Potter: onde os fracos não têm vez

Eu pagava mais por não entregar VHS rebobinado. Era uma dor tremenda esquecer de voltar a fita. Diziam que estragava o cabeçote. Seu Neto, da locadora da Bento Manoel, no Alegrete, era nosso amigão. Porque deixava a gurizada de 13, 14 anos alugar pornôs.

Era uma festa só, e Cicciolina fazia parte dos nossos sonhos e banhos. Seu Neto quebrou. Primeiro veio o DVD. Ele encheu a loja deles e vendeu os fitões. Aí o blu-ray enfeitou as prateleiras até que o download ilegal arrebentou definitivamente o tio mais legal da nossa pré-adolescência. Uma lástima, mas uma vida real.

As coisas mudam, e chegam até Fabíola e o Léo, o gordinho da Saveiro. Na semana que passou, o adultério mais famoso do Brasil se tornou "o mais famoso" pelo espalhar online de um homem traído e um amigo cinegrafista amador e palpiteiro pegando a mulher do primeiro com um parceiro de ambos na saída de um motel de Minas Gerais.

O gostoso sotaque mineiro ilustrou o coração dilacerado do homem que descobriu que um dos seus grandes amigos estava fazendo amor com a sua mulher. Os vídeos não são legais. Eles têm violência física e psicológica, mas se espraiaram pelo país inteiro provocando iras e risos, memes e textões, fúrias e deboches. Era a força do WhatsApp como meio de comunicação espalhando um caso digno de Programa do Ratinho.

Goste ou não, tivemos um hit, que só foi derrubado pela proibição do próprio WhatsApp. A Justiça já estava a pedir para o aplicativo colaborar com alguns casos judiciários, liberando informações e conversas de alguns usuários. O WhatsApp nem bola deu. Por duas vezes foi procurado e nada. Aí a Justiça o bloqueou por 48 horas (na verdade foram pouco mais de 12 horinhas).

Uber, Airbnb, WhatsApp e Periscope vieram para competir com táxis, hotéis e pousadas, operadoras de telefonia e canais de TV. Podcasts brigam pela atenção com programas de rádios há anos. É o mundo mudando, as leis e regularizações indo para as manchetes, alguns donos dos tradicionais negócios berrando e reclamando, e o consumidor usufruindo de tudo e decidindo o que é melhor.

Na verdade mesmo, leis serão refeitas, os novos-poderosos-bilionários-donos-de-apps-espertos acabarão pagando mais algumas taxas estatais brasileiras e, no final das contas, da tradicional à disruptiva, quem entregar bom serviço ficará no mercado. Seu Neto encheu o saco antes e na última vez que o encontrei, tascou: "Cansei meu menino, cansei. Fechei a locadora e agora só fico em casa… Olhando Netflix…".

10 coisas que fiz quando o Whatsapp caiu 
- Liguei para minha mãe;
- Apreciei um jogo sem ficar lendo flautas de um grupo intitulado ATLGRENAL; 
- Não precisei da senha no celular para proteger os relacionamentos dos meus amigos; 
- Bebi com amigos num bar, e a conversa fluiu;
- Acabei de ler um livro que estava empacado há 23 dias; -Melhorei da dor no pescoço de sempre andar com ele olhando para a tela;
- Me senti vingado pelo finado MSN;
- Me senti aliviado pelo silêncio de alguns grupos; 
- Conheci o Telegram; 
- Dormi mais.