Pouco antes de a pandemia cancelar todos os planos de curto prazo e nos confinar na cidade em que vivo desde 1978, eu pesquisava passagens aéreas e hotéis em Aruba e Curaçao, sonhando com mar azul de águas mornas para fugir do inverno inclemente do sul da América. Antes que fechasse qualquer reserva, veio a certeza de que as viagens teriam de ser adiadas e, em seguida, o fechamento das fronteiras. O que fazer com os 15 dias de férias guardados para escapar do frio? Reinventar o conceito descanso, que nos últimos anos era conhecer lugares novos ou revisitar cidades especiais, caminhando 15 quilômetros por dia, enchendo a memória de lembranças e o celular de fotos para rever.
Nos últimos anos, só uma vez passei as férias de julho em cidade fria. Foram dias inesquecíveis com minha filha adolescente, em Buenos Aires, mas em todos os outros anos optamos por viajar para o verão. Neste estranho 2020, restou-me viajar pelo labirinto da memória e recordar, com a ajuda de fotos, os dias ensolarados de cidades e praias com temperatura de pelo menos 28°C.
Nas duas semanas em que fiquei em casa, aproveitei para dormir sem preocupação com o despertador, fazer pipoca no meio da tarde, ler e ver todos os episódios da série espanhola O Tempo Entre Costuras, baseado no livro homônimo de Maria Dueñas. Do sofá, viajei por Marrocos, Espanha e Portugal, com trilha sonora de primeira e uma trama de espionagem que se passa no final dos anos 1930 e início dos 40 e que aqui não vou detalhar para não tirar o prazer de quem quiser embarcar nessa aventura. Estive também no Rio de Janeiro da década de 1950 e início da que nasci, viajando pelo enredo de Coisa Mais Linda, série brasileira que reconstitui o início da libertação das mulheres. Recomendo as duas.
Não cheguei a me desligar dos assuntos do dia. Seria impossível. Mas não perdi a esperança de voltar a Cartagena, de assistir ao casamento da filha dos amigos Fernando e Marlene na Grécia, adiado pela pandemia, de visitar os amigos Cyro e Silvia em Granada, de rever Paris e Barcelona, de percorrer o interior da Itália, de tomar banho no mar de sete cores do Caribe. A vida precisa de sonhos. O meu é que venha a vacina e, com ela, a reconquista do direito de viajar outra vez.