Por Clay Risen
O melhor bar de rum em Cuba talvez seja o que fica no porão de um pequeno museu no centro de Santiago, cidade colonial portuária a 11 horas de carro de Havana, na costa sudoeste da ilha. O bar, chamado El Traguito, ocupa um espaço que se abre para uma rua lateral tranquila, no andar de baixo do Museu do Rum. Não se parece muito com os amplos palácios de rum de Havana, como o El Floridita, com seus drinques feitos em linha de montagem, suas multidões de turistas e sua estátua de Ernest Hemingway, que o tornou famoso, debruçada sobre o bar.
O que o El Traguito tem é Eduardo Corona, seu “cantinero” ou o chefe dos barmen. Careca, compacto, animado e usando óculos escuros mesmo no interior escuro e frio do bar, Corona é um mestre artesão, cujo jeito agitado se contrapõe à precisão lenta com que faz suas bebidas. Ele também é um defensor feroz do legado subvalorizado de Santiago de Cuba como o berço não apenas do rum cubano, mas de seu uso mais popular por aqui, o daiquiri.
A cultura do rum de Santiago, segundo Corona, tem tanto a ver com o ritmo calmo da vida e com a costa caribenha do país quanto com a história e o caráter do próprio drinque.
– O El Floridita prepara suas bebidas muito rapidamente – ele me contou.
Para deixar claro, passou os 10 minutos seguintes fazendo um mojito, processo que começa com um bastão mergulhado no rum de Santiago de Cuba, no qual ele coloca fogo; depois, pega a fumaça em um copinho de vidro e monta a bebida. É refrescante, não muito doce e deliciosa.
As pessoas têm feito rum no Caribe há séculos, desde que os colonos espanhóis importaram as usinas de cana-de-açúcar no começo do século 16. Mas foi apenas na metade do século 19 que o destilador de Santiago Facundo Bacardi aperfeiçoou o que é hoje visto como o estilo cubano: refinado, até mesmo delicado, sem nenhum dos sabores pesados e desagradáveis de seus predecessores.
Hoje, o rum é feito em grandes destilarias estatais espalhadas por Cuba – entre elas, a marca principal do país, Havana Club, produzida em Santa Cruz del Norte, cerca de uma hora a leste de Havana. Os barmen de Santiago, porém, ainda preferem as marcas produzidas pela destilaria original da Bacardi, no extremo norte da cidade. Entre elas estão a El Caney e a Santiago de Cuba, valorizadas por seus sabores ricos e complexos e difíceis de serem encontradas fora da ilha.
A destilaria Bacardi não aceita visitas – apesar de ter uma conhecida sala de degustação e uma loja – e se mantém em silêncio sobre os métodos de produção ou o processo de envelhecimento. A destilaria, porém, não tem relação com a companhia moderna também chamada Bacardi, que possui sede nas Bermudas e faz a sua própria versão do Havana Club em Porto Rico para vender nos Estados Unidos.
Segundo Corona e outros, um dos segredos da alta qualidade do rum das destilarias de Santiago é sua enorme quantidade de barris de envelhecimento antigos.
– Alguns deles têm 40, 50 e mesmo 60 anos – conta ele.
Os misturadores usam o líquido desses barris para adicionar profundidade e caráter a runs muito mais jovens.
– Mesmo os melhores runs Havana Club usam parte do estoque antigo de Santiago, que os deixam mais redondos. O rum de Santiago é muito bom – afirma Julio Cabrera, barman nascido em Cuba que trabalha no Regent Cocktail Cuba, em Miami Beach, na Flórida.
Fui para Cuba a partir de Fort Lauderdale, na Flórida, para fazer pesquisa para um livro sobre os Rough Riders, regimento de cavalaria liderado por Theodore Roosevelt que ajudou a tomar esta cidade durante a Guerra Hispano-Americana em 1898. Sabia que Santiago tinha uma longa tradição de produção de rum, mas descobri que a história da guerra e a do rum cubano têm ligações mais profundas do que pensei.
A leste de Santiago está uma praia chamada Daiquiri, que foi usada por empresas de mineração como porto para carregar minérios em navios. Ela serviu como o primeiro lugar de parada para a invasão norte-americana. Segundo o folclore local, na época da guerra, um mineiro norte-americano teve a ideia de pegar um drinque local feito com frutas cítricas, rum e açúcar e colocar gelo. Outra versão da história atribui a bebida a um soldado norte-americano. Foi uma inovação simples, mas o coquetel refrescante se tornou um sucesso imediato na ilha e rapidamente viajou para o norte, levando o nome da praia.
Hoje, a maioria das pessoas pensa nos daiquiris como uma mistura muito doce e, em geral, carregada de frutas. Não em Santiago. Aqui, os barmen fazem daiquiris batidos com gelo, não no liquidificador, e com um equilíbrio preciso de açúcar e sabor cítrico que se aproxima mais da essência do coquetel.
Uma sexta-feira à noite, pedi um daiquiri no bar no topo do Hotel Casa Granda, que abriu em 1914, com vista para a praça central de Santiago, o Parque Cespedes. Apesar de ter apenas cinco andares, o hotel, que foi o favorito do escritor Graham Greene, é alto o suficiente para oferecer uma vista deslumbrante da cidade, com o porto e as montanhas da Sierra Maestra um pouco além.
A bebida era refrescante assim como a paisagem. Ao contrário de Havana, Santiago é isolada o suficiente para permanecer bastante intocada pelos turistas, e as multidões no bar e nas ruas pareciam ser principalmente de locais. Tive a impressão de que todo mundo estava bebendo mojitos e daiquiris, revelando um segredo nada secreto da cidade – um que, naquele momento, eu pude compartilhar.