Sérgio da Costa Franco é, em síntese, um historiador, pesquisador, cronista, um agradável causeur, como dizem os franceses. Nunca foi carteiro, mas conhece como ninguém as ruas de Porto Alegre. Não é um conhecedor in loco de cada uma das vias da urbi, e sim um especialista de sua história, da origem de cada nome, fruto de exaustivos manuseios de antigos documentos, de cartas e mapas amarelecidos e amarfanhados, em arquivos oficiais e particulares.
Aos 90 anos, Costa Franco ainda costuma, na busca de novos e velhos endereços, vasculhar sua rica biblioteca, no bairro Menino Deus. É autor, entre outras obras, do clássico Porto Alegre – Guia Histórico (foto), que vem sendo reeditado desde 1988. Da conversa de uma hora com o historiador, extraí algumas curiosidades sobre ruas e praças da capital gaúcha, que repasso ao leitores deste Almanaque.
O tricampeão – O general Manuel Luís Osório, patrono da Cavalaria, é três vezes homenageado, dando nome à Praça General Osório (Centro Histórico) e à Rua Visconde do Herval (Menino Deus/Azenha) e Rua Marquês do Herval (Moinhos de Vento), referentes à mesma pessoa com títulos de nobreza diferentes. Outro tricampeão é o ex-prefeito Otávio Rocha, com uma avenida, uma praça e um viaduto com o seu nome.
Homenageada inexistente – Na parte alta do bairro Menino Deus, há, desde 1896, três ruas com nomes de mulheres: Gabriela, Ondina e Augusta (mais tarde, receberam a designação de Dona). Acontece que Costa Franco, depois de tê-las relacionado no seu Guia, foi alertado, em 1995, pelo advogado João Carlos Silveiro, neto de Augusto Silveiro (irmão das duas primeiras), que a tal de Augusta nunca existiu. O homenageado deveria ser o próprio Augusto, mas, devido a um erro, o nome saiu no feminino.
Ilustres desconhecidos – No início de suas pesquisas, o historiador não conseguiu descobrir a razão dos nomes de três ruas no bairro São João: Pereira Franco, Souza Reis e Vilela Tavares. Só mais tarde veio a saber que tinham relação com o naufrágio, em 1887, na barra de Rio Grande, do vapor Rio Apa, quando morreram mais de 80 pessoas. Os homenageados eram o comandante do navio, o imediato e o passageiro mais importante.
Veador, o que é isso? – No bairro Santana, há a Rua Veador Porto (muita gente confunde com vereador), em homenagem a José Ferreira Porto, falecido em 1881, ligado à Casa Imperial de Dom Pedro II. Veador vem do latim venator e significa caçador ou monteiro. Era um título honorífico, destinado aos amigos da monarquia. Em Portugal, houve o cargo de monteiro-mor, espécie de superintendente das caçadas reais.
Auto-homenagens – No tempo do Império, era comum que vereadores e outras autoridades se prestassem recíprocas homenagens como patronos de logradouros públicos. Um exemplo disso foi o intendente João Sertório, que batizou uma rua com o seu nome, memória perpetuada até hoje na importante Avenida Sertório, na zona norte da Capital.
Um enigma persistente – Para os mais antigos, falar em Rua de Bragança não causa estranheza, mas este nome já foi substituído pelo atual Marechal Floriano Peixoto desde 1892, bem no centro de Porto Alegre. No entanto, até hoje, apesar de várias hipóteses dos historiadores, não se descobriu a verdadeira origem da primitiva designação. O próprio Costa Franco, em artigo publicado em 1985, deixou este aviso: "Fica aberto aos descobridores de antiguidades locais apurar qual Bragança da infância da povoação teria gerado topônimo tão resistente".
As donas das ruas – Porto Alegre possui nada menos do que 50 ruas com nomes femininos, todos antecedidos do respeitoso Dona. Começa com Dona Adda Mascarenhas Moraes (Jardim Itu Sabará) e termina com Dona Zulmira (Cavalhada).