
Tratado como a maior contaminação da história chinesa, o surto de peste suína africana impôs o sacrifício de pelo menos 160 milhões de animais naquele território desde agosto de 2018, quando os primeiros casos foram identificados. A epidemia bagunçou a produção do Rio Grande do Sul e causou reações antagônicas nos setores de carne suína e de soja, que têm nos chineses seus principais compradores.
Em 2018, 26% das exportações gaúchas da carne desembarcaram no país asiático e, na conjuntura atual, a perspectiva é promissora. Também no ano passado, 81% da soja exportada teve a terra da muralha como destino, percentual tido como inalcançável pelo setor em 2019, já que o grão é utilizado pelos chineses como ração. O maior rebanho do mundo, com 360 milhões de suínos, pode ser reduzido a 160 milhões por conta da doença, segundo projeta o banco holandês Rabobank, líder global em financiamento para alimentação.
Na balança, carne suína e soja têm alta relevância para o agronegócio do Rio Grande do Sul, terceiro maior abatedor de suínos do país e segundo em produção da oleaginosa.
Somente em carne suína, o Rio Grande do Sul exportou US$ 80,88 milhões em 2018 para a China. Em soja, seu principal produto de exportação, foram US$ 4,9 bilhões.
— Em volume financeiro, a perda para a soja é incalculável. Muito maior do que os ganhos para a carne. Tanto que a guerra comercial ficou em segundo plano — avalia Carlos Cogo, sócio-diretor da Consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio, ao projetar alta de 23% nas exportações de suínos neste ano.
O especialista avalia que a China, após controlar a propagação do vírus, levará de três a cinco anos para normalizar o mercado. Diante disso, Cogo sugere planejamento da indústria gaúcha para aumento gradual da produção:
— O mercado precisa começar agora, visando os próximos anos. Este evento trará uma revitalização no setor.
Em volume financeiro, a perda para a soja é incalculável. Muito maior do que os ganhos para a carne.
Para aproveitar a oportunidade, o diretor-executivo do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos do Estado (Sips), Rogério Kerber, diz que os esforços estão concentrados em convencer o governo da China a habilitar mais plantas no Estado e a aceitar a entrada da carne suína gaúcha com osso. Projeção conservadora aponta perdas de 10,6 milhões de toneladas naquele país, quantidade que supera em 22% toda comercialização mundial do corte em 2018 e representa quase três vezes mais a produção brasileira no ano passado.
— A China está recorrendo aos centros produtores internacionais e, por isso, o país ganhou ainda mais importância para nós. Não só pela demanda que criou, mas pelo preço de compra do produto. Não vai ter carne suína no mundo para suprir essas perdas e, por isso, terá de ser substituída pela bovina e pelo frango. Olhando por este lado, o Rio Grande do Sul será beneficiado — argumenta Kerber.

Empresas pedem reforço na fiscalização para evitar doença
Comitiva brasileira, liderada pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, está desde a última segunda-feira na Ásia tratando do assunto. Integra a equipe o diretor-executivo da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin. Ele avalia que a epidemia promove ruptura nos padrões do mercado e cita reflexos mundiais:
— Aumento das exportações para a China pela falta de carne suína. Isso fará com que outros países sofram com a concorrência e tenham menos oferta. O preço tende a aumentar — projeta.
A preparação para este novo ciclo brasileiro nas exportações do produto passa pelo reforço na fiscalização de portos e aeroportos para impedir o ingresso do vírus, pedido já feito pela ABPA ao Ministério da Agricultura. A entidade criou o Grupo Especial de Prevenção à Peste Suína Africana, o qual orienta que ninguém, além de tratadores, tenha acesso aos animais.
Para abocanhar imediatamente parte da demanda, os produtores estão redirecionando suas vendas. Por ser uma cadeia longa, aumentar a produção está no horizonte e requer paciência, pois um leitão leva até nove meses para atingir o peso ideal de comercialização.