23rd Street, ela foi recepcionada pela instrutora e fundadora, Erika Hammond. Brie foi se trocar e a seguiu para seu estúdio particular. E colocou luvas sem dedos para proteger os nós dos dedos.
"Você é destra ou canhota?", Hammond perguntou antes de mostrar os seis golpes básicos do método: jab, cruzado, gancho frontal, gancho posterior, uppercut frontal e uppercut posterior.
– Respire ao dar o golpe – ensinava enquanto as duas praticavam, lado a lado, no espelho. – O negócio é vir de baixo, assim você consegue impulso do quadril.
Depois de pegar o jeito dos movimentos (mais ou menos), Brie calçou luvas de boxe brancas, acolchoadas, enquanto Hammond preferiu a versão simples, preta. Começaram a dar voltas uma ao redor da outra e a instrutora começou a anunciar combinações de números ("Um! Dois! Um! Dois! Vai!"), Brie deu uma série de socos.
– Igual à luta livre! – comenta Brie.
Sua personagem em GLOW é, metaforicamente, o saco de pancadas, mas será que Brie estava disposta a fazer o mesmo na vida real?
– Quero que você aplique ganchos nisto aqui – disse Hammond, levando-a em direção de um saco em forma de lágrima no fundo da sala.
Brie bateu de baixo para cima, depois de lado, quando a instrutora gritou:
– Mais rápido no uppercuts, bum, bum bum!
A seguir: defesa. Hammond mostrou a Brie como fazer a esquiva, ou seja, mover a cabeça para o lado e mover os joelhos para escapar do jab adversário. A professora mostrou dois macarrões de espuma e avisou: "Vou golpeá-la com eles."
A seguir, Brie se viu encolhendo os ombros para evitar as pancadas, direita, esquerda. Viu-se de relance no espelho e disse, "Gente, pareço uma ogra."
Uma curiosidade: Hammond foi uma "Diva" da World Wrestling Entertainment antes de se tornar personal trainer, mudança profissional causada por um menisco rompido, depois de ter aplicado um backbreaker. Como lutadora, assumia uma personagem esfuziante no ringue.
– Meu nome era Veronica Lane e eu era a rainha da beleza – revela.
"Ou seja, o rosto", concluiu Brie. Na luta livre profissional, o "rosto" é o herói e o "calcanhar", o vilão. Em GLOW, Ruth acaba aceitando que é melhor de vaias do que de aplausos e se reinventa como o verdadeiro "calcanhar" da Guerra Fria: uma gostosona soviética chamada Zoya, The Destroya.
– Todo rosto precisa de um calcanhar à altura –, constata.
Hammond, ainda relembrando os tempos de disputas, afirma:
– Tem um pequeno detalhe que você vai buscar na sua vida, e é a forma como seu personagem se desenvolve.
– É tão legal saber que estamos no caminho certo! No seriado, as meninas passam praticamente o tempo todo tentando interpretar suas personagens no ringue e criar seus próprios enredos – explica Brie.
– Já deu um tabefe em alguém? Eu deixava um vergão vermelho – se gaba Hammond. – É mais comum a gente puxar cabelo do que dar tapa – explica Brie.
Uma aula estava acabando no andar de baixo, então as duas se dirigiram para o salão principal, com as paredes forradas de espelhos, iluminação indireta, vários sacos de areia e um DJ tocando Busta Rhymes.
– Gostei! – diz Brie, que experimenta um soco inglês e começa a se movimentar em frente ao espelho.
Não demorou para o pessoal da aula das duas começar a entrar, mas Brie não estava pronta para ir embora ainda. Acabou cancelando os planos que tinha para aquela tarde e, com Hammond na sua cola, desapareceu entre a coluna de sacos com o resto da turma.
Por Michael Schulman/The New York Times