As duas moças estão sentadas em uma mesa de madeira rústica e, mesmo em plena luz do dia, acedem uma lamparina, pois é assim que elas podem chamar o garçom no primeira cafeteria para surdos na Colômbia.
Erin Priscila Pinto e Carol Aguilera são amigas de longa data, e há pouco tempo têm à disposição um lugar público em Bogotá adequado às suas necessidades: Sin Palabras Café Sordo.
Situado no tradicional bairro de Chapinero, este lugar coexiste com bares LGBT, de heavy metal ou reggae.
– É o primeiro bar na Colômbia e em Bogotá que é comunicacional, visual e sensorialmente adequado para esse público – diz à AFP María Fernanda Vanegas, uma das três proprietárias.
Este bar-café busca "que nós que podemos ouvir nos adaptemos aos surdos e não o contrário, que é o que sempre acontece", acrescenta.
Sin Palabras conta com telas exibindo vídeos musicais que têm tradução simultânea em linguagem de sinais e uma plataforma de madeira no chão que transmite a vibração da música.
Além disso, o cardápio está escrito no alfabeto para surdos, e há jogos de mesa como "Jenga" e dominó.
Vanegas e seus sócios, Cristian Melo e Jessica Mojica, nenhum deles com deficiência auditiva, esperam que o Sin Palabras seja frequentado pela maioria dos 54.092 surdos que vivem em Bogotá, segundo o Instituto Nacional para Surdos.
– O desafio aqui não é parar de falar, porque surdo e mudo não são a mesma coisa – assegura.
"Posso dançar"
Os clientes se dividem quase por igual entre surdos e pessoas que podem ouvir. A música está no mesmo volume que em um bar convencional; a diferença é que, aqui, as mãos são as protagonistas.
– É a primeira vez que posso sentir a música, gosto muito disso porque é a primeira vez que posso dançar – explica Pinto, de 23 anos e estudante de fotografia audiovisual, em linguagem de sinais.
Os seis garçons do Sin Palabras também não escutam. Embora boa parte da sua clientela desconheça a linguagem de sinais, conseguem se comunicar e responder os pedidos dos clientes com gestos ou escrevendo. Além disso, há cartilhas com os sinais básicos da linguagem colombiana de sinais.
– Me sinto muito melhor porque os que me atendem são surdos, tudo é mais fácil – ressalta Pinto.
– A comunicação com os que ouvem no início costuma chocar, porque não nos entendemos, mas você faz com que flua – diz Juan Carlos Villamil, um garçom de 26 anos.
– Os clientes costumam se surpreender, mas no fim das contas acabam se familiarizando com a linguagem de sinais – acrescenta.
Clientes "odiosos"
Vanegas e seus sócios uma vez se perguntaram como era a vida social dos surdos ao verem um grupo de deficientes auditivos tomando um café em Bogotá. Daí surgiu a ideia que agora pretendem expandir dentro e fora da Colômbia.
Inaugurado em 16 de junho, o lugar está se posicionando aos sábados como um ponto de arte e cultura da população surda.
Mas nem tudo tem sido cor de rosa no Sin Palabras. Alguns clientes "odiosos" se aproveitam da surdez dos empregados para sair sem pagar ou quebrar copos, lamenta Vanegas.
Nas sextas-feiras, há apresentações de dançarinos com deficiência auditiva, e algumas vezes há contadores de histórias surdos.
– Queremos mostrar ao mundo como os surdos são talentosos – afirma Vanegas, enquanto ao fundo Erin Priscila mostra à sua mãe, através da câmera do seu celular, o lugar em Bogotá onde se escuta com os olhos e se fala com as mãos.