Meu amigo parou de beber. E não paro de oferecer bebida pra ele.
Foi um esforço dele. De anos. Uma gota de álcool pode desandar a vida inteira dele. Mas ele é muito divertido quando bebe. Vira o centro das atenções. Piadas, causos, comédia pura. Uma delícia estar no bar com ele.
As mesas do lado começam a juntar com a nossa. Viramos as estrelas da festa. Quer dizer: nós coadjuvantes de um ator principal que transforma o álcool no corpo dele em diversão à plateia.
Mas ele deu uma sumida. Estranhamos. O cara da festa, o que melhora o ambiente deu uma desaparecida. Pelo menos dos bares. Nos grupos de WhatsApp está ativo! Manda bobagens, piadas, toca flautas, discute, enfim, ali ele é 100%! Mas do bar ele zarpou.
Um outro parceiro foi atrás. Matéria investigativa: o que se passou? Descobriu. O álcool desencadeava a bagunça. Com o álcool escancarando a porta, outras drogas, contatos perigosos, filhos pequenos evitando carinho, esposa triste, preocupada. No emprego, desempenho caindo. A clássica vida que desaba.
Mas ele procurou ajuda. A ajuda silenciosa. Não contou pra ninguém. Mas teve que tomar atitudes drásticas. A primeira, óbvio, nada de cerveja, vinho, uísque e vodca. A segunda, se afastar dos ambientes que o levavam à perdição.
Quais ambientes? Nós. A turma de amigos, feliz e divertida do bar. Nossa reação ao saber: bobagem dele. A culpa não é nossa. É só controlar. Não, não é. É uma doença. O álcool nele é diferente do que em você aí que sabe controlar. E ele precisou perder coisas para não perder tudo.
Festa de criança foi o nosso reencontro. Ele não pode escapar dessa. Uma chopeira, cremosa, gelada, supimpa! Servimos o copo, colarinho perfeito e largamos na frente dele. Ele negou. Sorrindo. Insisti. Ele sorriu ainda mais e agradeceu. Tentei uma terceira vez, um outro amigo segurou meu braço. Parei. Envergonhado, parei…
Que vergonha… Um amigo do peito… Lutando… Eu ali, tentiando. Egoísta. Imbecil. Pedi desculpas. Dei um abraço. Ele me apertou. Forte. Eu devolvi o aperto. E entendi, imediatamente após ser um insensível, que amigo não é quem gosta das mesmas coisas que eu. Nem quem me diverte. Amigo é quem entende dores e diferenças.
Caro amigo: você me ensinou muito e estamos muito, mas muito felizes com teu copo de água na mesa. Um brinde, cara.
Um brinde ao teu esforço, empenho, foco e ao carinho que você recebe dos teus filhos que agora não têm mais medo de lhe perder.