É de cortar o coração. Esses dias, visitei uma das feiras de adoção de cães perdidos e resgatados da enchente. Em cada baia, um animalzinho valente com uma ficha descrevendo as características básicas: se é castrado, se tem vacinas e até o temperamento. Em comum, o olhar triste e o jeito acuado, talvez pelo frio, pela saudade do tutor ou pela corrente amarrada ao pescoço. Sim, a corrente é horrível, mas extremamente necessária neste caso. Evita o contato entre eles. Doloroso vê-los assim, mas é a melhor maneira encontrada pelos abnegados voluntários.
Aliás, os voluntários são heróis exaustos. Passam o dia alimentando centenas de cães e gatos, passeiam, prestam atendimento médico, recolhem fezes e tentam gerir um ambiente caótico tomado por latidos desesperados.
É um assunto que me angustia. Recentemente, no programa Conversas Cruzadas, reunimos autoridades e voluntários. Foi feito um apelo, ao vivo, por mais apoio do poder público. A secretária da Causa Animal de Porto Alegre, Fabiana Ribeiro, prometeu que a prefeitura alugará um ou dois espaços para abrigar mais de mil animais espalhados pelos abrigos da cidade. Mesmo considerando a boa fé, não me pareceu a melhor solução reunir tantos cachorros num único espaço. Voltei a falar com a secretária para entender a proposta, mas a ideia já naufragou. Ela disse ter ouvido de especialistas que o melhor seria descentralizar os abrigos, com mais espaços e menos animais reunidos. Fabiana vai sugerir ao prefeito buscar parcerias com ONGs que receberiam recursos do município.
Do lado do governo do estado, o projeto que previa pagamento a quem adotasse um animal resgatado foi arquivado. Conversei com o vice-governador, Gabriel Souza, que disse estar participando de reuniões com ativistas e especialistas. Uma das sugestões que começa a ganhar força é a criação de um subsídio com insumos a quem aceitar oferecer um lar temporário, diferentemente da ideia original, que previa uma adoção definitiva. E não é dinheiro, mas ração e medicamentos, por exemplo.
Ainda é pouco. As medidas são tímidas e o problema se agrava. Não se trata apenas de gostar ou não de cães e gatos. É uma questão de saúde pública. Até o fechamento desta coluna, o painel de monitoramento dos abrigos indicava mais de 11 mil animais aguardando adoção no estado.