Definida pelo ex-ministro Eliseu Padilha como uma "DR" (discussão da relação), a carta do vice-presidente Michel Temer para a presidente Dilma Rousseff tem, sim, tom de rompimento. Está mais para divórcio litigioso do que para uma dessas brigas que terminam com um buquê de flores e um jantar de reconciliação.
Nas linhas e nas entrelinhas, a carta mistura mágoas, rancores, críticas, cobranças e indiretas. Fica evidente que faltou "DR" em cinco anos. Só agora, quando o impeachment está na ordem do dia das discussões políticas, o vice decidiu escancará-las. Com o governo em crise de popularidade, o casamento de conveniências deixou de ser bom para o PMDB.
Tanto quanto o conteúdo da carta, é preciso prestar atenção às circunstâncias e aos recados que Temer está mandando não para Dilma, mas para os peemedebistas que seguem fiéis a ela, à oposição que trabalha pelo impeachment e a todos os engajados no movimento “Fora Dilma”. O vice-presidente abriu a porteira para que os insatisfeitos com o tratamento dispensado pelo PT nesses cinco anos tentem se descolar do governo, como ele está fazendo.
Temer tem razão quando diz que Dilma nunca o valorizou e que no primeiro mandato foi figura decorativa. Os casos que citou na carta são exemplares, mas poderia juntar a eles outros momentos em que ficou marginalizado. Isso não significa comprar a versão de que não tem responsabilidade por nada do que se fez nesses cinco anos. Afinal, o PMDB ocupou ministérios estratégicos, entre os quais o das Minas e Energia, ao qual está vinculada a Petrobras.
Com sua falta de tato, Dilma semeou ventos e está colhendo furacões. O afastamento de Temer e de seu grupo, materializado no pedido de demissão de Padilha e que deve continuar nos próximos dias com a saída de Henrique Eduardo Alves, torna muito difícil a vida de Dilma. A ala oposicionista do PMDB teve a primeira vitória ontem, na votação da comissão que vai avaliar o impeachment.
Com a articulação avariada e sem apoio das ruas, crescem as chances de Dilma ser afastada, mesmo que pairem dúvidas sobre os argumentos jurídicos e que Temer também tenha deixado suas digitais nas pedaladas fiscais. No Congresso, o processo é político.