*O repórter viajou a convite da organização dos Premios Platino del Cine Iberoamericano
As ruas de Punta del Este nem de perto lembram o movimento do verão, mas a cidade da costa uruguaia está mobilizada: neste domingo, receberá a 3ª edição dos Premios Platino, o "Oscar ibero-americano". Realizada pela primeira vez na América do Sul (em 2014 foi no Panamá e em 2015, na Espanha), a cerimônia de gala terá como astro principal Ricardo Darín, grande homenageado desta edição.
Usualmente arredio a entrevistas, o ator argentino que receberá o Platino de Honor ("Platino de Honra") falou diante de cerca de 300 jornalistas de toda América e Europa neste sábado – assim como os principais indicados aos troféus, entre os quais o colombiano Ciro Guerra (diretor de O abraço da serpente), o espanhol Javier Cámara (ator de Truman) e a argentina Dolores Fonzi (atriz de Paulina).
Darín era só sorrisos. Demonstrou humildade e engajamento naquela que é a grande causa dos Premios Platino: unir o cinema ibero-americano, dotando-o da pompa e do glamour que costumam acompanhar a produção hegemônica dos EUA e, assim, ocupar mais espaços na preferência do público da América Latina, da Espanha e de Portugal.
– Não vou fazer mais do que agradecer – disse, de cara. – Estão me dando um lugar de muito privilégio, não posso crer que eu mereça tudo isso.
Darín fez brincadeiras com diversas intervenções de jornalistas, sem jamais deixar de responder às perguntas. Disse estar emocionado pela mensagem recebida de dois jovens atores na noite anterior ("É a maior honra ser abraçado com histórias pessoais que pude inspirar"), mostrou-se motivado a voltar a dirigir um filme, nove anos depois de assinar o suspense O sinal ("Quero muito fazer isso, basta encontrar um projeto que me motive") e foi incisivo mesmo quando não conseguiu ser lá muito preciso:
– Por que há pouco intercâmbio entre as cinematografias filmes latino-americanas? Não sei. Sinceramente, não tenho essa resposta. Mas essa pergunta deve ser feita por todos nós, artistas e também espectadores: até que ponto nos interessam os efeitos especiais e até que ponto queremos ir ao cinema para ver histórias realmente humanas, de gente como nós, de carne e osso?
Além de ser homenageado com o Platino de Honor, o argentino concorre na categoria melhor ator, por Truman. Seu colega de elenco na produção hispano-argentina dirigida por Cesc Gay, Javier Cámara, também está indicado.
– Não há como competir com Darín – disse Cámara a ZH, questionado sobre a "corrida" pelo troféu. – Há somente que desfrutar da parceria com ele. Darín é a melhor pessoa para, digamos, jogar uma partida de tênis artística: você dá algo e ele te devolve com, no mínimo, a mesma intensidade. Sempre.
Ricardo Darín foi perguntado sobre a existência de um "método Darín" de interpretação, expressão já utilizada por críticos e diretores anteriormente. Esquivou-se elegantemente da resposta, mas Javier Cámara, de novo o ator espanhol conhecido pelos filmes de Pedro Almodóvar, o entregou.
– Darín é uma pessoa muito aberta a emoções – definiu Cámara. – Envolve-se muito com o que faz. Rimos muito e igualmente choramos muito no tempo em que convivemos. Ele quer ouvir o outro, saber o que o outro tem a dizer. Em Truman me parece claro que isso passou para o filme. Houve momentos em que eu estava preocupado com alguma coerência do meu personagem. Darín me disse: "Não pense nisso. Esquece. Quando terminar, você vai ver que era só uma coisa da sua cabeça, que não passaria objetivamente para a tela". Ele estava certo. Percebeu que, mais importante para mim, naquele momento, era relaxar.
Truman divide as principais indicações com o longa chileno O clube, de Pablo Larraín, o argentino O clã, de Pablo Trapero, o colombiano O abraço da serpente, de Ciro Guerra (que também foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro) e a surpresa da temporada, a produção guatemalteca Ixcanul, de Jayro Bustamante, o único indicado a melhor filme na 3ª edição dos Premios Platino que ainda não estreou comercialmente no Brasil.
O Brasil, por sinal, ficou de fora das indicações, mesmo que tenha produzido ótimos títulos no ano passado, a exemplo de Que horas ela volta?, de Anna Muylaert, um dos quase 800 longas submetidos ao exame da comissão de seleção formada por pouco mais de 60 personalidades (duas delas brasileiras).
– Nossa ideia é ampliar cada vez mais esse universo de votantes, absorvendo nele todos os artistas que forem indicados aos Premios Platino até que, em uma ou duas décadas, tenhamos centenas, quem sabe milhares de pessoas formando uma grande Academia Ibero-americana – afirmou Miguel Ángel Medina, diretor-geral da premiação, organizada pela Entidade de Gestão de Direitos dos Produtores Audiovisuais (Egeda) e pela Federação Ibero-americana de Produtores Cinematográficos e Audiovisuais (Fipca).
A cerimônia de entrega dos prêmios será transmitida para cerca de 50 países, segundo estimativas da organização, atingindo até 600 milhões de pessoas. O Canal Brasil detém os direitos para a exibição no Brasil, a partir das 22h deste domingo. A cerimônia será realizada no novíssimo Centro de Convenções de Punta de Este, empreendimento que começou a ser erguido em 2014 e que consumiu quase US$ 30 milhões.
Leia também
"Chocolate": filme francês fala sobre a luta de um ex-escravo
Diretora de "Que horas ela volta?", Anna Muylaert lança novo filme
"Sessão Plataforma": projeto volta à ativa na Sala P.F. Gastal
PRINCIPAIS INDICADOS
Melhor filme ficcional
O abraço da serpente, de Ciro Guerra (Colômbia/Venezuela/Argentina)
O clã, de Pablo Trapero (Argentina/Espanha)
O clube, de Pablo Larraín (Chile)
Ixcanul, de Jayro Bustamante (Guatemala)
Truman, de Cesc Gay (Espanha/Argentina)
Melhor direção
Alonzo Ruizpalacios, por Güeros (México)
Cesc Gay
Ciro Guerra
Pablo Larraín
Pablo Trapero
Melhor ator
Alfredo Castro, por O clube
Damián Alcázar, por Magallanes (de Salvador del Solar, Peru/Argentina/Espanha)
Guillermo Francella, por O clã
Javier Cámara, por Truman
Ricardo Darín, por Truman
Melhor atriz
Antonia Zegers, por O clube
Dolores Fonzi, por Paulina (de Santiago Mitre, Argentina/Brasil/França)
Elena Anaya, por La memoria del agua (de Matías Bize, Chile/Argentina/Alemanha/Espanha)
Inma Cuesta, por La novia (de Paula Ortiz, Espanha)
Penélope Cruz, por Ma ma (de Julio Medem, Espanha)
Melhor roteiro
Truman
O abraço da serpente
Ixcanul
O clube
Magallanes