Duas vezes ganhadores da Palma de Ouro - primeiro por Rosetta, em 1999, depois por A Criança, em 2005 -, os diretores belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne voltaram ao Festival de Cannes no ano passado com Dois Dias, Uma Noite (2014). O filme que entra em cartaz hoje no Espaço Itaú 8 ainda pode render o segundo Oscar à atriz francesa Marion Cotillard, já premiada com a estatueta dourada por Piaf - Um Hino ao Amor (2007).
O cinema humanista dos irmãos Dardenne mostra desta vez a emocionante luta de uma operária (interpretada por Marion) para reverter, em apenas um final de semana, uma votação na qual seus colegas optaram por um bônus salarial em troca de sua demissão. A situação é cruel para todos: recém-recuperada de uma depressão, Sandra tem somente os dois dias e uma noite do título para convencer os trabalhadores a abrirem mão de um prêmio de mil euros a fim de que ela possa ser readmitida na fábrica. Ao bater de porta em porta com seu constrangedor pedido, a protagonista depara com a miséria e a grandeza da condição humana: da rejeição à solidariedade, passando pela indiferença, pelo medo, pelo ódio e pelo desprendimento - nessa bacia das almas, Sandra vê suas chances de redenção minguarem a cada hora que passa.
Dois Dias, Uma Noite segue o rigor formal característico dos dramas da dupla de cineastas: ausência de trilha sonora, abundância de sequências rodadas com a câmera no ombro - o que empresta um tom documental às imagens -, ênfase nas cenas cotidianas que revelam as sutilezas das relações, especialmente as familiares. Da mesma forma que em títulos como O Filho (2002) e O Silêncio de Lorna (2008), os Dardenne evitam os maniqueísmos ao desnudar sem pudor os dilemas morais dos personagens, exigindo do público mais do que julgamentos apressados. Dois Dias, Uma Noite destaca a crítica social no cinema dos realizadores belgas: as contradições do capitalismo ficam evidentes ao mostrar os empregados envolvidos em uma deprimente disputa interna imposta pelos patrões. Nesse sentido, os Dardenne aproximam-se de filmes do francês Robert Guédiguian como A Cidade Está Tranquila (2000) e As Neves do Kilimandjaro (2011) e do inglês Ken Loach em Riff-Raff (1991).
Uma das melhores atrizes do cinema contemporâneo, Marion Cotillard impõe sua presença carismática em Dois Dias, Uma Noite - nem mesmo a desglamourização da personagem foi capaz de esconder a beleza da estrela de A Origem (2010) e Era uma Vez em Nova York (2013).
DOIS DIAS, UMA NOITE
De Jean-Pierre e Luc Dardenne
Drama, Bélgica/França/Itália, 2014, 95min. Estreia nesta quinta-feira no Espaço Itaú 8 (14h40, 16h30, 20h, 22h)
Cotação: 4 de 5
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