Há poucos dias, Alexandre Baldy se tornou vice-presidente sênior da BYD no Brasil para todos os negócios da marca chinesa no Brasil, automotivos ou não. A montadora que ameaça a liderança global da Tesla tem pressa: quer começar a produção em Camaçari em 2025 e a montagem, ainda neste ano. Baldy foi deputado federal pelo PP por Goiás e ministro das Cidades na gestão Temer. Desde dezembro de 2022, exercia o papel de conselheiro especial da BYD no Brasil. Nesta terça-feira (9), esteve em Porto Alegre nos preparativos de lançamento de um novo modelo na rede Iesa, que representa a BYD no Estado e disse à coluna que a ajuda ao Estado durante a tragédia de maio o aproximou do governo gaúcho e acabou "intensificando discussões" sobre um investimento por aqui.
Como a primeira fábrica de carros elétricos no Brasil vê a inclusão no "imposto do pecado"?
Minha expectativa é de que haja uma avaliação na regulamentação da reforma tributária para que se faça jus à eficiência energética, caso o Congresso decida aplicar o Imposto Seletivo sobre todos os modelos tecnológicos, até sobre o 1oo% elétrico. Particularmente, discordo pelo fato de que o carro 100 % elétrico é a solução para eficiência e não emissão de poluentes. Então, deveria estar excluído do Imposto Seletivo. Mas, se não for, é preciso fazer essa distinção para penalizar só os veículos que, de fato, são poluentes. Por exemplo, as bebidas alcoólicas foram apreciadas de acordo com a sua graduação.
Essa inclusão é creditada ao lobby de parte da indústria automotiva tradicional, mas muitas também não têm projetos de híbridos ou elétricos, híbridos. Faz sentido?
Não tenho dúvida que essa inclusão do carro 100% elétrico na taxação de Imposto Seletivo foi fruto de lobby de empresas que estão no mercado competindo conosco e que não têm, na visão de pesquisa e desenvolvimento, condição de entregar um carro competitivo no curto prazo. Na avaliação do mercado, a maior dificuldade é conseguir entregar carros que já são uma realidade. O desejo de 90% dos brasileiros que têm vontade de comprar um carro zero quilômetro é um carro híbrido. E 60% têm curiosidade por um carro elétrico. Então, as empresas que não têm tecnologia para entregar aquilo que hoje já é uma realidade obviamente querem lutar.
Por que a BYD anunciou a fábrica em Camaçari, com investimento de R$ 3 bilhões, depois elevou para R$ 5,5 bilhões?
Decidimos nacionalizar mais componentes. Houve um acréscimo que é a fabricação das baterias no Brasil. Para ter uma ideia, só China e Coreia do Sul fabricam baterias de lítio, ferro e fosfato. Então, é um ganho tecnológico muito grande para o Brasil. Tem oportunidade de ser protagonista em uma rota tecnológica que se considera tendência global. A Europa busca a eletrificação de frota. O Brasil tem condição, nesse projeto da BYD, de ser protagonista, porque já tem reservas minerais de lítio e de ferro, os minerais mais importantes como matéria-prima. As maiores reservas globais e as que menos demandam desafios na sua extração estão na América do Sul. O Brasil tem a capacidade de atrair esse investimento por essa razão natural. E ainda tem potencial de crescimento regional, porque a fábrica da BYD no Brasil foi instalada para atender o mercado regional. O Brasil tem acordo com o Mercosul, então vamos ter condição de atuar com a fábrica no Brasil para comercializar na América do Sul. O acordo bilateral Brasil-México também dará muita competitividade para atuarmos no México. Então, a fábrica no Brasil vai ser um hub para a América do Sul e para a América Latina.
Faz todo sentido ter um hub regional de produção de componentes, partes e peças, para ter componentes mais nacionalizados e geolocalizados no Nordeste para trazer competitividade.
A BYD atua com a Stellantis para desenvolver um núcleo nordestino de fornecedores?
Temos tratativas, sim, com a Stellantis, através da marca Jeep, para atrair fornecedores, especialmente que estejam conectados com essa realidade do carro híbrido e do carro elétrico. Faz todo sentido ter um hub regional de produção de componentes, partes e peças, para ter componentes mais nacionalizados e geolocalizados no Nordeste para trazer competitividade. É claro que atraímos investimentos e geramos empregos.
Tem chance de ter componente gaúcho?
Essa tragédia climática no Rio Grande do Sul acabou me aproximando de autoridades do Estado. O Brasil aumenta em velocidade impressionante a geração de energia através da matriz elétrica, solar e eólica. Nessas rotas tecnológicas, vamos ter uma demanda importante para instalação de hubs estacionários para armazenamento de energia. Então, existem muitas oportunidades no médio prazo. Os contatos têm se intensificado para identificar sinergias que possibilitem investimento no Estado. Nosso objetivo é que ter a maior parte de fornecimento de componentes locais.
Esse diálogo de produção de componentes se intensificou. E não só. A BYD tem uma gama de produtos que vai além dos carros a passeio. Produzimos painéis solares, temos a possibilidade dessa produção de baterias.
Não necessariamente em componentes automotivos? Temos muitas indústrias de autopeças no Estado e até uma siderúrgica focada em aço mais leve para carros elétricos.
Também. Existem muitas indústrias de autopeças. O objetivo é que possamos ter a maior parte de componentes locais. E agora essa discussão se intensificou ano Rio Grande do Sul dada essa infeliz catástrofe, mas que acabou promovendo muitas conversas.
Como estão as vendas da BYD?
É uma boa surpresa. Os resultados que a BYD alcançou no primeiro semestre surpreenderam a BYD global. O Brasil hoje é o país que mais cresce em todo o mundo, desconsiderando a China. Por isso, é o país que mais recebe investimentos (da marca) no mundo inteiro. A BYD antecipou toda a venda anual para que importássemos os carros até o dia 30 de junho para que não fôssemos impactados pelo imposto de importação adicional implementado pelo governo federal. Carro elétrico era uma realidade para rico. A BYD transformou um sonho muito distante em realidade. Então, a BYD tem investido muito, antecipando o volume para que pudéssemos manter competitividade e acesso ao consumidor brasileiro. Investimos na fábrica. Estamos investindo também na abertura de concessionárias em todo o Brasil. Nosso objetivo é chegar a 200 até o fim deste ano. Estamos investindo porque os resultados foram muito surpreendentes, muito positivos.
Quando começa a produção em Camaçari?
Nosso objetivo é que consigamos começar o processo de montagem em dezembro deste ano e o processo de produção no primeiro semestre de 2025. É um ritmo bem audacioso.
*Colaborou João Pedro Cecchini