Se existe uma panaceia na medicina moderna, é a atividade física. São incontáveis seus benefícios: redução da mortalidade por doenças cardiovasculares, prevenção e controle do diabetes e da hipertensão, do número de casos de diversos tipos de câncer, da obesidade e de suas consequências, do declínio cognitivo associado ao envelhecimento e até do risco de desenvolver as formas graves da covid-19.
Embora a prática de exercícios com regularidade diminua a mortalidade geral e o risco de doenças cardiovasculares, os mecanismos responsáveis por esses resultados não são claros.
Matthew Naylor e colaboradores do Massachussets General Hospital acabam de publicar na revista Circulation um estudo para avaliar os padrões da arquitetura da resposta metabólica ao exercício em seres humanos.
Diferentemente das panaceias antigas, o exercício físico começa a ter sua fisiologia desvendada.
Foram realizados testes da função cardiopulmonar e do perfil metabólico antes e depois de alguns minutos de exercício extenuante (em bicicleta estacionária), entre os participantes do Framingham Heart Study, uma coorte dessa cidade próxima de Boston, que vem sendo acompanhada há décadas para avaliar os fatores envolvidos nas doenças cardiovasculares.
As idades variaram entre 45 e 61 anos (média = 53). 63% eram mulheres.
Os participantes tiveram 588 metabólitos dosados no sangue colhido antes e depois de pedalar à exaustão (em média 12 minutos). Em 502 houve mudança do perfil induzida pela atividade física.
Os níveis de metabólitos presentes na circulação antes da prática do exercício guardaram relação direta com o preparo físico anterior.
As alterações induzidas pela atividade física incluíram redução das concentrações de metabólitos implicados na resistência à insulina (que predispõem ao diabetes), aumento daqueles relacionados com a lipólise (envolvidos na “queima” de gordura), na biodisponibilidade de óxido nítrico e do tecido adiposo marrom, entre outros fatores relevantes para o risco cardiometabólico.
Essas modificações variaram de acordo com a quantidade de exercício realizado, o sexo e o índice de massa corpórea. O impacto na produção de alguns metabólitos protetores foi menor nos participantes que estavam na faixa da obesidade e mais alto nas mulheres, mesmo quando praticaram exercício menos intensos.
Com base nas respostas obtidas com o exercício, foi possível identificar quatro “assinaturas” metabólicas, duas das quais associadas à mortalidade geral, num período médio de observação de 23 anos.
Os autores concluem que, em indivíduos da comunidade, exercícios intensos, mesmo quando praticados por um período curto, são capazes de causar alterações no metabolismo centrais à saúde cardiometabólica e à proteção contra doenças cardiovasculares.
Diferentemente das panaceias egípcias, greco-romanas e as mais populares da Idade Média, prescritas durante séculos sem evidências de eficácia e do mecanismo de ação, o exercício físico, panaceia moderna, começa a ter sua fisiologia desvendada.