A semana começa ainda sob o impacto da decisão dos britânicos de abandonar a União Europeia. O Brexit espalhou temor pelo mundo inteiro, mas o Brasil foi menos impactado, destaca André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. Mesmo dizendo ter sido surpreendido positivamente pela resiliência da bolsa e do dólar aqui dentro, o especialistas recomenda "cautela" aos investidores e adverte que, mesmo que as negociações que podem reduzir a incerteza de um processo desconhecido sejam acelerados, ainda assim vai demorar.
O que esperar depois do Brexit?
Minha maior curiosidade é como essa decisão vai impactar o Federal Reserve (banco central dos EUA) e a perspectiva de que haveria aumento de juro nos Estados Unidos neste ano. Será que vai haver mesmo? A questão principal, agora, é que o diabo mora nos detalhes. É preciso começar a definir como será a criação de vistos, como será tratada a questão de impostos, da aduana entre o Reino Unido e a União Europeia. Outra questão é quanto vai contaminar a Europa enquanto espírito, projeto. Há mais interrogações do que certezas, que ainda não temos como saber.
Essa incerteza destila um certo veneno, não?
Veneno total. Mas é bom levar em conta que o real não se depreciou tanto quanto se temia. Sugiro cautela para os investidores, porque como na sexta-feira saíram dados do setor externo, com alto investimento externo direto no Brasil em maio, de US$ 6,1 bilhões, o efeito para nós não foi tão pesado.
Quanto o Brasil é vulnerável?
É bom lembrar que até a véspera, na quinta-feira, a bolsa no Brasil acumulava alta de 40% em dólar, quer dizer, melhorou bastante. Quem quiser entrar agora não vai pegar movimento tão elevado como quem pegou desde o começo do ano. Fiquei surpreso positivamente com o fato de o real não ter se desvalorizado tanto. A impressão de que a economia brasileira realmente já chegou ao fundo do poço. Não quero dizer, com isso, que o dólar vai ficar na faixa de R$ 3,30. Mas devemos ser ponderados, porque há grandes interrogações sobre como vai se comportar o Fed, o BC brasileiro. Até quinta-feira, o real era uma das moedas que estava mais se apreciando no mundo. O Brasil está melhor – ou menos pior, mas também não está essa coisa toda.
A pressão para apressar a saída tem esse objetivo, reduzir as incertezas?
Exatamente, mas esses processos são lentos. Por mais que se tente apressar, vai demorar. Há pressões, dentro do próprio Reino Unido para reverter a decisão. Vai demorar. E o problema é que o Brexit abre muitas dúvidas externas. O pior é a sensação de que, como não se consegue, coletivamente, uma solução para o avanço da economia, as pessoas estão tentando cada uma por si. E isso não acaba bem. O Brexit como um todo gera esse sentimento de que não tem liderança no mundo, reforça a sensação de "farinha pouca, meu pirão primeiro". Mas há uma sensação de que os britânicos se deram conta da bobagem que fizeram. Existem muitas questões a resolver. Uma é que a taxa de juro mundial é determinada em Londres, a libor. Para ter a libor funcionando, é necessário um grau de liberdade de movimentos que pode ser reduzido com o Brexit. Até questões menores terão de ser resolvidas, como o fato de o jogador de futebol do Manchester United, que é europeu, vai precisar de visto de trabalho.