Conversamos com diversos policiais, de todas as esferas, a respeito do cerco ao ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), que resistiu à bala contra a prisão no último domingo (23), ferindo dois agentes. Cercado em sua casa por unidades da Polícia Federal, ele só se entregou após oito horas de negociações, como o Brasil teve oportunidade de assistir, em transmissão ao vivo (patrocinada pelo próprio político, via redes sociais).
A opinião unânime entre os policiais consultados por este colunista é que a ação da PF embute uma série de erros. Primeiro, por menosprezar o alvo. Depois, pela negociação não seguir o Manual de Gerenciamento de Incidente Crítico, do Ministério da Justiça. Alguns equívocos anotados:
- A equipe de policiais designada para cumprir o mandado de prisão ordenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) parece ter subestimado a possibilidade de reação do homem a ser preso. Talvez por ser um político, achavam que iria se entregar sem qualquer resistência. Não foi o que ocorreu. Jefferson lançou três granadas e disparou cerca de 50 tiros de fuzil contra os agentes da PF, que foram surpreendidos. Dois deles ficaram feridos pelos estilhaços do explosivo, sem maior gravidade. Poderia ter sido uma tragédia. A lição: muitas vezes o alvo da prisão, por mais educado que seja, pode ter um rompante agressivo de fundo emocional. Algo, aliás, que faz parte da personalidade demonstrada por Jefferson. Até por isso costumam ser usadas algemas. Não são raros casos em que um sujeito saca de armas (ou até toma a arma do policial) e dispara a esmo, quando recebe voz de prisão.
- Os agentes designados para prender Jefferson não usavam coletes à prova de bala, claro indício de que não esperavam reação. Minimizaram a possibilidade de resistência e quase pagaram com a vida por isso.
- O próprio Jefferson se vangloriava de manter arsenais em dois pontos: Brasília e na cidade onde residia. Mesmo assim, os policiais chegaram para prendê-lo como se fossem para uma conversa, algo rotineiro. Não parecem ter assistido (ou não levaram a sério) as transmissões que o próprio ex-deputado fazia na internet, dizendo que não iria se entregar.
- Desencadeado o tiroteio, começou o cerco para impedir que o deputado fugisse. Por alguma razão inexplicável, a PF não desligou luz, água e internet da residência, procediment-padrão para cortar comunicações e minar a resistência do alvo a ser capturado. Jefferson continuou a fazer transmissões, inclusive mostrando como atirou nos policiais e ameaçando resistir até a morte.
- Pessoas estranhas ao cerco tiveram permissão para ingressar na residência. É o caso do Padre Kelmon, correligionário de Jefferson e candidato a presidente da República no primeiro turno pelo PTB. Há controvérsia se ele recebeu ou não permissão dos negociadores para ir conversar com o deputado rebelado.
- O negociador da equipe da PF que ingressou na casa se mostrou afável com Jefferson, concordando com todas as exigências e ponderações do homem a ser preso. Inclusive criticou seus colegas baleados, dizendo que não eram acostumados a atuar na rua. Pode ser tática para acalmar o ex-deputado, recomendável em caso de pessoas armadas. Acontece que Jefferson NÃO ESTAVA mais armado. O procedimento padrão, nesse caso, seria prender e algemar a pessoa que disparou contra os policiais, na melhor oportunidade que se apresentasse.
- O próprio ministro da Justiça orientou os procedimentos da PF, por telefone. Mas essa não é missão ministerial. O caso deveria ser conduzido pelos delegados da região. Fica a impressão de que o episódio foi tratado de forma política (por envolver um político) e não criminal, como se apresentava a situação.
Claro que é fácil falar e difícil fazer. Um servidor da PF me lembra: em primeiro lugar, a vida. Mas as ponderações acima são de profissionais com décadas de ação, reproduzidas por este colunista.