"Essas austeras casas mergulhadas em vaga nostalgia / Deixando pedaços de nós em cada quarto, varanda, corredor / Soltando para sempre nossa voz nas altas salas". Esse e outros versos da poeta pelotense Norma Vasconcellos embalaram o cortejo cênico Fragmentos de nossas casas, que percorreu ruas e museus do centro de Porto Alegre na manhã deste sábado (17) para celebrar o primeiro Dia Estadual do Patrimônio Cultural.
Durante quase duas horas, a jornada de poemas, interpretada por sete atores e um músico, passou por oito prédios históricos da Capital. A caminhada cênica teve início no Palácio do Piratini e se encerrou a 500 metros dali, na Casa de Cultura Mario Quintana, ao som de "Felicidade foi-se embora / E a saudade no meu peito ainda mora".
O circuito incluiu o Museu Júlio de Castilhos, a Biblioteca Pública do Estado, o Theatro São Pedro, o Memorial do Rio Grande do Sul, o Museu de Arte do Rio Grande do Sul (Margs) e o Museu Hipólito da Costa. Em cada prédio, os artistas, leram poemas que faziam referência ao cômodo de uma casa.
— É uma imersão ao interior de uma casa na visão de alguém que gostaria de ter preservado aquele local — resumiu o diretor do Instituto de Artes Cênicas, Rubinho Oliveira, que idealizou o percurso.
Por onde andou, o cortejo despertou olhares curiosos e sorrisos de quem aproveitava o dia ensolarado e quente na área central. Desde a descida da General Câmara, até a Andradas, um dos artistas, vestido de fantasma, ia convidando o público:
— Para onde vamos? Ao vento!
Um grupo de escoteiros de Novo Hamburgo, em visita à Capital, assistiu à encenação no Museu Júlio de Castilhos. Ali, as 20 crianças e seus oito supervisores ouviram uma interpretação de "Era uma casa / Muito engraçada / Não tinha teto / Não tinha nada".
— Eu gostei muito do piano, porque dá para fazer músicas incríveis — comentou a escoteira Laura Berg, 10 anos.
Assim como as crianças, uma plateia desavisada foi embarcando na caminhada ao longo das paradas. No Memorial, um casal de idosos vindos de Guaíba foi pego de surpresa enquanto visitava uma exposição sobre lã.
— Muito bom! — celebrou o vendedor Alberto Maciel, 73.
Bem ao lado, no Margs, um casal de franceses que havia chegado à cidade fazia duas horas foi conferir, no saguão, a performance. Mesmo sem entender português, disseram-se satisfeitos.
— Fomos surpreendidos, ela canta muito bem — contou o professor Victor Schubnel, 29.
Dia Estadual do Patrimônio Cultural foi instituído neste ano no RS
Instituído por decreto assinado em abril deste ano, o dia de comemoração no Estado acompanhou o Dia do Patrimônio Cultural, celebrado nacionalmente. Foi uma iniciativa da secretária da Cultura, Beatriz Araujo, inspirada em um movimento semelhante de abrir museus e promover a arte que conheceu durante uma viagem de carro pelo Uruguai, há uma década.
— Espero que a gente possa fazer com que a arte esteja sempre celebrando a memória e projetando o futuro — disse a secretária, no encerramento da atividade.
Beatriz já havia levado a festividade em homenagem ao patrimônio cultural a Pelotas, quando era secretária no município. Agora, a nível estadual, conseguiu que mais de 60 municípios gaúchos participassem.
— Não é preciso muito dinheiro, basta ter criatividade — afirmou o diretor do cortejo Camilo Lelis, que montou o espetáculo gratuito e lúdico com um orçamento, segundo ele, miúdo.