A Câmara Municipal de Porto Alegre realiza nesta quinta-feira audiência pública para discutir um projeto de lei que obrigaria todas as maternidades, públicas e privadas, a permitir a presença de uma doula antes, durante e depois do parto.
Doulas são pessoas que fazem um curso de capacitação para acompanhar as mulheres durante a gestação e na hora do nascimento. Elas oferecem apoio emocional e físico à família durante o trabalho de parto.
Quem são as doulas?
De autoria da vereadora Jussara Cony, em parceria com a Associação de Doulas do Rio Grande do Sul, a proposta tem como objetivo acabar com a dificuldade encontrada pelas profissionais para acompanhar as gestantes nos hospitais.
- É um projeto que humaniza essas relações e retoma a naturalidade do parto. A doula vem antes e vai além do parto. Ela já é uma pessoa conhecida no momento em que a mulher chega no hospital. Tive cinco filhos e fui doulada pela minha avó e pela minha tia. É um momento sagrado - justifica Jussara.
Partos humanizados ganham incentivo do SUS
A coordenadora geral da associação, Anna Cony, que é filha da vereadora, afirma que, por lei, as gestantes podem ser acompanhadas por apenas uma pessoa durante o parto. Em razão disso, muitas vezes elas se veem obrigadas a optar entre o marido, a mãe ou outro parente próximo e a doula.
- Já tive gestante que me pediu "pelo amor de Deus" para que não me tirassem da sala de pré-parto - conta.
Anna entende que, mesmo com papéis diferentes, tanto o acompanhante quanto a doula têm papel fundamental. Atuando na área há seis anos, Amanda de Mello Martins ressalta a importância da profissional durante o procedmento:
- Evidências científicas indicam que a presença de doulas reduz o índice de cesáreas e o tempo de internação.
Em abril deste ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) chegou a classificar o elevado número de cesáreas no Brasil como uma "epidemia". Dados citados pela entidade dão conta de que, em 2011, 53,7% dos partos no Brasil eram cesáreas. Para a OMS, a taxa ideal é de 10% a 15%.
No hospital ou em casa, mulheres querem evitar frieza e medicamentos
Contrário à proposta, Rogério Wolf de Aguiar, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers), defende que apenas médicos, enfermeiros e um acompanhante estão autorizados a participar do parto.
- Dentro de um hospital existem determinados tipos de regimentos que regulam aquilo que deve acontecer para proteger o parto, a criança e os profissionais. Há médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem e auxiliares, mas doula é uma profissão que não existe. É uma pessoa sem nenhum tipo de treinamento e formação - critica.
Amanda afirma passam por um curso que varia de 32 a 36 horas e preparadas para atuar em apoio à parturiente.
- Aprendemos qual deve ser a nossa postura perante o código de ética da profissão. É uma profissional leiga na área da saúde que está junto para oferecer uma presença de qualidade.
Diferente do Cremers, o Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre ainda não tem uma posição sobre o projeto e cobra esclarecimentos no texto:
- Antes de ser contra ou a favor, é preciso ter o aperfeiçoamento do projeto para deixar claro e definido quais são as responsabilidades das doulas - diz o presidente da entidade, Fernando Torelly.
Ainda que seja o recurso a doulas seja incentivado e apoiado pelo Ministério da Saúde, a prática ainda esbarra nas políticas de cada instituição, como é o caso do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Vinculada ao Ministério da Educação, o regramento de funcionamento da instituição só permite que trabalhem de forma remunerada no local servidores concursados ou professores dos cursos de Medicina ou Enfermagem.
- Não vemos nenhum problema. Se o Estado achar que isso é necessário, ele tem de pagar os honorários da profissional. É a única maneira que eu posso entender, já que a Constituição diz que o atendimento pelo SUS é gratuito e universal - diz Sérgio Martins-Costa, chefe do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Clínicas.
Para ele, o acompanhamento é muito bom, mas não pode ser considerado indispensável do ponto de vista médico:
- É a cereja do bolo - avalia.
Através da sua assessoria de imprensa, o Ministério da Saúde se posiciona de forma favorável ao trabalho das doulas, mas reforça que não as coloca como integrantes das equipes de parto pagas pelo SUS. Quando essas decisões são tomadas no âmbito municipal, a responsabilidade cai sobre o munícipio, inclusive no que tange o pagamento das profissionais.