Peppa Pig, que começou a ser exibida em TV aberta recentemente, foi chamada de feminista por políticos conservadores. Na Austrália, a porquinha - que é o vício de grande parte das crianças do mundo - virou assunto de discussões políticas, tudo porque as questões de gênero e de constituição familiar são mais flexíveis do que em outros programas infantis. Para especialistas, essa novidade pode ser vista como reflexo de um debate que já ocorre na sociedade. E a Peppa não é a única.
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Enquanto a família da porquinha divide as tarefas em casa (enquanto a mamãe trabalha no computador, o papai prepara a janta), desenhos recentes e destinados a crianças e jovens um pouco mais velhos, como Hora de Aventura e Apenas um Show, têm liberdade para abordar questões como essa de maneira bastante profunda.
- Essa mudança é importante, porque ajuda a mostrar para a criança como a vida realmente é. A gente acha que as crianças precisam ser infantilizadas, então não permitimos que elas tenham acesso a certos temas. É importante que a criança não veja a vida só dessa forma muito fantasiosa - avalia Jane Felipe, professora da faculdade de Educação da UFRGS, do Grupo de Estudos de Educação Infantil e Infância (GEIN).
Relembre cinco vezes em que desenhos infantis abordaram questões de gênero, representatividade e família:
1. Peppa Pig e a formação familiar
Num dos episódios mais conhecidos do desenho, Peppa apresenta sua família: George, seu pai e sua mãe. Quando mostra sua casa, os pais estão praticando duas atividades normais, mas que, de certa forma, vão contra o padrão homem-trabalhador e mulher-dona-de-casa. Para a professora Rosa Fischer, um assunto recorrente, mas com nova roupagem:
- Os desenhos estão se aproximando das temáticas de gênero. As novas relações familiares são uma discussão que vai e volta. No tempo do Tio Patinhas, por exemplo, as primeiras análises mostravam a estrutura familiar daqueles personagens não era completa, já que eles nunca tinham pai ou mãe, só tios. Agora, são as temáticas contemporâneas, que mostram a mulher no poder.
2. Hora de Aventura e a representatividade feminina
Um dos desenhos que mais aborda essas questões é Hora de Aventura. No episódio I Remember You, o Rei Gelado pede ajuda a Marcelline para compor uma música que atraia princesas - apesar de a personagem negar e se mostrar distante, o rei insiste e invade sua casa. Uma frase dita pelo personagem principal Jake chama a atenção:
- Seu assédio constante ao sexo feminino me enoja!
3. Padrinhos Mágicos e a masculinidade
É comum que discussões bastante complexas de gênero apareçam neste desenho. Na imagem acima, o pai de Timmy, o personagem principal, pergunta "onde, nesta sociedade de um só lado, está escrito que um homem não pode ser bonito". Há outro episódio, intitulado The boy who would be queen ("O menino que seria rainha"), em que Timmy se transforma em uma menina para descobrir qual é o presente perfeito para Trixie. A conclusão do episódio mostra que nem todas as meninas pensam igual - ou seja, não há "presentes de menina" ou algo do tipo.
- A questão da ambivalência reflete muito o contemporâneo. O que é o homem? O que é a mulher? Os desenhos mostram muito a questão do ambíguo, de ter duas ou várias coisas presentes em só uma pessoa - diz a professora Analice Pillar, da Faculdade de Educação da UFRGS, especialista em produções de mídia e da arte
4. Apenas um Show, as mulheres e a mídia
- Ah, então você concorda que mulheres não são bem representadas na maior parte da mídia popular?
Essa é a pergunta - bastante séria - de uma personagem do desenho Apenas um Show. Ainda que a questão tenha sido trazida em um episódio em que o personagem principal passa por uma série de encontros desastrados e a personagem que pergunta seja mostrada como a chata que traz assuntos políticos para situações leves, a questão está lá.
5. Bob's Burgers e as mulheres inteligentes, fortes e sensuais
Bem claro:
- Eu estou cansada de agir como uma menina burra e indefesa e esperar que garoto bonito me perceba. Eu não sou isso. Eu sou uma mulher inteligente, forte e sensual.
Quanto a isso, Rosa Fischer aproveita para analisar a questão da influência que os desenhos causam nas crianças.
- Eu não gosto da palavra "influência". Não concordo que o desenho vai fazer a cabeça da criança. Acho que ela pode experimentar sensações, imagens e ideias sem ser doutrinada.