A recomendação do Ministério Público de limitar até a meia-noite o funcionamento dos bares na Cidade Baixa não é um remédio, é um anabolizante para a baderna na rua. Especialistas ouvidos pela coluna garantem que a restrição provocaria um efeito reverso ao que os moradores almejam.
– Esses jovens, quando saírem dos bares, vão estender sua convivência na via pública. Haverá ainda mais gente na rua – diz a socióloga e antropóloga Sinara Robin, do Núcleo de Humanismo da Unisinos.
Sinara e outros estudiosos sugerem, inclusive, que o horário de funcionamento dos bares seja espichado – hoje, os estabelecimentos precisam encerrar as atividades até as 2h. O raciocínio é lógico: quanto mais houver gente se divertindo em locais fechados, com isolamento acústico, menor serão as aglomerações do lado de fora.
– Se o horário dos bares fosse estendido, é provável que as ações de prevenção, orientação e repressão da EPTC e da Brigada Militar tivessem até mais eficiência nas ruas. Porque, com menos gente circulando do lado de fora, é mais fácil para os órgãos públicos focar em grupos específicos – avalia Adolfo Pizzinato, professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS que pesquisa ocupações urbanas e juventude.
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Conforme o jornalista Paulo César Teixeira, estudioso da vida noturna de Porto Alegre, o poder público deixou a situação degringolar de tal forma – não incentivou a presença frequente da polícia, não multou quem transformava as ruas em baile funk –, que agora o Ministério Público adotou uma "postura esquizofrênica":
– Houve um abandono total, e agora partem para o outro extremo, que é a intervenção total. Por que conseguimos, na Copa do Mundo, criar um ambiente tão agradável para australianos e holandeses, mas não conseguimos criar esse ambiente para nós?
O prefeito Marchezan dificilmente vai ceder à recomendação do MP de limitar até a meia-noite o funcionamento dos bares, mas deve apresentar nas próximas semanas alternativas para minimizar os problemas. Já está em análise na EPTC uma proposta de proibir estacionamento na Rua João Alfredo, epicentro dos conflitos, entre as 21h e as 6h. A medida coibiria a invasão de carros com som alto que atravessam a madrugada tocando funk.
Até o final da semana, o secretário de Desenvolvimento Econômico, Ricardo Gomes, que está deixando o governo, deve apresentar uma sugestão de decreto ao prefeito: a ideia é proibir o funcionamento de bares que não oferecem banheiros nem espaço para o consumo de bebidas no seu interior. Seria o fim dos garajões que funcionam – legalmente, vale lembrar – na Cidade Baixa vendendo cerveja barata através de uma janelinha. Seus clientes consomem na rua e fazem xixi por ali também.
– Tem muita coisa para ser resolvida, mas não se resolve nada com uma medida arrasa-quarteirão – conclui o jornalista Paulo César Teixeira.