Com cartazes e vestindo roupas pretas, cerca de 50 profissionais de saúde residentes realizaram um protesto no pátio do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). A mobilização começou pouco depois das 8h desta quinta-feira (8), e é contra os cortes de verba por parte do governo federal, que atingem, entre outras áreas, saúde e educação. Ao HCPA, o Ministério da Economia anunciou que deixará de enviar R$ 15,7 milhões.
O grupo reunido nesta quinta equivale a metade do quadro funcional de residentes multi-profissionais da instituição — grupo de profissionais formados que faz uma especialização no hospital. Eles atuam nas áreas de enfermagem, serviço social, farmácia, nutrição, fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional, educação física, psicologia e física médica. As bolsas pagas a estes profissionais são de responsabilidade do Ministério da Educação (MEC), que também foi atingido por corte de verbas.
Os manifestantes também circularam por esquinas próximas ao hospital, exibindo os cartazes enquanto os motoristas aguardavam nas sinaleiras — sem afetar o trânsito de veículos.
Durante a paralisação, uma representante do hospital conversou com os manifestantes, afirmando que a insatisfação com o que vem ocorrendo é legítima, e pedindo que parte retorne ao trabalho para evitar impacto no atendimento. Coordenadora da Comissão de Residência Multiprofissional, Gabriela Corrêa Souza pediu a volta ao trabalho:
— O pedido é para evitar que o atendimento seja afetado.
O Hospital de Clínicas confirmou, durante a tarde, que o atendimento dos pacientes não foi afetado pela mobilização. Segundo a assessoria da instituição, foi possível realizar uma organização interna nos setores para suprir as ausências.
Categoria está em alerta
Os residentes do HCPA recebem de forma retroativa: em 1º de dezembro foi depositado o pagamento referente a novembro. Não há, portanto, um atraso nos salários, mas sim um temor de que o próximo compromisso não seja cumprido. Um e-mail foi enviado pela instituição com o alerta de que a verba não está garantida.
A categoria é afetada em especial pela dedicação exclusiva exigida para o recebimento da bolsa, e com isso não podem ter outro emprego, segundo a enfermeira Nicole Caetano, 24 anos.
— Água, luz, aluguel, tudo eu pago com a bolsa. Se não receber em janeiro, não sei o que faço. Vai atrasar tudo — afirma.
“Se o MEC não pagar, os residentes vão parar”, gritavam. Nas cartolinas, foram escritas frases como “Defenda o SUS” e “Respeitem os profissionais da saúde”, entre outras demandas.
A assistente social Alexia Prestes, 24 anos, calcula que mais da metade dos colegas passam o mês com o que recebe na residência:
— É nosso único sustento, pois muitos não têm família que auxilie.
Somado ao Grupo Hospitalar Conceição (GHC), o total bloqueado em hospitais da Capital alcança R$ 35,4 milhões — havia também alguns residentes do GHC e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) no protesto.
O Clínicas é impactado no custeio das chamadas despesas discricionárias, que incluem contratos de prestação de serviço, materiais médicos, de limpeza e higiene e medicamentos dos hospitais. Segundo Neiva Teresinha Finato, coordenadora de gestão financeira do HCPA, o novo bloqueio soma-se a outra restrição orçamentária, realizada em maio, de R$ 13,6 milhões. Por isso, o novo cenário fez com que a instituição tivesse de reavaliar prioridades para encerrar o ano sem prejudicar o atendimento aos pacientes.
Para o farmacêutico Gabriel da Motta, 27, anos, mais do que afetar os trabalhadores, o bloqueio é uma afronta aos usuários do Sistema Único de Saúde.
— Sem dinheiro, o Clínicas pode não conseguir comprar medicamentos e comprometer o atendimento à população — complementa.
A restrição na área médica faz parte da medida anunciada no último dia 22, quando o Planalto informou o contingenciamento adicional de R$ 5,72 bilhões do orçamento de 2022 para cumprir o teto federal de gastos.