O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela adiou para 2017 as eleições de governadores, que estavam programadas para o fim de 2016, aumentando a tensão política por um referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro. "As eleições regionais (governadores) ficam marcadas para o final do primeiro semestre de 2017", informou a presidente do CNE, Tibisay Lucena, em mensagem na TV estatal. As eleições de governadores deveriam ocorrer no final do ano, quando chega ao fim o mandato de quatro anos para o qual foram eleitos. Nas eleições passadas, em dezembro de 2012, os chavistas conquistaram 20 dos 23 governos estaduais. Ou sejam prorrogam sua maioria.
Lucena não explicou as razões do adiamento e não mencionou o processo de referendo. Disse apenas que "as eleições municipais estão mantidas para o segundo semestre de 2017", e em março e abril as primárias dos partidos.
O presidente Maduro apoiou a decisão em seu programa de TV na terça-feira, durante o qual mencionou a possibilidade de antecipar as eleições legislativas para recuperar o controle da Assembleia Nacional, que tem maioria opositora. No entanto, não explicou a via legal para chegar a tal cenário.
"Nas eleições regionais eu tenho certeza (...) vamos ter uma participação destacada. Acredito que é o momento em que vamos acertar o alvo. Pode acontecer antes, que as circunstâncias da história nos levem a uma eleição para recuperar a Assembleia Nacional", disse.
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Mais cedo, a coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) denunciou em comunicado que a decisão do CNE de adiar as eleições regionais "se inscreve no perigoso marco de um regime colocado claramente à margem da Constituição". "O CNE pretende ignorar a consulta eleitoral que o povo venezuelano exige com mais urgência e que o regime teme", completa a nota.
A MUD, que triunfou com folga nas legislativas de dezembro do ano passado, acredita que em um referendo também sairia vitoriosa, em consequência da baixa popularidade de Maduro ante a grave crise econômica. A oposição considera que a mesma situação ocorreria nas eleições para governadores.
O chavismo já havia mencionado a possibilidade de adiar as regionais.
Há duas semanas, Maduro disse que organizar eleições não era uma prioridade, e sim "recuperar a economia". O país enfrenta uma crise severa, agravada pela queda dos preços do petróleo, fonte de 96% de suas divisas. Outros líderes governistas haviam afirmado que enquanto prosseguir o processo de referendo revogatório não é possível celebrar eleições.
Para Eugenio Martínez, analista de temas eleitorais, "anunciar de forma abrupta o calendário eleitoral de 2017 poderia ser o prelúdio da suspensão do referendo e evitar que (o gobierno) seja chamado de ditadura".
A MUD pretende recolher, entre quarta-feira e sexta-feira da próxima semana, 4 milhões de assinaturas (20% do padrão eleitoral), exigidas pelo CNE para convocar o referendo. A oposição exige que o revogatório aconteça ainda este ano, porque se Maduro for derrotado o país terá eleições antecipadas - e Maduro poderá escolher o vice que o sucederá, governando nos bastidores do poder. Mas o CNE já antecipou que, caso as assinaturas sejam obtidas, o referendo deve ocorrer em fevereiro ou março de 2017, quando mesmo em caso de derrota Maduro será substituído por seu vice (indicado como qualquer ministro).
O governo já advertiu que tentará impedir o referendo contra Maduro, eleito em abril de 2013 após a morte de seu mentor Hugo Chávez e cujo mandato termina em janeiro de 2019.
- Os chavistas não querem o revogatório. Temos que dificultar no marco da Constituição - disse o número dois do governo, Diosdado Cabello.
A MUD tem vários obstáculos em seu caminho. Na véspera, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), que a oposição acusa de atuar de acordo com o desejo do governo, decidiu que o recolhimento de firmas para o referendo revogatório exigirá 20% do total de eleitores de cada um dos 24 Estados, e não do conjunto do país. Com a decisão, se apenas um Estado não cumprir a meta, o processo de consulta será anulado. A oposição rejeita tal exigência, alegando que a lei determina as assinaturas de 20% do total do eleitorado em nível nacional e não por regiões, mas alega que tem certeza de conseguir superar amplamente o mínimo exigido, já que Madura registra impopularidade de quase 75%.
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A oposição venezuelana está concentrada no recolhimento das 4 milhões de assinaturas para a convocação do referendo revogatório do mandato de Maduro e minimiza a importância do adiamento das eleições de governadores.
- Não vamos perder o objetivo. Não vou me distrair com a eleição estadual quando tenho pela frente um processo de recolhimento de assinaturas para mudar o governo - declarou o ex-candidato presidencial e líder opositor Henrique Capriles. - Toda a energia está no revogatório.
- Não vamos nos distrair com outra coisa. Tudo é feito para nos desorientar, desanimar, mas a maioria quer o referendo revogatório. Não tenho dúvida de que a resposta da próxima semana será enorme - acrescentou Capriles.
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Pesquisas mostram que
76,5% dos venezuelanos reprovam a gestão de Maduro
62,3% querem sua saída do governo
90,5% avaliam negativamente a situação do país