
Por Luís Francisco Wasilewski
Doutor em Literatura Brasileira pela USP, pós-doutorando no Programa Avançado de Ciência e Cultura da UFRJ
"A primeira pessoa que me falou com entusiasmo da dramaturgia de Qorpo-Santo foi Luiz Carlos Maciel, no final da década de 1950."
Ouvi essa frase há 19 anos do saudoso Linneu Dias, quando pesquisava a obra do escritor gaúcho do século 19. Quando Linneu ouviu esse enunciado, ele, Mário de Almeida, Paulo José e Paulo César Peréio atuavam na histórica montagem de Esperando Godot, de Samuel Beckett, sob a direção de Maciel, em Porto Alegre, em 1958.
Também foi Maciel que apresentou ao grupo o texto beckettiano, o que já demonstrava que o escritor e diretor gaúcho, que nasceu em Porto Alegre, em 1938, e faleceu no último dia 9, no Rio de Janeiro, era o que os intelectuais chamam de "antena da raça".
Além do teatro amador, merece ser lembrada sua atividade como poeta no grupo Quixote (ao lado de nomes como Heitor Saldanha e Geraldo Escosteguy), outro movimento importante da década de 1950, bem como sua atuação no Clube de Cinema de Porto Alegre.
Em seu livro Geração em Transe: Memórias do Tempo do Tropicalismo, editado pela Nova Fronteira em 1996, Maciel relembrou: "Nós, os jovens porto-alegrenses, desejávamos apenas ser críticos, não cineastas. Olhávamos os mais velhos, também sócios do Clube, muitos já exercendo a crítica, e queríamos, a exemplo deles, demonstrar nosso amor e conhecimento pela sétima arte através da crítica. Pensávamos em ver e falar sobre filmes. Fazer não".
Foi por meio de um amigo em comum, o poeta Paulo Gil, que Maciel conheceu Glauber Rocha. Trabalhou como ator no segundo curta de Glauber, A Cruz na Praça (1959), onde era retratada a procura de um homossexual que persegue um rapaz bonito, tendo Salvador como cenário.
Outros dois grandes nomes da cultura brasileira de quem ficou próximo na década de 1960 foram Caetano Veloso e José Celso Martinez Corrêa. A partir da estética teatral de Zé Celso, Maciel dirigiu, em 1968, no Rio, com produção do grupo Teatro Jovem, As Relações Naturais, um dos textos dramáticos mais importantes de Qorpo-Santo. Conseguiu colocar em cena sua paixão pelo autor, cuja importância havia sido descoberta poucos antes.
Os críticos arrasaram a encenação. Yan Michalski, na época o nome mais importante da crítica teatral carioca, escreveu no Jornal do Brasil que eles haviam reduzido os dons poéticos de Qorpo-Santo a uma verdadeira debilidade mental.
Em 1969, com a criação do jornal O Pasquim, do qual foi um dos fundadores, coube a Maciel assinar a coluna Underground. O espaço o transformou em "guru da contracultura", expressão que, em tom jocoso, dizia que o acompanhou por toda a vida. Sobre sua adesão à contracultura, escreveu em Geração em Transe: "O movimento underground, o chamado 'desbunde', era uma contrapartida para aqueles jovens que não se exilaram (ou foram exilados) nem tinham a coragem ou insensatez de pegar em armas. Era uma atitude condenada, em especial pela esquerda, porque significava participar de um movimento importado dos EUA. Me tornei um dos maiores divulgadores da postura desbundada, que me pareceu ser a resposta mais criativa, mais eficiente e mais enriquecedora para a situação que estávamos vivendo".
Tornou-se, então, um divulgador da literatura de Carlos Castañeda e da filosofia de Herbert Marcuse, só para citar dois nomes que seu trabalho como jornalista ajudou a revelar ao país. Também atuou como roteirista na TV Globo e autor colaborador de novelas da Record.
Em 2015, escreveu no Facebook que e atravessava uma situação financeira difícil. Um triste desfecho para um nome tão importante para a cultura brasileira.