Pouco a pouco, a insânia do "politicamente correto" travestido de multiculturalismo vai passando verdadeira motoniveladora sobre o que não lhe convém. Em nome de uma falsa reverência a todas as crenças, ele recusa existência pública ao credo cristão. E sufocou, por exemplo, o sentido do Natal. É por obra e efeito de sua produção intelectual e cultural que chegamos a este ponto: o Natal do Menino Jesus se tornou politicamente incorreto.
Acompanhei ao vivo a firme determinação com que essa empreitada foi levada a cabo. Observei o processo iniciar e atingir seu objetivo em cerca de meio século. Gradualmente, certas palavras foram sumindo, certos assuntos se tornando tabus, certos temas saindo das mentes e, com isso, certos fatos debandando do mundo das ideias. Hoje não se fala de Jesus entre pessoas educadas, como observou alguém, exceto se elas estiverem reunidas num salão paroquial. Nessa toada, em 2012, o Conselho da Magistratura do nosso Tribunal de Justiça determinou a retirada de todos os crucifixos porventura existentes nos prédios do Judiciário gaúcho. Os crucifixos seriam politicamente incorretos e ofenderiam elevadíssimos preceitos constitucionais. Na ocasião, escrevi neste espaço apelando para que se preservassem os pregos, como registro, às gerações vindouras, do serviço prestado à humanidade pelo douto Conselho de então (o CNJ, em junho passado, derrubou aquela determinação). Retornaram aos pregos os crucifixos?
Mas é também dos saldos deixados por êxitos e fracassos que avança a militância cristofóbica, forçando toda expressão de religiosidade cristã a um recuo para a vida privada e impondo sua gradual interdição nos espaços públicos. Neles, pode-se exercer quaisquer atividades, do mais vadio vandalismo ao mais aparatoso poder político, pode-se emitir quaisquer opiniões como ateu, materialista, comunista, agnóstico, jurista, filósofo, antropólogo, consumidor, empreendedor, o que for. Pode-se dar palpites a propósito de temas morais e sociais sob qualquer fundamento e, mesmo, sem fundamento algum. Mas não se ouse abrir o bico se algo, naquilo que se diz, puder ser identificado como tendo semelhança ou raiz em algum princípio da moral cristã. Isso seria politicamente incorreto.
Então, o Natal virou símbolo, também, de incorreção política. Papai Noel é politicamente correto. O Menino Jesus, não. E, por isso, sumiu do seu próprio Natal. O trenó (!) é politicamente correto. O presépio, não. A árvore de Natal é politicamente correta. A manjedoura, não. A ceia da noite de 24 de dezembro é politicamente correta. A Sagrada Família, não. E assim chegamos a um feriado cujo motivo não pode ser explicitado, a uma troca de lembrancinhas sem razão que lhe dê causa, oriunda de uma antiga tradição que subsiste apartada de suas raízes. O próprio feriado do dia 25 é apreciado pela folga ao trabalho, mas como celebração de Natal é atroz incorreção política em um Estado laico.
Houve um tempo em que a febricitante atividade comercial natalina suscitava críticas. Também aquilo era politicamente incorreto. O consumo adicional do período estaria revelando "consumismo" nefasto e insensibilidade social. Penso que as cenas e angústias destes tempos de recessão mostram o quanto é socialmente danosa a queda do consumo, numa relação encadeada de causa e efeito com as quedas de produção e do nível de emprego, com o fechamento de indústrias e estabelecimentos comerciais. Como é socialmente benéfica uma economia em atividade, seguindo seu curso normal, gerando produção e consumo, empregos, salários, lucros, investimentos e... tributos!
Vou além, desejando a meus leitores um bom e santo Natal do Menino Jesus. A reiteração através dos séculos da mais bela história de Natal transporta, no tempo, a extraordinária dádiva de Deus à humanidade. Pois que esse esplêndido presente, então, seja acolhido em nossos corações inspirando sentimentos, virtudes e valores que se traduzam em amor e felicidade pessoal e familiar ao longo de 2017.