É mostrando imagens de filmes e cartazes – um deles é A mulher de vermelho, com Barbara Stanwyck – que Woody Allen informa que seu Café society se passa em 1935, apogeu dos anos dourados de Hollywood. E é nesse território, onde luzes e sombras pontuam trajetórias de sonhos e desilusões, que desembarca Bobby Dorfman, o recorrente alter ego do diretor, agora encarnado por Jesse Eisenberg. Bobby é um rapaz judeu que acaba de deixar Nova York para tentar seguir os passos do tio, Phil Stern (Steve Carell), que fez fama e fortuna agenciando divindades como Ginger Rogers, Joan Crawford e Hedy Lamarr.
O próprio Allen, 80 anos, é o narrador onipresente – e reiterativo – da jornada de Bobby, e nela o cineasta espelha temas que lhe são caros: o romance titubeante que enreda o introvertido protagonista, a celebração ao jazz e ao cinema, o humor judaico e o olhar mordaz sobre o fútil e autofágico universo das celebridades que Hollywood tão bem representa.
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Allen costuma entregar o que se espera dele. Às vezes faz isso surpreendendo com um passo mais ousado, em outras joga para a torcida e por vezes entra em campo apenas para cumprir o regulamento. Esse é o risco assumido por quem faz um filme por ano num ritmo de produção febril: imprimir sua marca alternando a afiada inspiração com investidas protocolares e cumpridoras, caso de Café society, o 17° longa de Allen desde o ano 2000, período mais irregular de sua carreira
Café society tem como eixo narrativo uma reviravolta na vida de Bobby. A sacudida tem como gatilho seu conturbado namoro com Veronica (Kristen Stewart), a Vonnie, como prefere a secretária e amante de Phil . Diante do impasse imposto pelo inusitado triângulo romântico, Bobby volta para seu porto seguro em Nova York. Tenta se recompor junto da família, dos clubes de jazz, dos recantos que se transformam ao longo do dia, conforme bate a luz do sol, do novo amor que lhe conforta, simbolicamente uma outra Veronica (Blake Lively). Bobby é Woody Allen renovando sua paixão pela cidade depois de algumas andanças filmando fora de casa.
Em sua aparência de crônica de costumes de uma época – seu título refere-se ao jet set que se reunia em bares e restaurantes de Nova York, Paris e Londres no começo do século 20 –, Café society tem o interessante descompasso que conduz o relacionamento de Bobby e Vonnie diluído na proposta de painel histórico genérico que Allen faz tanto da velha e glamourosa Hollywood quanto do engravatado submundo do crime em Nova York – este representado por Ben (Corey Stoll),o irmão gângster de Bobby. Registros breves da rotina frenética e frívola dos famosos de Los Angeles e do modus operandi do mafioso do Bronx para eliminar inimigos e abrir seu night club não avançam além da caricatura.
Funciona com bem mais fluidez no roteiro o humor judaico autodepreciativo representado pela zelosa e exaltada mãe de Bobby, papel da ótima atriz Jeannie Berlin. Mas a personagem entra em cena aos solavancos, pontuando com momentos de graça e harmonia o ritmo imposto pelo conjunto desafinado.