A dona de casa Nara Regina Dias da Silva Aresi, 55 anos, experimentou pela primeira vez, na tarde desta quinta-feira, a sensação de circular na 63º Feira do Livro de Porto Alegre como leitora. Foi a sua estreia na Praça da Alfândega e também está sendo seu primeiro contato com os protagonistas do evento: os livros. Aluna da turma de alfabetização para jovens e adultos do Centro de Integração Empresa Escola do Rio Grande do Sul (CIEE-RS) há dois meses, ela já junta sílabas e lê algumas palavras. Está no começo de um processo pelo qual não imaginava passar novamente.
A visita à feira ocorreu junto a um grupo de 25 alunos de turmas de alfabetização do CIEE de Porto Alegre, Cachoeirinha e Esteio, em uma tarde de contação de história e passeio entre as bancas de livreiros. Moradora de Esteio, Nara não teve a oportunidade de estudar na infância pois precisava trabalhar na roça para ajudar a família. Ao casar, contava com a habilidade do marido, que lia cartas, livros e até o resumo das novelas no jornal.
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Pequenas vitórias
Com a morte do companheiro, há um ano e nove meses, Nara perdeu seus referenciais. Para não depender das suas duas filhas e também incentivada por elas, retornou à sala de aula. Mas não foi fácil:
— No começo, tive vergonha e vontade de desistir, agora, junto letras e leio algumas palavras. Já é uma grande conquista para mim.
Enquanto percorria as bancas da feira, ao lado dos colegas, Nara demonstrava pouca intimidade, e até um certo receio, em folhear livros e espiar os títulos, mas não escondia o contentamento de estar ali. Nem deixava de observar um cenário de novidades à sua frente:
— Meu sonho é pegar um jornal e ler do começo ao fim. Quero poder ler qualquer coisa.
Sempre é tempo de começar
Jurema Lucia Machado, 82 anos, moradora da Capital, voltou a estudar há três anos — entre idas e vindas na turma de alfabetização do CIEE— e hoje, garante, lê de tudo:
— Leio perfeitamente, até receita de médico. É um orgulho, é outra vida.
A habilidade a faz retomar o hábito de frequentar a Feira do Livro, além de lher dar novos amigos e momentos de confraternização como o da tarde desta quinta-feira. A confiança de Jurema também inspira outros colegas, mais tímidos, que estão começando a aprender.
— É uma vitória aprender a ler, adoro ler como passatempo, jornal, revista, livro, tudo — comemora a idosa.
Desafio: vencer a vergonha e o medo
A vergonha e o medo de errar são obstáculos que acompanham adultos em alfabetização. A educadora Jarina de Menezes afirma que o desafio é oferecer um ambiente de confiança para cada novo aluno que chega — como as turmas são multiseriadas, recebem alunos em diferentes níveis e durante todo ano.
— Queremos que eles usem o erro como estímulo para acertar, com toda turma incentivando junto. Quando um consegue ler, todos comemoram — explica ela.
Independência
A maioria dos alunos procuram as aulas motivados por mais independência em gestos singelos como comprar coisas diferentes no supermercado e pegar o ônibus. Dona Nara, que conta com a gentileza da vizinha para ler suas correspondência, não vê a hora de dispensar a ajuda da amiga.
— Quero conseguir ler sozinha, sem ninguém ajudar — projeta Nara.
Aula de alfabetização de jovens e adultos
– Onde: CIEE da Borges (Av. Borges de Medeiros, 328, 8º andar, sala 82)
– Horário de atendimento: das 8h às 18h
– Telefone: 32847099
– Para inscrição: documento de identificação
–Duração: período de aprendizado dura em média de seis a oito meses e há inclusão de novos alunos diariamente
– Há turmas em Porto Alegre, Cachoeirinha e Esteio