Há um consenso entre os leitores: o preço do livro deveria ser mais baixo. Mas a discussão sobre como conseguir esse feito provoca polêmica no mercado editorial -dentro e fora do país. Na semana passada, a ministra da Cultura da França, Aurélie Filippetti, acusou o portal de vendas Amazon de "abuso de posição dominante" por conta das restrições impostas à Hachette, editora francesa que se recusa a assinar um acordo pela redução drástica de seus e-books. Na mesma semana, Ivan Pinheiro Machado, diretor da L&PM, despertou críticas de escritores nas redes sociais ao afirmar, em entrevista à ZH, que o preço do livro é baixo - "Caro é o direito autoral", disse.
O conflito entre Hachette e Amazon se intensificou em maio, quando a editora acusou a livraria virtual de suspender descontos ao leitor e dificultar a entrega de livros de seu catálogo. No início deste mês, a Amazon publicou um comunicado incentivando seus clientes a escrever à editora, pressionando-a a assinar o acordo pela redução de preços. Em resposta, foi veiculada no The New York Times uma carta pedindo que a Amazon "pare de prejudicar a vida dos autores", com a assinatura de mais de 900 escritores, incluindo best-sellers como Stephen King.
Já a afirmação de Pinheiro Machado teve repercussão local. "Lamentável Ivan Pinheiro Machado afirmar que a culpa do alto preço dos livros é dos 10% de direitos autorais. Fiquei pensando em quantos autores a L&PM revelou nos últimos anos... Difícil, só lembrei de livros em domínio público ou de autores já consagrados pela mídia", escreveu o autor Marcelo Spalding, em seu perfil no Facebook.
Procurado por ZH, Pinheiro Machado afirmou não estar contra os autores, e sim falando de um caso em particular:
- Estava contando uma anedota sobre um autor chato que insistia em me dizer que o livro no Brasil era caro, enquanto eu dizia que não. Então, falei para ele: "Se baixar teu direito autoral, vai ficar mais barato". Mas não existe na conta de um livro um valor mais justo do que o direito autoral, pela simples razão de que o autor é quem cria o produto.
Os 10% de direito autoral são apenas um padrão estipulado e, na prática, é comum escritores ganharem percentuais inferiores a este.
- Não há recomendação legal alguma sobre esse percentual - destaca Cesar Peduti, advogado especializado no tema.
Maiores tiragens, menores preços
Quem abocanha as maiores fatias do valor - e dos custos - da venda de livros são editoras e redes de livrarias. A negociação entre elas é determinante no preço do livro.
- O mais caro da cadeia é ter que dar desconto de 50% a 60% sobre o preço de capa para distribuir os títulos nas livrarias. Como as grandes redes estão tomando conta do mercado, estamos na mão de poucos, não há como barganhar - diz Marco Cena Lopes, da BesouroBox.
Já o diretor comercial da Livraria Cultura, Alexandre Fonseca, devolve a questão às editoras:
- Eu poderia abdicar de parte dessa margem se houvesse efetivamente um movimento das editoras para baixar o preço dos livros.
Fonseca vai além e inclui outra variável, o público:
- Grandes livrarias de fora do país recebem descontos semelhantes aos nossos. Mesmo assim, o livro em muitos países é mais barato do que aqui. O fator preponderante é o tamanho do público leitor, que se reflete nas tiragens das editoras.
Tomás Pereira, da editora Sextante, concorda:
- Sempre que conseguimos fazer tiragens maiores, o valor unitário de cada livro baixa.
O preço do livro em fatias
Direito autoral - cerca de 10%
O pagamento de 10% sobre cada exemplar vendido para os escritores é prática comum no mercado, mas esta não é uma exigência prevista em lei. Os valores podem variar entre 3% e 12% do preço de capa, dependendo de negociação com a editora: autores consagrados e com grande capacidade de atrair leitores garantem percentuais maiores, enquanto iniciantes geralmente recebem valores menores. Nos livros infantojuvenis, é comum que escritores dividam seu percentual com ilustradores, que também são considerados coautores da obra.
Editora - cerca de 40%
São as editoras que estipulam o preço de capa de um livro. Elas costumam ficar com cerca de 30% a 40% desse valor. Além do lucro, este montante deve cobrir custos de impressão, tradução, revisão, editoração, transporte, entre outros.
Distribuidora e livraria - cerca de 50%
Atualmente, as redes de livraria são as maiores responsáveis pela distribuição de livros. Comprando os produtos diretamente das editoras com descontos de 50% a 60% sobre o preço de capa, podem repassar parte desse desconto para os clientes ou abocanhar essa margem integral sobre cada livro vendido. Distribuidoras podem fazer compras por patamares semelhantes e revender para livrarias menores, que acabam ficado com aproximadamente 30% do preço final.
Na ponta do lápis
Em média, se você pagar R$ 50 por um livro, o autor ficará com R$ 5; a editora com R$ 20, e a livraria com R$ 25. Cerca de 15% do valor total (R$ 7,50) são recolhidos em forma de impostos ao longo da cadeia de produção e venda.
E-books
Apesar de autores, editores, distribuidoras e livrarias receberem percentuais semelhantes aos dos livros físicos, os eletrônicos são 30% mais baratos, em média, do que seus equivalentes físicos, já que não têm custos de papel e impressão. Mas a venda de e-books ainda é pouco expressiva no país - em algumas editoras, representa menos de 3%.