O desejo de cair em tentação é anunciado no WhatsApp:
- Gurias, tô morrendo de vontade de comer um negrinho.
Em menos de um minuto, colegas do grupo demovem a amiga da ideia.
- Não! Olha o quanto tu avançou nesses últimos dias! - exclama uma.
- Faz esta receita de bolo sem açúcar e sem farinha, que a gula passa - aconselha outra, enviando um print dos ingredientes e do modo de fazer.
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Uma enxurrada de motivação define o coletivo virtual Desafio Beta Vida Saudável, exemplo de que o aplicativo tem ultrapassado a simples função de comunicação entre amigos para unir pessoas (que às vezes nem se conhecem) em torno de um interesse em comum. Nesse caso em particular, o de perder peso.
Tudo começou quando a administradora de empresas Roberta Fonseca, 31 anos, exibia as gordurinhas de seus 91 quilos em um biquíni, durante as férias familiares de julho, na Bahia. O sogro lhe jogou um balde de água fria:
- Tu tens de parar de fumar e emagrecer, que tua saúde não tá legal.
O conselho foi meio bruto, mas precioso: Roberta decidiu mudar de vida. De volta a Pelotas, no sul do Estado, foi a uma nutricionista, seguiu uma reeducação alimentar, passou a se exercitar sete vezes por semana e eliminou 22 quilos em um ano. Registrou tudo nas redes sociais, onde os posts sempre rendiam muitas curtidas e compartilhamentos, mas sobretudo comentários: como ela conseguiu?
- Foi aí que eu resolvi criar um grupo no WhatsApp para reunir a mulherada que também queria perder peso de forma saudável, dividindo experiências - conta.
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Roberta conseguiu monetizar a ideia. Cada participante paga taxa de R$ 100, convertida em prêmios para aquelas que conseguem atingir seus objetivos, além de custear o apoio de uma nutricionista no grupo, para tirar dúvidas. Às segundas-feiras, elas enviam fotos das balanças, para que se registre quem perdeu mais peso.
- Conheço os pés de cada uma, ninguém consegue mentir - brinca.
Não se trata de uma disputa obstinada entre as mulheres, garante a coordenadora. É uma competição saudável, ninguém quer ser melhor do que ninguém, pois cada uma tem sua própria meta. Até porque o time, atualmente com cerca de 35 membros, é bem diverso: as idades, por exemplo, variam entre 18 e 65 anos.
- Todas criaram amizade. Combinamos jantares em restaurantes saudáveis, caminhadas na praia
- enumera Roberta, que, em função do sucesso do projeto-piloto, decidiu se especializar na área e abrir uma academia.
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A estudante de Farmácia Rita Sorondo, 33 anos, já estava cansada do efeito sanfona, causado pela falta de disciplina, pelo desleixo e por alguns remédios emagrecedores que admitiu ter tomado na adolescência. Ela conhecia Roberta por meio de amigas em comum e decidiu inscrever-se no grupo. O WhatsApp virou um aliado.
- Postamos fotos das nossas refeições, desde o café da manhã até o lanche da noite. Quando dá vontade de enfiar o pé na jaca, eu penso: puxa, está todo mundo batalhando
por que eu vou desistir? Se a gente está sozinho, tende a ceder mais fácil - relata ela, que emagreceu mais de 20 quilos com a reeducação alimentar "vigiada" pelas amigas.
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Aliás, está proibido enviar pelo aplicativo fotos de bauru (uma marca registrada da cidade), cerveja ou qualquer alimento gorduroso não recomendado por nutricionistas. Dietas da moda também não têm vez, sob pena de exclusão do grupo.
- Queremos adotar algo para a nossa vida, e não algo momentâneo - diz Rita, satisfeita com o quarto lugar alcançado no último ranking.
Apenas o Facebook é mais "viciante"
Segundo aplicativo mais "viciante" para os jovens internautas brasileiros (só perde para o Facebook, de acordo com o estudo Conecta, do Ibope Inteligência), o WhatsApp tem como trunfo sua agilidade na troca de mensagens instantâneas.
A mesma pesquisa mostrou que, ainda que seja uma ferramenta relativamente recente - foi lançada em 2009, mas só começou a se popularizar em 2012 -, é o terceiro programa mais usado nos dispositivos móveis (79% dos entrevistados), atrás do YouTube (81%) e do Facebook (88%).
- O WhatsApp tem uma cara de torpedo, só que muito mais ágil. É conversa em tempo real, em uma tela que é praticamente um supercomputador pessoal permanente - afirma o doutor em Comunicação Social e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) André Pase, que pesquisa internet e cultura digital.
Agrupar pessoas por áreas de interesse não é exatamente uma novidade (quem não lembra das comunidades do Orkut?).
- Ter algo em comum fortalece os grupos, inclusive quando as pessoas não se conhecem pessoalmente. Como é normal que alguém inclua outro membro no grupo, as redes offline acabam articulando as redes online - aponta a professora Gabriela Zago, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), pesquisadora na área de redes sociais.
Pase faz uma comparação:
- É como se eu estivesse em uma mesa de bar discutindo algum assunto com amigos, quando passa na rua uma pessoa que eu sei que se interessaria por aquela pauta. Aí eu a pinço para dentro do bar, para que participe da conversa e reforce a causa.