Amor, paciência e gratidão são coisas que os dois já têm de sobra. Dentro do anel de compromisso prata que colocou no dedo de Mariane, Lucas gravou votos bem menos comuns: "Que nunca nos falte ar".
Mariane Bezerra da Silva e Lucas de Souza Alves, ambos de 25 anos, explicam que a frase é como um lema entre gente que usa oxigênio, condição que tinham em comum até poucos meses atrás e, de certo modo, serviu de cupido para eles. O diagnóstico dela era de bronquiectasia, que leva à dilatação dos brônquios, e dele, de uma doença genética chamada fibrose cística. Ambos precisavam de um novo pulmão e apareceram na vida um do outro no momento certo, segundo Mariane.
Eles se conheceram em um grupo sobre transplantes no Facebook. Lucas lembra a data exata em que começaram a conversar: 26 de fevereiro de 2013. Foi em um post sobre exame de cateterismo. A jovem perguntou como era o procedimento, e todos no fórum trataram de dizer coisas lindas e positivas. Menos Lucas.
— Eu disse que é horrível, que doeu, que o pós-operatório era ruim. Ela gostou da minha sinceridade. Passamos a nos falar e começamos a gostar um do outro — relembra Lucas.
Meses se passaram, e o casal conversava pelo Facebook, Skype e WhatsApp todos os dias — ela morava em Toritama, interior de Pernambuco, e ele, em Florianópolis, capital catarinense. Entravam madrugadas falando sobre o que aconteceu no dia, sobre futuro e, claro, sobre a doença. Em agosto de 2014, Lucas foi para o Nordeste conhecê-la pessoalmente e se apresentar para sua família. Foi desobedecendo o médico.
— Ele disse que "de jeito nenhum". Mas eu fui mesmo assim. Com uma mochila de oxigênio que durava duas horas em uma viagem de seis. Quando voltei, fiquei mais de um mês internado — conta Lucas, sem demonstrar nenhum arrependimento:
— Fui contra a medicina, fiz o impossível!
Ainda assim, não teve jeito de conquistar os sogros: os pais de Mariane foram contra o relacionamento e não permitiram nem que ela devolvesse a visita ao catarinense. Lucas estava tão disposto a dar o apoio no tratamento que, na sua opinião, ela não tinha em casa, que o casal bolou um plano de fuga. Um primo do catarinense foi a Pernambuco para ajudar Mariane na viagem, e ela saiu de casa de madrugada, quando todos os parentes estavam dormindo. Deixou uma carta de despedida autenticada em cartório, para ninguém achar que foi raptada. Apesar de a mala de oxigênio que o jovem mandou para Mariane ter sido extraviada no voo de ida, deu tudo certo.
— Quando eu vi ela no aeroporto, foi uma coisa inexplicável. Não dava para acreditar. Quem diria que isso aconteceria?
O casal se mudou em fevereiro de 2018, junto com a mãe de Lucas, para Porto Alegre, na expectativa de conseguir os transplantes. Mariane, que se sentia insegura e não queria fazer a cirurgia, foi convencida pelo namorado e ganhou um novo pulmão em janeiro deste ano.
— Antes, eu ficava muito cansada. Às vezes, não conseguia dar dois passos, cansava para comer, para falar — rememora Mariane, enquanto caminhava a 4,9 km/h em uma esteira da sala de reabilitação do Pavilhão Pereira Filho, na Santa Casa:
— Se não fosse por ele, eu nem teria feito o transplante.
Um completa o outro
Esperando pela namorada no corredor, Lucas destaca o "jeito que ela o completa". Ele é muito tranquilo, ela é mais durona. Ele é mais sonhador, ela mais realista. Juntos, chegam ao equilíbrio ideal, diz Lucas.
Com um jeito palhaço, fazendo piada até das adversidades da doença, o jovem faz Mariane rir também. E ela é sempre sincera com o namorado, qualidade que ele preza demais. A batalha que encaram juntos hoje é fazer Lucas ganhar alguns quilos para estar apto a se candidatar ao transplante de pulmão — há 11 anos, ele tenta chegar aos 45kg.
Lucas adoraria levar Mariane para jantar fora — ele se diz um "romântico das antigas". Mas, em razão da cadeira de rodas e da necessidade de usar o oxigênio, eles pretendem celebrar o Dia dos Namorados em casa. Mariane gaba-se de ser uma boa cozinheira — enquanto acusa o namorado de ser "um desastre" ao fogão — e sorri ao lembrar que seu macarrão ao forno é a comida favorita dele. Para a jovem, não é a pompa do programa que vai fazer a data mais ou menos especial.
— Ele sempre esteve comigo, sempre me deu força e coragem pra lutar, ele me encorajou. O que importa é que o relacionamento esteja bem.