Na onda de remakes e reboots que vem garantindo o tilintar da caixa registradora em Hollywood na última década e meia, a nova versão de Caça-Fantasmas rendeu uma polêmica extra. Além das tradicionais acusações de oportunismo, preguiça e destruição de memória afetiva, levantou-se o debate sobre a troca de gêneros dos protagonistas. Afinal de contas, seriam mulheres capazes de caçar fantasmas utilizando equipamentos científicos bizarros enquanto trocam piadinhas entre si?
A resposta do diretor Paul Feig é sim, elas são. A exemplo do que J.J. Abrams fez com Star Wars em O despertar da força, Feig utiliza o molde dos filmes originais para atualizar a franquia para as novas gerações. Da mesma forma que no clássico de 1984, estão lá quatro fracassos ambulantes com habilidades e personalidades bem distintas decididos a provar a existência de atividade paranormal em Nova York enquanto enfrentam o descrédito do público – o mesmo público que, quando um monstro gigante começa a destruir a cidade, já sabe a quem chamar.
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Ou seja, quem estava esperando (ou com medo de) um filme com discurso feminista, ou coisa que o valha, vai se decepcionar – ou adorar e sair satisfeito da sala de cinema. Porque o grande mérito de Feig em Caça-Fantasmas é justamente mostrar que – pasmem vocês – alterar o sexo de personagens conhecidos do público não muda em nada a razão de eles existirem, o que fazem e como fazem. Saem Bill Murray, Dan Aykroyd, Harold Ramis e Ernie Hudson e entram Kristen Wiig, Melissa McCarthy, Kate McKinnon e Leslie Jones para fazer exatamente a mesma coisa – só que com mais ação e menos romance.
O roteiro, escrito por Feig e Katie Dippold, atualiza apenas o vilão: em vez de uma entidade fantasmagórica qualquer, o grande problema é justamente outro fracasso ambulante, Rowan North (interpretado por Neil Casey). Cansado de uma vida de humilhações, ele decide dar o troco evocando o além contra seus detratores – no caso, a humanidade inteira. É outra bola dentro, porque humaniza, dá rosto e motivações reais a uma ameaça que – o diretor dá a entender – poderia ter sido evitada se tivéssemos mais simpatia pelo outro.
A bola fora fica por conta do personagem de Chris Hemsworth. O substituto de Annie Potts na recepção dos Caça-Fantasmas deveria encarnar o estereótipo da beldade sem cérebro que serve apenas para o deleite dos olhos – papel tradicionalmente relegado a mulheres –, mas o faz com exagero. Diferente da Janine de 1984, o Kevin de 2016 não é atrapalhado e bobo, é somente estúpido, do tipo que não consegue atender um telefone. Mas, em tempos de ajustes como este, Caça-Fantasmas mais acerta do que erra.