A insistência de um grupo engajado em preservar a cultura gaúcha fez ressurgir dos entulhos o prédio do único Centro de Tradições Gaúchas do Bairro Restinga, no Extremo Sul de Porto Alegre. Hoje, o CTG Porteira da Restinga é exemplo de que a união de uma comunidade pode ser transformadora.
Abandonado pelos administradores e destruído pelo tempo, o espaço construído em 1982 estava praticamente esquecido no coração do bairro. Foi quando o comerciante Tarciso Falconi, 41 anos, que na infância e na adolescência participou ativamente do Centro, ganhou na Justiça, em 2008, o direito de assumir a patronagem. Estava disposto a reerguê-lo, mesmo que fosse sozinho. A história do CTG que tentava se reerguer foi publicada no Diário Gaúcho em setembro de 2010.
No começo, apenas metade do prédio tinha telhas. A outra parte era coberta por lonas. Nem isso fez Tarciso desistir. De porta em porta, passou a divulgar a reabertura do local. Em dois anos conseguiu restituir as invernadas mirim e juvenil do CTG, e reconquistou quem era interessado na tradição gaudéria. O homem que passou a amar a cultura gaúcha ao aprender a montar num cavalo, não esconde o choro de orgulho do que está plantando e colhendo no terreno do Centro.
— Quando assumi, tive que desmanchar a estrutura precária para poder usar o espaço. Contei com o apoio da comunidade para arrecadar o material necessário. Sem os moradores, isso não seria possível — registra Tarciso, que agora é segundo secretário do CTG depois de deixar a patronagem neste ano para dedicar-se aos estudos na faculdade de Gestão do Esporte e Lazer.
Leia mais
Confira a programação do Acampamento Farroupilha de Porto Alegre
Veja o que abre e o que fecha no feriado de 20 de Setembro em Porto Alegre
A parte de lonas foi reconstruída com telhas e madeiras usadas. Algumas, inclusive, retiradas de restos de entulhos. O piso do tablado foi comprado por um preço mais em conta porque ele era de segunda mão.
Outra ação de Tarciso foi oferecer cursos de fandango para crianças e adultos. Mas a proposta encontrada para atrair pais e filhos, e que faz sucesso até hoje, são as aulas aos sábados de lida campeira para crianças, com treinos de rédea e de laço com vaca mecânica e vaca parada e de cavalgada para iniciantes. Pelo menos 40 frequentam o curso. E os resultados começaram a surgir: em julho deste ano, Thais Kailane Sales, 14 anos, conquistou pelo CTG o primeiro lugar na prova de rédea no Rodeio Nacional dos Campeões, em Querência (MT).
— Enfrentamos um pouco de resistência das crianças em aceitar a tradição e a disciplina, mas quando elas começam a gostar, já querem aprender a dançar também. São as crianças as responsáveis por atraírem os pais mais distantes da tradição — comenta Tarciso.
Aos poucos, o CTG voltou a encher, inclusive, com moradores de outros bairros. As redes sociais do Centro criadas por um dos integrantes ajudaram a ampliar a divulgação. Hoje, são cerca de 200 sócios. Porém, apenas 10% deles contribuem com o valor mensal de R$ 20 por família integrante. O dinheiro é insuficiente para quitar os gastos fixos de R$ 1,5 mil com água e energia elétrica. A atual administração buscou parcerias com empresas privadas e, até, com o poder público, como projeto cultural, mas segue sozinha na tentativa de manter-se firme. Para arrecadar verba, Tarciso e o atual patrão do Centro, Luis Unírio Leite, 70 anos, organizam bailes e almoços com apresentações das invernadas do CTG.
— As pessoas comparecem. Conseguimos reunir até 300 pessoas numa noite de baile. Nos falta é mais apoio por sermos uma entidade cultural existente num dos bairros mais carentes de Porto Alegre — diz Luis.
Quando recorda o que enfrentou e pensa no futuro do Porteira da Restinga, Tarciso não esconde as lágrimas. Nas palavras engasgadas, resume:
— O CTG nos une. Muitos dizem que a tradição é muito exigente, mas é uma coisa benéfica. Apesar das dificuldades, conseguimos criar um ambiente saudável para a família restinguense conviver dentro da nossa comunidade. Dá um orgulho danado.