O pedido de desculpa do CEO global do Grupo Carrefour, Alexandre Bompard, após na semana passada assumir o compromisso de não vender na França carne oriunda do Mercosul, não deve arrefecer os esforços de autoridades brasileiras e entidades do setor agropecuário de defender a qualidade e a sanidade da proteína animal produzida no país. A declaração irresponsável do executivo, que prejudicou inclusive os negócios da companhia no Brasil, o segundo mercado mais importante para a empresa no mundo, tem como pano de fundo a oposição dos franceses ao acordo comercial Mercosul-União Europeia. O tratado pode ter avanços significativos nos próximos dias, o que gera reações protecionistas em especial na França.
Graças à excelência no campo, na indústria e na defesa sanitária, o país embarca proteína animal para mais de 160 destinos
Bompard usou de desinformação para agradar aos produtores rurais conterrâneos. Disse que o acordo traria o risco de um derrame de carne que não atenderia a exigências e normas locais. Embora tenha referido o Mercosul, foi uma declaração que atingiu em cheio o Brasil, maior exportador mundial de carne bovina e de aves. A condição de liderança não seria alcançada se o produto nacional não tivesse qualidade e sanidade. Graças à excelência no campo, na indústria e nos serviços oficiais de defesa sanitária, o país embarca proteína animal para mais de 160 destinos, inclusive para a União Europeia, embora os volumes direcionados ao bloco e à França sejam ínfimos. Também devido à alta competitividade, a todo momento o Brasil abre novos mercados pelo mundo.
O executivo francês se retratou em uma carta endereçada ao Ministério da Agricultura, conhecida nesta terça-feira, mas suas declarações potencializaram a onda de informações incorretas, gerando danos à imagem do setor no Brasil. Dois dias depois da primeira manifestação de Bompard, na semana passada, outro grande varejista francês, o Les Mousquetaires, disse que faria o mesmo. Um pretexto dos franceses para tentar bloquear o acordo seria o de que o Brasil não teria normas ambientais à altura das regras europeias. O Código Florestal brasileiro, porém, é das legislações ambientais mais exigentes do mundo. Inconformidades existem, mas são pontuais e bem localizadas.
As escusas formais apresentadas ao governo podem encerrar a polêmica com a rede e acabar com o boicote de frigoríficos brasileiros às operações do grupo no Brasil. Mas a campanha de distorções permanece. Nas últimas semanas, a missão diplomática brasileira na União Europeia precisou rebater uma série de pronunciamentos e artigos com informações deturpadas sobre vigilância sanitária, rastreabilidade e uso de hormônios.
Agricultores franceses têm recrudescido protestos contra o acordo entre os blocos, tentando influenciar a opinião pública e os políticos. A questão central é o receio de competir com a produção rural brasileira. O presidente francês, Emmanuel Macron, é outro opositor ferrenho do tratado, que, após 25 anos de evoluções e impasses, passa por novas negociações. Existe a perspectiva de um consenso ser anunciado no encontro de cúpula do Mercosul, em 5 e 6 de dezembro, no Uruguai, que teria a participação da presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen. A necessidade de defesa da reputação brasileira, portanto, permanece.