Precisamos admitir: nosso Estado está engordando. Um levantamento feito em 2007, com 426 gaúchos, apurou que 63,4% deles estavam acima do peso. Desses, 5% eram obesos mórbidos. O que mostra a balança preocupa especialmente essa minoria.
A obesidade mórbida é uma doença crônica apontada como a segunda causa de morte evitável do mundo (perde só para os acidentes de trânsito) e precisa ser tratada com urgência. O excesso de peso, além de reduzir a qualidade de vida, aumenta o risco de doenças decorrentes do excesso de peso, as chamadas comorbidades. Elas podem resultar em deficiências físicas e até em morte. Normalmente, esses pacientes tentam, por anos, emagrecer por meio de dietas e medicamentos, sem sucesso. Para essas pessoas, é indicada a cirurgia bariátrica, popularmente chamada de redução de estômago.
- Mais de 90% das pessoas nos procuram em função de problemas de saúde. São pacientes com obesidade mórbida e que podem desenvolver hipertensão, hérnias e refluxo. E o que existe não é uma promessa de cura, mas de tratamento e de melhora - explica o cirurgião geral e membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM) Luciano Neto Santos.
Se por um lado o procedimento é vantajoso, deve-se lembrar que essa busca pela saúde traz riscos que não devem ser ignorados. No último dia 12, o professor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Luiz Eugênio Véscio, 46 anos, morreu em decorrência de complicações após uma cirurgia bariátrica.
Os índices de mortalidade não chegam a ser assustadores: são três a cada mil pacientes. Mas a popularização dos procedimentos pode aumentar a estatística. Nos consultórios, médicos têm recusado gordinhos e gordinhas que cansaram das dietas e decidiram ganhar peso para alcançar o Índice de Massa Corpórea (IMC), que permitisse fazer a cirurgia.
- É como querer ficar doente para se curar - critica o cirurgião Carlos Augusto Madalosso, de Passo Fundo.
Essas intenções são detectadas no período de preparação, no qual o candidato à bariátrica deve fazer avaliações psicológica, nutricional, psiquiátrica, cardiológica, entre outras. Só depois, é batido o martelo.
- A pessoa que consome álcool com frequência provavelmente será recusada, porque o álcool inibe o mecanismo hormonal que faz com que a pessoa sinta saciedade - exemplifica Maldalosso.
Como é o procedimento:
Se o candidato é aprovado, pode ser que ele tenha de emagrecer um pouquinho antes de encarar o bisturi. A perda de peso facilitará a cirurgia e a administração de anestésicos, por exemplo. Quem decidirá a melhor técnica de cirurgia é o médico. Mas o paciente não deve se furtar a fazer perguntas para o médico e coletar opiniões. Só deve se entregar ao bisturi se estiver realmente muito seguro. Segundo dados da SBCBM, após a videolaparoscopia (cirurgia feita com ajuda de uma microcâmera, com pequenas incisões no abdome), o risco de complicações pós-operatórios não passa de 5%.
- Quem tem de estar preparado para a cirurgia somos todos nós, médicos e pacientes - diz Neto Santos
Maldalosso complementa:
- Estudo feito nos Estados Unidos com 16 mil obesos mórbidos mostrou redução de mortalidade de 40%. Porque se operaram. Nenhum tratamento com obesos mórbidos é tão eficaz quanto a cirurgia bariátrica.
O veterinário aposentado Amauri Rodrigues da Silva, 64 anos, não sabe se estaria vivo se não fosse o procedimento feito há quatro anos. Ele chegou a pesar 198 quilos. Como consequência, teve artrite e hérnia de disco. Em 2001, enfartou.
- Vi que era preciso fazer algo. Meu cardiologista disse que eu tinha de me recuperar para fazer a redução. Hoje, minha vida é normal - conta, com o orgulho de quem perdeu metade do peso que teve um dia.
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Depois da operação
Após fazer a cirurgia, que dura em média duas horas, as pessoas ficam internadas nos hospitais por um período que varia de dois a cinco dias. Em casa, a ajuda da família para seguir a dieta é imprescindível para obter o resultado desejado: a perda de peso e a volta da qualidade de vida.
Logo após a cirurgia, a maioria das pessoas perde peso rapidamente e mantém essa perda por 18 a 24 meses após o procedimento. Embora a maioria das pessoas readquira 5% a 10% do peso perdido, muitas mantêm a perda de peso a longo prazo em cerca de 45 Kg. Além disso, a cirurgia melhora a maior parte das condições relacionadas à obesidade, como por exemplo o diabetes tipo 2.
Quanto maior a extensão do desvio intestinal, maior será o risco de complicações e deficiências nutricionais. Pessoas com maior alteração no processo normal de digestão irão necessitar de maior monitoramento e uso por toda a vida de alimentos especiais, suplementos e medicações.
Um risco comum das operações restritivas são os vômitos, que são causados quando o estômago, agora menor, é excessivamente preenchido por alimentos mal mastigados. Em menos de 1% de todos os casos, infecção ou morte devido a complicações pode ocorrer.
Além dos riscos da cirurgia restritiva, as operações disabsortivas também podem levar a um grande risco de deficiências nutricionais. Isso ocorre porque o alimento não passará mais pelo duodeno e jejuno (as primeiras partes do intestino), onde a maior parte de ferro e cálcio são absorvidos. Aproximadamente 30% das pessoas que são submetidas à cirurgia para perda de peso desenvolvem deficiências nutricionais como anemia, osteoporose, e doença metabólica óssea. Essas deficiências usualmente podem ser evitadas se as vitaminas e minerais forem ingeridos adequadamente para cada caso.
Dez a 20% das pessoas que se submeteram à cirurgia para perda de peso necessitaram de outras operações para corrigir complicações. Hérnia abdominal tem sido a complicação mais comum que requer cirurgia posterior, mas as técnicas laparoscópicas (em que se realiza pequenos orifícios no abdome e opera-se por meio de vídeo) parecem ter solucionado esse problema. As pessoas com mais de 160 Kg ou que já tenham feito alguma cirurgia abdominal não são boas candidatas para a laparoscopia. Outras complicações incluem náuseas, fraqueza, queda de cabelos, sudorese, debilidade e diarreias após a alimentação, principalmente com a ingestão de açúcares, devido ao rápido trânsito dos alimentos pelo intestino delgado.
Ocorre também um aumento no risco de desenvolver pedras na vesícula devido a perda rápida e substancial de peso. Além disso, para mulheres em idade fértil, a gravidez deve ser evitada até que a perda de peso se torne estável porque a rápida perda de peso e as deficiências nutricionais podem causar danos para o desenvolvimento do feto.
Pessoas com sobrepeso procuram cada vez mais cirurgias bariátricas
Redução de estômago requer cuidados antes e depois do procedimento
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